Relator cede à pressão do governo, e PL do Desenrola deve ser votado até terça no Senado

BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Relator do projeto do Desenrola Brasil no Senado, Rodrigo Cunha (Podemos-AL) cedeu à pressão do governo Lula (PT) e garantiu que o projeto que disciplina as regras do programa de renegociação de dívidas será votado até terça-feira (3) no plenário da Casa, seguindo diretamente para sanção presidencial.

Em acordo com o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, o senador se comprometeu a não fazer alterações no texto que o obriguem a passar por nova votação na Câmara dos Deputados.

Membros do governo Lula vinham alertando que, para não comprometer a continuidade do Desenrola, o PL precisaria ser apreciado pelos senadores e sancionado pelo presidente Lula até 3 de outubro, quando expira a MP (medida provisória) que tem dado respaldo legal ao programa até agora.

A ideia de Cunha é que o seu parecer seja votado na CAE (Comissão de Assuntos Econômicos) do Senado na manhã desta quinta-feira (28).

“Amanhã [quinta], o presidente da CAE, Vanderlan [Cardoso, PSD-GO], vai fazer uma sessão extraordinária na qual eu apresentarei o parecer para análise dos senadores”, disse.

“Há uma grande possibilidade de ser votado na segunda [2] ou terça-feira [3] no plenário do Senado. Aqui estou falando em concordância com o presidente dessa Casa, Rodrigo Pacheco [PSD-MG]”, acrescentou.

A única mudança que o senador deve fazer no projeto é uma emenda de redação para deixar claro que o limite para os juros do rotativo do cartão de crédito, que deverá ser homologado pelo CMN (Conselho Monetário Nacional), não supere 100%. Esse tipo de alteração não precisa da anuência da Câmara.

“Queremos colocar isso como teto. O acordo do CMN tem que ser de até 100%. A lei está deixando essa brecha, vamos atuar”, disse.

O texto aprovado na Câmara dá 90 dias para as próprias instituições do sistema financeiro definirem um patamar de juros para o rotativo e para o parcelamento da fatura do cartão em atraso.

Esse parcelamento é acionado automaticamente 30 dias após o cliente cair no rotativo por não ter quitado a fatura integral do cartão.

Se não conseguirem o aval do CMN nesse período, será aplicável o teto que limita a dívida ao dobro do montante original.

Em agosto, a taxa média de juros cobrada pelos bancos de pessoas físicas no rotativo do cartão de crédito ficou em 445,7% ao ano, segundo dados divulgados pelo BC nesta quarta-feira (27).

A cifra representa uma alta de 4,4 pontos percentuais na comparação com o mês anterior. Em julho, no dado revisado pela autoridade monetária, a taxa média foi de 441,3%.

Procurada, a Febraban (Federação Brasileira de Bancos) diz ainda não ter formalizado qualquer proposta. Em nota, a entidade disse que irá “perseguir um caminho que dilua o risco de crédito entre os elos da cadeia e elimine os subsídios cruzados, numa transição sem rupturas do produto do cartão de crédito e de como ele se financia.”

Em meio à discussão sobre a limitação dos juros no rotativo do cartão de crédito, os bancos defendem um redesenho do parcelamento de compras sem juros. As instituições financeiras falam em subsídio cruzado entre as modalidades por causa da inadimplência.

Subsídio cruzado significa que um mesmo cliente que efetuou diversas compras parceladas pode eventualmente no futuro enfrentar dificuldades financeiras e, pelo volume acumulado de compras, não conseguir honrar o pagamento integral da fatura de cartão de crédito caindo, assim, no rotativo.

Parte do setor de cartões de crédito, entretanto, rechaça uma relação de causalidade entre as duas modalidades e nega que a inadimplência seja maior nos prazos mais longos do que nos pagamentos à vista.

Pesquisa Datafolha publicada em 29 de agosto mostrou o apoio de comerciantes à modalidade da compra parcelada sem juros na cidade de São Paulo.

De acordo com o levantamento, oito em cada dez (81%) responsáveis por estabelecimentos de pequeno porte da capital paulista são contrários ao fim da venda parcelada sem juros no cartão de crédito.

Além disso, 81% dos comércios pesquisados fazem vendas sem juros no cartão de crédito. Destes estabelecimentos, a venda parcelada sem juros corresponde, em média, a 50% das operações com cartão de crédito e a 45% do faturamento mensal.

Em entrevista à Folha de S.Paulo, Cunha disse que ia estudar essa questão e pretendia incluir em seu relatório um dispositivo voltado para campanhas de educação financeira e outro para incentivar a renegociação de dívidas de serviços básicos, como água e luz.

Ele também passou a defender a inclusão da renegociação de dívidas do Fies, programa de financiamento estudantil para a educação superior, no Desenrola.

O senador vinha dizendo que a discussão poderia ser “apressada”, mas não “atropelada” e que, em um primeiro momento, não via prejuízos em atrasar o calendário do programa por 10 ou 15 dias.

Ele chegou a apresentar um plano de trabalho, propondo duas audiências públicas na CAE e uma sessão de debates no plenário do Senado.

No entanto, o senador recuou depois de se reunir na manhã desta quarta com o ministro Fernando Haddad (Fazenda) e com membros da equipe econômica para discutir o assunto.

De acordo com um interlocutor do governo, Cunha entendeu que as medidas que gostaria de explorar no projeto já estavam sendo tratadas na regulamentação do Desenrola e que não havia tempo hábil para mudanças sem comprometer o andamento do programa.

Ao receber a sinalização de que terá apoio do governo a um projeto para a renegociação de dívidas do Fies, Cunha concordou em acelerar a tramitação do PL do Desenrola.

De acordo com o relator, há compromisso dos ministros Alexandre Padilha (Relações Institucionais) e Geraldo Alckmin (Desenvolvimento, Indústria, Comércio Exterior e Serviços), além de Haddad, de que será dada prioridade a um projeto à parte.

Na véspera, Padilha foi até o Senado para se reunir com Pacheco e Cunha para discutir a pauta. O líder do governo no Congresso, senador Randolfe Rodrigues, disse que o presidente do Senado colocou a Casa “à disposição” para cumprir o prazo do Desenrola.

LUCAS MARCHESINI E NATHALIA GARCIA / Folhapress

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