BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O relator da Reforma Tributária na Câmara, deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), decidiu manter no texto os benefícios às montadoras do Norte, Nordeste e Centro-Oeste. No entanto, ele vai defender a derrubada da exceção que permite a profissionais liberais pagar alíquota menor do que as demais atividades.
O congressista também discute a viabilidade de uma alternativa para substituir a cobrança da Cide (Contribuição sobre Intervenção de Domínio Econômico) sobre bens similares aos produzidos na Zona Franca de Manaus.
A medida foi incluída no Senado como forma de manter as vantagens competitivas da região, mas pode acabar elevando a carga sobre as demais atividades.
Ribeiro afirma que pretende divulgar uma primeira versão do parecer até o fim da tarde desta quarta-feira (13). A previsão é que o texto seja votado na quinta (14) para viabilizar a promulgação ainda neste ano.
Ele concedeu entrevista à Folha durante intervalo entre as reuniões com líderes. Nesses encontros, o relator apresentou os pontos do texto um a um para que as bancadas pudessem negociar um acordo em torno das modificações.
Para impedir que a PEC (proposta de emenda à Constituição) volte ao Senado, o relator pretende apenas suprimir trechos já aprovados.
Embora defenda suas posições técnicas, Ribeiro diz que o resultado final do texto vai depender da articulação com os líderes. “Meu limite é a política”, afirma.
No caso do benefício às montadoras, o relator já havia contemplado a proposta na primeira votação na Câmara, mas o artigo caiu por um voto durante a apreciação dos destaques. O Senado incluiu o incentivo novamente, e Ribeiro diz que já decidiu mantê-lo no parecer.
“[Sem o benefício] O que você ia ter é montadora com benefício total e montadora com parte de benefício. Então, na verdade, estamos fazendo uma isonomia desse benefício para evitar interferir na concorrência”, afirma.
Montadoras do Sul e Sudeste são contra a prorrogação dos incentivos para as demais regiões. Por isso, o tema deve ser alvo novamente de destaque durante a votação no plenário.
Nesse cenário, os defensores do benefício precisarão colocar 308 votos para mantê-lo no texto.
Questionado sobre a concessão de benefícios tributários a carros a combustão em meio ao esforço global pela redução do uso dos combustíveis fósseis, Ribeiro defende que o instrumento terá a possibilidade de controle social.
“Então é mais fácil de controlar isso. E tem claramente aí um comando com viés de sustentabilidade ambiental, inclusive”, diz.
Por outro lado, o relator diz que defende remover a alíquota intermediária criada para beneficiar profissionais liberais (como advogados e engenheiros) que têm faturamento anual superior a R$ 4,8 milhões e estão fora do Simples Nacional.
Para o deputado, a exceção introduzida no Senado reduz a chamada progressividade do texto ou seja, a reforma acabaria, nesse ponto, beneficiando os mais ricos.
O texto vindo do Senado prevê que esses profissionais recolham um imposto equivalente a 70% da alíquota-padrão (ou seja, com 30% de desconto), o que gerou críticas entre especialistas.
“Vou defender aquilo em que eu acredito, que é um IVA [Imposto sobre Valor Agregado] mais moderno, e tirar essas coisas. [A ideia é] ter menos alíquotas, poder aumentar a base, ter mais progressividade”, afirma.
“Estamos falando de gente que tem muito poder aquisitivo e termina pagando a mesma coisa que o cara que tem menos poder aquisitivo paga”, diz.
Um dos pontos de impasse é a instituição da Cide sobre bens que concorram com os produzidos na Zona Franca de Manaus. O trecho foi introduzido pelo senador Eduardo Braga (MDB-AM), relator no Senado e defensor da Zona Franca.
Na proposta aprovada originalmente na Câmara, a previsão era usar o Imposto Seletivo para manter uma cobrança adicional sobre bens similares aos produzidos na Zona Franca. O custo já estava incluído nas estimativas de alíquota do novo IVA.
Na forma aprovada pelo Senado, porém, a Cide funcionaria como uma cobrança adicional, acoplada ao IVA, encarecendo os produtos para os quais há também produção na Zona Franca.
Ribeiro disse não ter ainda uma estimativa dessa alíquota, mas ela teria de ser suficiente para financiar o incentivo já existente. Além disso, os recursos ficariam carimbados para a região.
“A Cide é um imposto que está fora da alíquota de referência. A Zona Franca tem entre R$ 20 bilhões e R$ 30 bilhões em benefícios. Se está pensando em arrecadar isso com essa Cide, vai ter de fixar uma alíquota, que vai ser incorporada ao IBS [Imposto sobre Bens e Serviços, de competência estadual e municipal]. Pelo menos é o entendimento de parte já do nosso pessoal técnico e das pessoas que se detiveram em fazer esse estudo”, afirma Ribeiro.
Além disso, segundo o relator, a partilha dos recursos do Imposto Seletivo era bem menos concentrada do que no modelo da Cide. Esse fator tem levado bancadas de outros estados a fazer pressão por mudanças.
Ainda não se sabe se será, de fato, possível chegar a uma solução para esse impasse. Do ponto de vista técnico, o cenário ideal seria mexer no texto, mas isso levaria à necessidade de nova votação do Senado.
Por outro lado, apenas a supressão do trecho da Cide deixaria um “vácuo” em relação à proteção à indústria da Zona Franca o que, do ponto de vista político, poderia ser um complicador ao avanço da reforma.
O desafio, segundo o relator, é costurar uma saída técnica, buscando um texto já aprovado pelo Senado que resolva o impasse. Ele reconhece, porém, que ainda não há garantias de que isso será possível. Nesse cenário, a decisão de manter ou não a Cide será eminentemente política.
Outro ponto que está “sob consideração”, diz Ribeiro, é o período que servirá de referência para o cálculo da distribuição da arrecadação do IBS entre estados e municípios.
O texto diz que a referência inicial será a média de participação dos entes no bolo total de receitas entre 2024 e 2028. Há o temor, porém, de que isso gere uma corrida pela elevação de alíquotas em busca de garantir ao estado uma fatia maior.
A opção neste caso seria suprimir o artigo que estabelece o período de referência, deixando a discussão para a fase de regulamentação, por lei complementar. Ainda não há decisão tomada.
Ribeiro também reiterou a defesa pela exclusão da chamada cesta básica estendida, mantendo apenas a chamada Cesta Básica Nacional aprovada pela Câmara dos Deputados, uma lista restrita de itens que terá desconto de 100% da alíquota do novo IVA.
Segundo ele, a medida é suficiente para mitigar os efeitos da nova tributação sobre o bolso das famílias. A criação de uma cesta básica estendida, com alíquota reduzida (equivalente a 40% da padrão), deixaria a porta aberta para uma ampliação exagerada das exceções, avalia o relator.
“O que a gente quer é uma cesta básica, não é? [Mas] De alimentos, que é o que a gente colocou ali. Hoje você tem cesta de tudo”, afirma.
IDIANA TOMAZELLI E FÁBIO PUPO / Folhapress