SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Quatro ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) votaram contra recursos em favor da revisão da vida toda do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social).
Kassio Nunes Marques, Flávio Dino, Cristiano Zanin e, neste domingo (25), Cármen Lúcia, entenderam que o julgamento de março deste ano, que derrubou a tese, deve ser mantido.
Os embargos de declaração -pedidos para esclarecer pontos do julgamento– pedem que os ministros reconsiderem a questão e mantenham o que tinham decidido em 2022, quando aprovaram a revisão, ou, ao menos garantam o pagamento da correção a quem tem ação na Justiça.
Fachada do STF; ministros analisam revisão da vida toda no plenário virtual Gabriela Biló Folhapress A imagem mostra uma escultura da Justiça, representada por uma figura feminina sentada, segurando uma balança, em frente ao edifício do Supremo Tribunal Federal do Brasil. Um dos recursos foi apresentado pelo Ieprev (Instituto de Estudos Previdenciários), que contesta os cálculos apresentados pelo governo com a revisão, na casa de R$ 480 bilhões até que todos os benefícios com direito tenham sido extintos. Os cálculos encomendados pelo instituto apontam que as despesas seriam de R$ 3,1 bilhões.
O outro recurso, da CNTM (Confederação Nacional do Trabalhadores Metalúrgicos), solicita que os ministros reconsiderem a decisão de março, também com base nos números apresentados pelo Ieprev, e pede que, se não for possível aprovar a revisão, que quem já tem ação na Justiça possa ter o benefício reajustado e receber os valores atrasados a que tem direito.
A revisão da vida toda é um processo judicial no qual o aposentado pede a correção do benefício para incluir, no cálculo da renda previdenciária, salários antigos, de antes de julho de 1994. O processo contesta regra de transição na reforma da Previdência de 1999.
Os ministros estão analisando dois embargos de declaração contra decisão de março deste ano, que derrubou a possibilidade de pedido da correção ao julgar duas ações de 1999, as ADIs (Ações Direta de Inconstitucionalidade) 2.110 e 2.111. O julgamento começou na sexta-feira (23) e está previsto para terminar no dia 30.
O relator dos embargos é o ministro Nunes Marques. Em seu voto, ele não aceitou o recurso do Ieprev e negou o pedido feito pela CNTM. Sua decisão foi seguida por Zanin, Dino e, agora, Cármem Lúcia.
Faltam ainda os votos dos ministros Luís Roberto Barroso, presidente da corte, Luiz Fux, Gilmar Mendes, Dias Toffoli, André Mendonça, Alexandre de Moraes e Edson Fachin.
Segundo Nunes Marques, ao contrário do que se alega, não houve omissão ou erro ao julgar revisão da vida toda em março deste ano, derrubando entendimento de 2022, já que, em dezembro daquele ano é que a corte teria errado ao não considerar que, em 2000, o plenário já havia tomado decisão.
João Badari, advogado representante do Ieprev, diz acreditar que o caso possa ainda ser debatido no plenário físico. “Eu ainda acredito que algum ministro peça destaque, porque em razão dos pareceres econômicos juntados, a profundidade que tem esse tema, a importância que tem, esse assunto não pode ser tratado em plenário virtual. Tem que ser levado para o plenário presencial”, diz.
Em março, quando houve a decisão, venceu divergência aberta por Cristiano Zanin na ADI 2.111, que trouxe o debate. Os ministros Alexandre de Moraes, André Mendonça, Edson Fachin e Cármen Lúcia foram votos vencidos, a favor da revisão. Barroso, Gilmar Mendes, Fux, Dino, Dias Toffoli e Nunes Marques.
Em março, ao julgar as duas ações de 1999 contra o fator previdenciário instituído pela reforma da Presidência do então presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), os ministros entenderam que o artigo 3º da lei 8.213 é constitucional e cogente. Com isso, a norma não pode ser derrubada para calcular o melhor benefício, aplicando a regra fixa, quando a regra de transição for menos benéfica ao segurado.
O argumento é que, em alguns casos, a regra de transição da reforma de 1999 era prejudicial para os segurados que já estavam na ativa, contribuindo com o INSS. Com isso, pedia-se na Justiça a aplicação da regra definitiva, possibilidade utilizar todos os salários na conta da aposentadoria, incluindo os mais antigos.
O acórdão estabelecido foi o seguinte: “A declaração de constitucionalidade do art. 3º da Lei 9.876/1999 impõe que o dispositivo legal seja observado de forma cogente pelos demais órgãos do Poder Judiciário e pela administração pública, em sua interpretação textual, que não permite exceção. O segurado do INSS que se enquadre no dispositivo não pode optar pela regra definitiva prevista no artigo 29, incisos I e II, da Lei nº 8.213/91, independentemente de lhe ser mais favorável”.
ENTENDA A REVISÃO DA VIDA TODA
A revisão da vida toda é um processo judicial no qual os aposentados do INSS pedem para incluir salários antigos pagos em outras moedas que não o real no cálculo da aposentadoria.
O motivo pelo qual se discute o direito à correção é a aprovação da lei 9.876, de 1999, que criou o fator previdenciário e mudou a regra de cálculo da média salarial, base dos benefícios do INSS.
A reforma da Previdência do governo Fernando Henrique Cardoso trouxe regra de transição que beneficiou novos segurados e prejudicou parte dos que já estavam no mercado de trabalho.
Pela lei, quem se filiou à Previdência até 26 de novembro de 1999 tem a média salarial calculada com as 80% das maiores contribuições a partir de julho de 1994, quando o Plano Real passou a valer.
Mas quem passou a contribuir com o INSS a partir de 27 de novembro de 1999 e atingiu as condições de se aposentar até 12 de novembro de 2019 tem a média calculada sobre os 80% maiores salários de toda sua vida laboral por isso, vida toda.
VAIVÉM DA REVISÃO DA VIDA TODA
– A revisão da vida toda chegou ao STJ (Superior Tribunal de Justiça) em 2015 como recurso a um processo que teve início no TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região), que atende os estados do Sul do país
– Em novembro de 2018, o STJ determinou suspensão de todos os processos do tipo no país até que se julgasse o caso na corte, sob o rito dos recursos repetitivos
– Em 2019, a revisão foi aprovada no STJ e, em 2020, o processo chegou ao STF
– Em 2021, o caso começou a ser julgado no plenário virtual do STF, mas pedido de vista do ministro Alexandre de Moraes interrompeu o julgamento
– Em 2022, novo julgamento se iniciou no plenário, mas uma manobra do ministro Kassio Nunes Marques levou o caso ao plenário físico, mesmo após já ter sido aprovado
– Em dezembro de 2022, o STF julgou o tema e aprovou a revisão da vida toda
– Em 2023, o INSS pediu a suspensão de processos de revisão enquanto o recurso é julgado pela Suprema Corte. O instituto também solicitou que a tese não se aplique a benefícios previdenciários já extintos, como em caso de morte do beneficiário
– Desde julho de 2023, os processos estão suspensos por decisão do ministro Alexandre de Moraes, relator do caso
– No dia 11 de agosto, o STF iniciou o julgamento do recurso no plenário virtual, mas o ministro Cristiano Zanin pediu vista e suspendeu o processo
– Em novembro, o plenário voltou ao julgamento da revisão, e, com divergências entre os votos, o ministro Alexandre de Moraes pediu destaque, levando o caso ao plenário físico
– A decisão final, no entanto, ficou 2024, após o recesso do Judiciário
– Em 1º de fevereiro, o julgamento estava marcado, mas foi adiado para o dia 28
– No dia 28 de fevereiro, o processo entrou na pauta da corte, mas não chegou a ser analisado devido à extensa lista de ações pautadas e foi pautado novamente para dia 29, mas não chegou a ser julgado
– Novo julgamento entrou na pauta do Supremo de 20 de março, mas, no dia, foi novamente adiado
– Em 21 de março de 2024, ao julgar duas ações de 1999 sobre o fator previdenciário, a tese da revisão da vida toda foi derrubada por 7 votos a 4
– O plenário virtual decide sobre a revisão em dois recursos apresentados em julgamento que deve terminar no dia 30 de agosto
CRISTIANE GERCINA / Folhapress