Revisão do Censo traz divergências naturais e não invalida resultados, diz IBGE

RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) – Primeira divulgação de uma pesquisa que serve como espécie de revisão do Censo Demográfico 2022, a PPE (Pesquisa de Pós-Enumeração) mostrou “divergências naturais” entre os indicadores apurados nos dois levantamentos, afirmou nesta quarta-feira (19) o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).

De acordo com o órgão, essas diferenças eram esperadas e não inviabilizam os resultados já apresentados pelo recenseamento.

“Algumas divergências são naturais do processo de construção de uma pesquisa dessa magnitude [Censo], em que o IBGE, com centenas de milhares de recenseadores, vai aos domicílios brasileiros”, disse o gerente da PPE, Gabriel Borges, em vídeo divulgado pelo instituto.

“O importante é que, no agregado, as informações são bastante próximas, o que reforça a confiabilidade nos resultados produzidos pelo Censo Demográfico”, acrescentou o técnico, em outro trecho da gravação.

O Censo buscou visitar todos os domicílios brasileiros espalhados em 452,3 mil setores censitários –medida de divisão do território. O trabalho sofreu atrasos com a pandemia e o corte de orçamento no governo Jair Bolsonaro (PL), o que levantou dúvidas sobre eventuais prejuízos na produção das estatísticas.

A PPE é realizada a partir de uma amostra de setores censitários (4.795). Os locais foram revisitados, em uma operação que ocorreu após o término da coleta dos dados do Censo.

A intenção da PPE é levantar informações comparáveis às da contagem da população. O material pode servir para avaliação da qualidade e da cobertura do recenseamento.

Nesta primeira divulgação da PPE, o IBGE produziu uma análise de conteúdo focada nas variáveis de relação de parentesco, cor ou raça, idade, sexo e alfabetização, além de coordenadas geográficas.

Segundo a pesquisa, o indicador que mostrou a maior divergência em relação ao Censo foi o de cor ou raça, seguido pela relação de parentesco.

No quesito cor ou raça, 82,3% das pessoas “pareadas” que se declararam ou foram declaradas brancas no Censo tiveram a mesma resposta na PPE.

Entre as declaradas pretas no Censo, o percentual foi de 60,4%. Entre as pardas, a proporção de casos convergentes foi de 77,3%. O menor patamar de convergência foi verificado entre indígenas: 47,6%.

O IBGE ponderou que setores pertencentes a terras indígenas não fizeram parte do cadastro de seleção da PPE. Os resultados da nova pesquisa se referem apenas à parcela desse grupo populacional fora das áreas delimitadas.

“Obviamente, vai ter diferença entre o Censo e a PPE. Só não teria se o Censo estivesse 100% correto e a PPE estivesse 100% correta. Toda pesquisa tem margem de erro, é normal, no mundo inteiro é assim”, diz o doutor em demografia José Eustáquio Diniz Alves, pesquisador aposentado do IBGE.

Ele ressalta que um dos fatores que podem gerar resultados diferentes é quem responde às entrevistas. Se a pessoa que forneceu as informações de um domicílio para o Censo não for a mesma na PPE, é possível que haja divergências em indicadores como cor ou raça e relação de parentesco, aponta Alves.

Na variável relação de parentesco, entre as pessoas declaradas como responsáveis pelo domicílio no Censo, 73,3% foram classificadas na mesma categoria na PPE. Uma parcela de 20% foi declarada como cônjuge na nova pesquisa, e um grupo de 6,8%, em outras categorias.

“Estamos falando de duas pesquisas. A questão é que o Censo vai a todos os lugares, enquanto a PPE faz uma amostragem, pega só uma parte”, diz Alves.

“Em 2010 [ano do recenseamento anterior], a PPE não foi divulgada, e isso gerou muito ruído. A divulgação da PPE é muito importante, tem de dar os parabéns para o IBGE.”

Gabriel Borges, gerente da PPE, também afirma que “questões situacionais” de cada entrevista podem levar a divergências nas duas pesquisas. “Depende de quem responde, depende do contexto em que foi conduzida a entrevista. Essas divergências são naturais, a gente sabe que podem ocorrer.”

Ainda de acordo com o IBGE, 1% dos moradores declarados como homens no recenseamento foram classificados como mulheres na PPE.

“Esta pequena divergência pode ocorrer pelo recenseador presumir e não perguntar o sexo do morador ou mesmo por um erro no momento de marcar a resposta no DMC [equipamento usado nas entrevistas]. Vale notar que a pequena divergência atesta também para a boa qualidade do pareamento realizado entre as duas pesquisas”, diz um trecho da PPE.

A segunda divulgação dessa “revisão do Censo” está prevista para 14 de agosto, quando o IBGE promete publicar uma avaliação sobre a cobertura censitária.

Segundo Alves, o documento será importante para entender o tamanho das possíveis falhas na contagem do número de habitantes no país. O Censo contabilizou 203,1 milhões de pessoas no Brasil, abaixo de projeções populacionais anteriores. O resultado surpreendeu analistas.

“Esse número de 203 milhões é o que o Censo encontrou, mas tem erro de cobertura. A gente já sabe que tem erro, mas não sabe qual é o tamanho”, diz Alves.

“Quem vai indicar isso é a PPE, que também pode ter erros, mas funciona como um calibrador. Você nunca vai ter um número perfeito, sempre vai ter um errinho. A questão é diminuir a margem de erro.”

Conforme a primeira divulgação da PPE, 36,1% dos domicílios coletados apresentaram divergências em relação ao Censo que precisaram ser verificadas em um processo chamado de reconciliação pelo IBGE.

“Os dados coletados na reconciliação não foram utilizados para corrigir os dados do Censo ou da PPE, de forma que este trabalho não deve ser confundido com os trabalhos de supervisão presentes em ambas as operações”, afirma a pesquisa divulgada nesta quarta.

De acordo com o IBGE, diversos países realizam esse tipo de revisão para avaliar as operações censitárias, incluindo México, Estados Unidos, Reino Unido, Portugal, Austrália, África do Sul, China e Índia. No Brasil, o instituto diz fazer pesquisas do tipo desde o Censo de 1970.

“É um documento [PPE] que é muito mais importante para pesquisadores, especialistas, pessoas que vão realmente se aprofundar no assunto, do que para o cidadão comum, no dia a dia”, aponta o demógrafo e geógrafo Ricardo de Sampaio Dagnino, professor da UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul).

“Refazer todo o Censo não tem como. O que já foi divulgado, já foi. Pode ser colocada uma nota de rodapé em um trecho ou outro”, acrescenta.

LEONARDO VIECELI / Folhapress

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