Rogue Snail cresce com investimento estrangeiro, mas mantém espírito indie

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O lançamento em acesso antecipado de “Relic Hunters Legend”, no fim de setembro, foi um marco para o estúdio brasileiro Rogue Snail. Dos editais públicos ao investimento internacional, a jornada da empresa para criar o jogo é um exemplo do crescimento do setor no Brasil e exemplo para milhares de desenvolvedores independentes que sonham lançar seus games comercialmente.

Continuação e aprimoramento de “Relic Hunters Zero”, título gratuito inaugural do estúdio, o jogo se tornou o principal indutor de crescimento da empresa, fundada em setembro de 2014 por Mark Venturelli (game designer), Betu Souza (diretor de arte), Raphael Müller (designer de som) e Caio Cesar Lima (programador).

Com uma ideia na cabeça, mas sem dinheiro no bolso, os fundadores da Rogue Snail foram atrás de financiamento. O incentivo inicial veio de um edital de games aberto em 2016 pela Spcine, órgão vinculado à Secretaria de Cultura da Prefeitura de São Paulo, que rendeu ao estúdio R$ 150 mil.

“Muitas das empresas brasileiras começam com base em edital. Eu acho que é uma coisa para a gente se orgulhar do nosso país”, diz Renata Rapyo, que substituiu o fundador Mark Venturelli como CEO da Rogue Snail em julho deste ano -assim como os outros fundadores, ele continua colaborando com a empresa em sua área e em um recém-formado conselho administrativo.

“Esse dinheiro não é suficiente para fazer um jogo de médio e grande porte, mas permite que elas comecem e façam seus primeiros protótipos.”

Não foi diferente com a Rogue Snail. O dinheiro recebido da prefeitura, juntamente com os cerca de R$ 170 mil obtidos por meio de uma campanha de financiamento coletivo no Kickstarter, no fim de 2017, possibilitaram que a empresa desenvolvesse as primeiras versões do ambicioso projeto representado por “Relic Hunters Legend”.

“Os pilares do jogo se mantiveram desde o início. A ideia era pegar o ‘Relic Hunters Zero’, e fazer aquilo maior e melhor”, conta o programador Gabriel Leite, um dos primeiros funcionários contratados pela Rogue Snail.

Assim como o primeiro jogo do estúdio, “Legend” é um “looter-shooter”, em que o objetivo é matar inimigos para obter armas mais poderosas. A história do game também parte do que foi criado em “Zero”, agregando elementos de jogos de RPG, além de novas tramas narrativas e personagens.

As maiores mudanças estão na adoção de uma direção artística mais moderna, que mistura elementos 2D e 3D, na implementação de um modo multiplayer online cooperativo e na intenção de lançar um título “live service”, que será atualizado ao longo do tempo com novos conteúdos, com inspiração no sucesso de séries como “Destiny”.

“Um RPG online tem muitas complexidades. A gente já sabia disso, mas é um negócio que foi aumentando, aumentando… E a gente começou a perceber que o jogo, para ser um sucesso, ele tinha que ser cada vez maior”, afirma Leite.

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Isso só seria possível com a ajuda de uma grande publicadora, capaz de ajudar no desenvolvimento do jogo com suporte técnico e financeiro.

“A gente já tinha todos esses sonhos, mas, sendo realista, a gente se segurava. Criava menos mecânicas, menos modos de jogo. Quando a Gearbox entrou, a gente sentiu que podia finalmente botar para fora o potencial completo do jogo”, afirma o roteirista Pedro Falcão, designer de narrativa da série.

O contato com a Gearbox, conhecida pela série “Borderlands”, surgiu na PAX East de 2020, realizada em Boston. Em busca de um parceiro internacional, a Rogue Snail aproveitou o evento de games -um dos últimos antes da pandemia de Covid-19- para expor o protótipo de “Legends”. Acabou conquistando o coração de Steve Gibson, presidente da publisher americana.

“Quando conhecemos a equipe da Rogue Snail pela primeira vez, fomos imediatamente atraídos pelo talento excepcional e pelo entusiasmo de criar jogos projetados com um altíssimo nível de cuidado e amor pelos jogadores”, afirmou Gibson em entrevista por email. “Quanto mais conversávamos com eles, mais empolgados ficávamos.”

Além da Gearbox, o estúdio também fechou um acordo com a Netflix. Por meio de investidores que haviam apostado no estúdio ainda no início do projeto, a Rogue Snail ficou sabendo que a gigante do streaming estava procurando jogos mobile de qualidade para oferecer a seus assinantes.

Com isso, nasceu “Relic Hunters Rebels”, que se tornou um dos primeiros jogos brasileiros distribuídos no serviço de streaming e deu a chance para a empresa desenvolver ainda mais o universo da franquia.

“Foi muito interessante porque a gente pôde colocar ali a semente do que seria o ‘Relic Hunters Legend’, como um ‘prequel’ do que acontece na história”, afirma Falcão.

Mais do que isso, as parcerias com Gearbox e Netflix deram condições para o estúdio crescer rapidamente. Pouco depois de completar nove anos, a Rogue Snail já contava com 55 funcionários. O que também resultou em mudanças na forma de organização da empresa.

“Tem muita coisa que funciona bem em uma equipe pequena, porque você consegue ter uma comunicação muito mais ágil, muito mais transparente. Só que quando a gente começa a falar de 20, 30, 50 pessoas, as coisas tem que ficar mais documentadas para que todo mundo consiga se achar”, afirma Rapyo. “Acho que isso tem sido a nossa maior dor de crescimento, e o maior aprendizado também.”

Mesmo assim, a empresa ainda tenta manter o espírito indie, com maior liberdade para os funcionários e práticas de comunicação e organização horizontal. A game designer Beatrice Ribeiro, que entre passagens pela Rogue Snail fez um período de estágio na Blizzard, dona de “World of Warcraft” e “Diablo”, vê na maior agilidade para resolução de problemas a principal vantagem desse formato.

“Em outras empresas, você tem todo um caminho para chegar do ponto A ao B, com uma porção de paradas. Não dá para pular nada. Na nossa empresa, dá para desburocratizar bastante”, afirma.

“A gente tem comunicação direta com qualquer pessoa”, complementa Giulia Yamasaki, a Chu, que trabalha como artista técnica em “Relic Hunters Legend”. “Não tem que passar para um superior, que vai comunicar não sei quem, para daqui a um mês descobrir o que eu tenho que fazer.”

O estúdio mantém funcionamento totalmente remoto desde sua fundação e, no início do ano, implementou o formato de trabalho de quatro dias por semana.

Outro aspecto da cultura indie que a empresa tenta manter é o espírito de colaboração com outros desenvolvedores nacionais. Rapyo destaca os cariocas Double Dash e Copa Studio (parceiros no game de “Irmão do Jorel e o Jogo Mais Importante da Galáxia”) e o pernambucano PUGA Studios, que faz outsourcing de recursos para desenvolvimento de games.

“A gente quer sucesso não só para o nosso estúdio, mas para o nosso país. Por ser uma indústria nova, grandes talentos brasileiros saíram. Se a gente crescer junto, isso vai ajudar essas pessoas a retornarem para cá, trazendo com elas o conhecimento que adquiriram lá fora”, afirma Rapyo.

TIAGO RIBAS / Folhapress

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