SÃO PETERSBURGO, RÚSSIA (FOLHAPRESS) – Quando o visitante chega à fábrica de drones da empresa russa STC, que faz o modelo mais usado na Guerra da Ucrânia em São Petersburgo, o primeiro estranhamento é óbvio: onde está a unidade?
Em seu lugar, há um grande galpão que pertencia a uma empresa de venda de artigos pela internet, que faliu há sete anos. A logomarca dela, contudo, segue viva.
A precaução é compreensível. Localizada num ponto periférico da segunda maior cidade da Rússia, a fábrica principal das 10 operadas pela STC é um alvo óbvio para uma variante de seu principal produto, o drone. No caso, aviões-robôs com cargas explosivas lançados da Ucrânia, a mil quilômetros dali.
“Um deles explodiu aqui perto na semana passada. Não sei se era endereçado a nós ou à refinaria aqui perto”, disse o projetista-chefe da empresa, Roman Ivanov, entre admoestações à reportagem da Folha de S.Paulo sobre o risco de estar naquele lugar –o jornal foi o primeiro veículo ocidental a entrar lá, segundo ele.
Dentro da mesma linha de segredo, são vetadas fotografias ou filmagens: a empresa fornecerá material próprio depois, já sanitizado da possibilidade de geolocalização inerente a imagens captadas por telefones celulares e sob ângulos pouco fotogênicos, visando proteger informações sensíveis.
Isso dito, a visita é ampla. “Só vamos mostrar 20% do que temos”, diz Ivanov, no meio de cinco horas de passeio pelo local, que tem o tamanho equivalente a dois campos e meio de futebol. São cinco andares com folga no teto, lembrando um pavilhão de exposição cheio de peças e linhas de montagens.
Há um certo silêncio reverencial vigente: a maioria de jovens com o colete escrito Orlan, a família principal de drones lá produzida, costuma estar com fones de ouvido. Uma exceção se viu na linha de corte a laser de peças de carbono, com um pop-rock russo saindo de alguma caixinha de som imperceptível.
Para o observador ocidental, chama a atenção as salas dedicadas à etapa final de teste dos drones. São centenas de aparelhos em prateleiras, sendo montados rapidamente e levados para as checagens finais.
Cada um deve fazer ao menos um voo de teste antes de ser entregue ao governo russo. No máximo, três deles. “Não há um mercado hoje. O governo compra tudo”, diz Ivanov. Ele nega temer que o Estado tome o controle da STC, há 23 anos uma empresa privada. “Os rumores de totalitarismo na Rússia são exagerados. É um país bem mais livre do que vocês pensam.”
Todos os drones são acondicionados em estojos de plástico pretos com seu número de série. Cada Orlan-10 ocupa duas dessas malas, o mesmo que suas catapultas de lançamento –engenhocas com bandas elásticas hoje divididas entre vermelhas, feitas no Reino Unido e compradas antes da guerra, e pretas, criadas no local.
“Não precisamos mais deles. Na realidade, algumas empresas que nos forneciam material faliram depois das sanções ocidentais”, diz Ivanov.
Ele e o presidente da empresa, Roman Agafonnikov, levam a reportagem para um segundo prédio, do mesmo tamanho do primeiro. Lá, os astros são os microssatélites, sendo feitos em escala industrial.
Este ramo do negócio faz brilhar os olhos dos dois Roman, presidente e projetista. Já há três modelos em órbita desde o ano passado, em teste, rastreados por cinco antenas do que se poderia chamar de conexão Brics: duas na Rússia, uma na China, uma na África do Sul e outra em São Paulo –zero detalhes são dados sobre essa operação, mas a imagem online do equipamento está lá no centro de controle.
IGOR GIELOW / Folhapress