São Paulo Companhia de Dança aborda o feminicídio em nova coreografia

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Amor e ciúmes, feminicído, refugiados, o que resta das experiências e a perda de memória. Com o tema “Tornar Visível o Invisível”, a São Paulo Companhia de Dança estreia sua temporada no teatro Sérgio Cardoso, em São Paulo.

Na primeira semana, embarca numa viagem que passa por uma travessia marítima de imigrantes, a “Odisseia” criada pela francesa Jöelle Bouvier para a companhia, e chega até a memória sensorial de “Yoin”, palavra japonesa para “o que resta depois de cessado o estímulo”, de Jomar Mesquita.

“Yoin” é a terceira criação dele para a companhia. Para a coreografia, Mesquita partiu do mesmo princípio de suas criações anteriores, uma palavra cujos significados não existem em outros idiomas e que permite muitos desdobramentos poéticos.

“Um dos significados mais instigantes de ‘yoin’ é ‘a sensação que fica após cessado o estímulo’”, diz o coreógrafo. Para criar uma dança dessa palavra-filosofia oriental, ele explorou desde as sensações mínimas, do arrepio após um leve toque, às causadas por grandes perdas da vida. Além de tratar do que resta, “Yoin” debate o que se transforma, no corpo e na vida, nos papéis espalhados no palco, no figurino, nas músicas.

Os trajes criados por Maria Agustina Comas Oyenard usam “upcycling”, técnica que transforma restos têxteis em novas roupas. A trilha é composta por canções famosas da MPB —”Assum Preto”, “Samba da Bênção”, “Juízo Final” e outras, nas interpretações de nomes como Arnaldo Antunes, Elza Soares, Maria Bethânia ou Cida Moreira.

Na segunda semana da temporada, o programa apresenta duas coreografias que, segundo Inês Bogéa, diretora da companhia, abordam de maneira diferente a questão da violência contra a mulher. “Petrushka”, coreografada por Michel Fokine com música de Igor Stravinski no começo do século passado, ganhou nova versão do espanhol Goyo Montero. No triângulo amoroso entre bonecos, o personagem denominado Mouro na versão original vira o Lutador —que disputa com Petrushka o amor da Bailarina.

“Há ciúmes e uma certa violência, mas também é um balé bastante lúdico”, diz Bogéa. Contribuem para isso marionetes articuladas, enormes bonecos infláveis e um cenário de colchões que viram muros.

Mas é em “Memórias em Conta Gotas”, de Lili de Grammont, que o elemento violência contra a mulher surge mais forte. Lili é filha de Eliane de Grammont, morta em 1981 pelo ex-marido, o cantor Lindomar Castilho. Lili tinha dois anos na época. Aos sete, seu pai foi preso e ela foi viver com a avó. Há cerca de um ano, quando criou a coreografia, recebeu uma ligação do pai pedindo a sua ajuda. Ela foi.

“O feminicídio é dicotômico. A mulher morre, para ela acabou. Mas para o órfão do feminicídio é o começo de uma montanha-russa de sentimentos. Quando vi a situação de saúde de meu pai, fui ao seu encontro, achei estar preparada para isso. Não estava”, diz Lili.

Para a coreógrafa, “Memória em Conta Gotas” não é uma obra de denúncia, mas uma forma de catarse. “Como se fosse repaginar memórias tristes para algo poético”, diz.

SÃO PAULO COMPANHIA DE DANÇA

– Quando 21 a 30 de junho. Sex, 20h; sáb., 16h e 20h; dom. 16h

– Onde Teatro Sérgio Cardoso – r. Rui Barbosa, 153 , São Paulo

– Preço R$ 50 a R$ 80

– Classificação Livre

IARA BIDERMAN / Folhapress

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