SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O secretário de Saúde de Sorocaba, Claudio Pompeo, prestava atendimento como psiquiatra nas redes pública e privada sem apresentar registro ou título de especialista.
Nos sites do CFM (Conselho Federal de Medicina) e do Cremesp (Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo), seu registro como médico aparece em situação regular, mas não há RQE (Registro de Qualificação de Especialidade).
Também no site da AMB (Associação Médica Brasileira) onde é possível verificar se um médico tem título de especialista, uma busca a partir do nome do secretário ou do número de seu registro no CRM (Conselho Regional de Medicina) não oferece nenhum resultado.
Em nota, a Secretaria de Comunicação (Secom) da Prefeitura de Sorocaba afirma que a situação de Pompeo como secretário segue a lei e que sua contratação como médico foi regular, em regime temporário CLT. Segundo a pasta, Pompeo nega que se apresente como psiquiatra, mas sim como “médico pós-graduado em psiquiatria”.
“Uma das possibilidades para a realização da prova do título pela Associação Brasileira de Psiquiatria prevê que um candidato possa participar do certame após exercer a atividade por, pelo menos, seis anos, em campo, público ou privado, conforme demonstra o último edital da referida associação. O dr. Cláudio estava se preparando para a prova, sendo interrompido para se dedicar à Secretaria Municipal da Saúde”, diz a nota.
Pompeo chefia a Saúde na atual gestão do prefeito Rodrigo Manga (Republicanos). O site da prefeitura o apresentou como formado em medicina pela PUC-SP e pós-graduado em psiquiatria pela Facspar (Faculdade Centro Sul do Paraná) ao anunciá-lo como secretário. “Desde novembro de 2021 ele atendia como médico psiquiatra na rede pública de Sorocaba”, dizia o comunicado do Executivo municipal.
Segundo o CFM, o especialista é obrigado a divulgar o RQE para realizar atendimentos. Aquele que não registra seu RQE, “mesmo tendo concluído residência ou sido aprovado em prova de sociedade, fica passível de sanções pelos conselhos de medicina caso anuncie ser especialista numa determinada área. Essa divulgação está condicionada à posse do RQE”.
FACULDADE VENDIA CERTIFICADOS
Claudio Pompeo diz ter cursado sua pós-graduação em psiquiatria entre julho de 2015 e julho de 2016 na Facspar (Faculdade Centro Sul do Paraná).
A instituição não existe mais. Teve atividades encerradas em 2012, data em que já não era mais reconhecida pelo MEC (Ministério da Educação). Em 2015, voltou a atuar ao ser adquirida pelo Grupo Educacional Facinepe e pleiteou o credenciamento.
Em 2017, após série de reportagens do Grupo RBS apontar suspeitas de comercialização de diplomas de graduação e pós-graduação pela Facspar, o MEC abriu um processo administrativo e proibiu a oferta de cursos e o ingresso de novos alunos na instituição.
A reportagem conversou, sob condição de anonimato, com um ex-funcionário da Facspar cujo nome consta no diploma de Pompeo. Ele se disse espantado com o fato de que seu nome aparece em um certificado de psiquiatria e afirmou não saber nada de medicina.
Outro nome no diploma de Pompeo é o do médico psiquiatra Celso Roberto Nunes, que disse nunca ter dado aulas na Facspar.
Questionada, a Secom de Sorocaba afirma que, “embora a Facspar tenha sido descredenciada por medida de supervisão e sua situação atual conste como extinta, o MEC ainda exibe e reconhece, formalmente, a quantidade total de 95 egressos do curso de pós-graduação lato sensu em psiquiatria, grupo no qual se encontra Claudio Pompeo”.
À reportagem o MEC disse que os diplomas de graduação e certificados de pós-graduação na área de saúde emitidos pela Facspar foram considerados irregulares, conforme parecer emitido pelo Conselho Nacional de Educação, e não são considerados válidos para o exercício de atividade médica especializada.
“Cabe acrescentar que visita de supervisão realizada em 2016 constatou que a Facspar estava desativada e nunca funcionou efetivamente como instituição de educação superior”, acrescentou o ministério.
A reportagem então questionou o secretário sobre o parecer do órgão do MEC. A Secom respondeu que Pompeo ficou surpreso com a informação e vai buscar uma indenização por danos morais e materiais.
“[Pompeo] recebe a informação da reportagem com surpresa e indignação, sendo vítima do processo, cabendo ingressar com ação indenizatória, pleiteando danos morais e materiais pelo tempo e dedicação investidos durante o estudo no curso de pós-graduação, chancelado pela referida faculdade”, diz a Secom.
EX-PACIENTE DIZ QUE POMPEO ERROU DIAGNÓSTICO
Pompeo atendia como psiquiatra em uma clínica particular e receitava medicamentos para depressão, ansiedade, bipolaridade e fibromialgia, por exemplo. As receitas levavam seu CRM e o carimbo de “médico” ou “psiquiatria”.
A reportagem conversou com um ex-paciente atendido pelo médico por dez meses. Pedro (nome fictício) conta que procurou Pompeo para tratar uma fibromialgia e que se decepcionou com o atendimento.
Segundo o ex-paciente, após fazer poucas perguntas, Pompeo lhe diagnosticou com transtorno bipolar e prescreveu carbonato de lítio. Pedro conta que tomou o remédio por dois anos e que depois, ao passar com outros profissionais, constatou erro médico. Afirma ainda que o medicamento o fez desenvolver hipotireoidismo.
Pompeo negou irregularidades em sua atuação também na rede privada. Questionado via Secom sobre o procedimento para diagnosticar bipolaridade e o suposto erro médico, o secretário não respondeu.
LUCAS MONTEIRO E VINÍCIUS BARBOZA / Folhapress