BELO HORIZONTE, MG (FOLHAPRESS) – Os auxiliares do governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), receberam no mês de junho, somados, ao menos R$ 70 mil em jetons –remuneração paga a quem participa no conselho de administração de empresas estatais.
O pagamento vai na contramão do que Zema vem afirmando em entrevistas para justificar o aumento sancionado no ano passado de quase 250% nos salários de seu secretariado. Na mesma ocasião, o governador elevou o próprio salário, em reajuste escalonado que chegará a 298% a partir do ano que vem.
“Lembrando que, no passado, isso ninguém fala, os secretários de Minas tinham os jetons, ganhavam muito mais do que hoje, inclusive. Isso não sai em jornal nenhum, não vejo ninguém falar”, disse Zema em entrevista à CNN Brasil na segunda-feira (29).
Também afirmou: “Eu sou um governo que preza pela transparência. Então, se está lá hoje que o meu secretário ganha ‘x’, é porque ele ganha ‘x’. Porque antes o que constava é que ele ganhava ‘x dividido por 3′ e tinha mais ’10 x’ por fora. Eu gosto de fazer o certo e, infelizmente, fazer o certo no Brasil custa caro”.
Os secretários de Zema que receberam jetons em junho, de acordo com o Portal da Transparência, foram Pedro Barros de Souza (Infraestrutura, Mobilidade e Parcerias), com remuneração adicional de R$ 13 mil da Cemig, Marilia Carvalho de Melo (Meio Ambiente), com R$ 4.800 da MGS (Minas Gerais Administração e Serviços), e Luiz Claudio Gomes (Fazenda), com R$ 5.100 do BDMG (Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais).
Luisa Barreto, que deixou no início de junho a Secretaria de Planejamento e Gestão para se dedicar à pré-candidatura à Prefeitura de Belo Horizonte com o apoio de Zema, recebeu R$ 8.100 por sua participação no conselho da Gasmig. Ela acabou indicada como candidata a vice de Mauro Tramonte (Republicanos).
O salário dos secretários, que antes do aumento promovido por Zema era de R$ 10 mil, hoje é de R$ 33 mil e chegará a R$ 34.774,64 a partir de 2025. Em 2019, os deputados estaduais aprovaram a reforma administrativa do governo com uma proibição para que secretários recebessem jetons, mas o dispositivo foi vetado por Zema.
Em nota, o governo mineiro afirmou que a lei que reajustou os salários também limitou o recebimento de jetons à participação em apenas um conselho para secretários e secretários-adjuntos.
“Antes dessa legislação, não havia limite para o recebimento de jetons, prática que gerou, ao longo de décadas, o pagamento arbitrário de salários”, afirmou a administração.
“A atual política dos jetons no estado abrange secretários que tinham remunerações superiores em suas formações de origem, com objetivo de evitar a perda salarial e garantir, consequentemente, a manutenção do secretariado, função que exige qualificação, responsabilidade e experiência”, completou.
A maior parte do valor recebido em jetons no governo em junho ficou por conta do ex-secretário da Fazenda do estado Gustavo de Oliveira Barbosa. Ele recebeu R$ 39,1 mil pela participação nos conselhos da Copasa, estatal de saneamento, e Codemig, de exploração de nióbio.
Em fevereiro, Barbosa deixou o cargo na Fazenda para assumir a chefia da assessoria especial do vice-governador Mateus Simões (Novo).
Ao somar o montante com o salário bruto do servidor no período, de R$ 7.100, ele recebeu ao todo R$ 46,2 mil em junho. O valor está acima do teto salarial do funcionalismo estadual, que é de R$ 39.717,69 (salário do governador), mas decisões da Justiça permitem o pagamento de jetons acima do limite para aqueles que atuam em cargos de estatais autossuficientes financeiramente.
À reportagem Barbosa afirmou que não há ilegalidade na remuneração, que ele possui capacidade técnica, acadêmica e profissional para ser conselheiro em qualquer empresa do país e que só assumiu os cargos nas estatais após ter deixado o posto de secretário da Fazenda.
“Lembrando que as empresas teriam esse gasto comigo ou com qualquer outro conselheiro, esse gasto não é do Estado”, disse o servidor.
A ex-secretária Luisa Barreto disse, em nota, que o jeton recebido em junho é referente à participação no conselho fiscal da Gasmig, de maneira transitória e que ela não ocupa mais o posto nem recebe a remuneração.
Procurados via assessoria, os secretários Pedro Barros de Souza, Marilia Carvalho de Melo e Luiz Claudio Gomes não retornaram às tentativas de contato.
O aumento salarial sancionado pelo governador para si e para seu secretariado foi considerado irregular pelo conselho de supervisão do Regime de Recuperação Fiscal (RRF) de Minas Gerais.
O órgão é composto por um representante do Ministério da Fazenda, um do TCU (Tribunal de Contas da União) e um do governo do estado –que se absteve nesse caso.
O conselho que monitora o cumprimento do RRF pelo estado apontou que o aumento viola a lei que estabelece as regras do regime.
A legislação veda aos estados que estão sob o modelo a concessão “de vantagem, aumento, reajuste ou adequação de remuneração de membros dos Poderes ou de órgãos, de servidores e empregados públicos e de militares, exceto aqueles provenientes de sentença judicial transitada em julgado”.
Procurada, a Secretaria da Fazenda de Minas disse que o reajuste “foi ressalvado” no plano de recuperação revisado por orientação do próprio conselho de supervisão.
Criado há sete anos, o RRF concede alívio para a dívida de estados em crise em troca de um conjunto de medidas para melhorar as contas públicas. Entre elas, estão o congelamento do salário de servidores e a venda de ativos do estado para reduzir o estoque da dívida.
Há duas semanas, o STF prorrogou decisão que permite a Minas não pagar as parcelas da sua dívida de R$ 160 bilhões com a União até 1º de agosto. O governo Zema conseguiu posteriormente a ampliação desse prazo para o fim do mês de agosto para que uma nova proposta de renegociação da dívida dos estados possa tramitar no Congresso.
ARTUR BÚRIGO / Folhapress