BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O Senado aprovou nesta quarta-feira (19) o projeto que define novas regras para o ensino médio em todo o país. O texto foi aprovado de forma simbólica (sem a contagem de votos), horas após a aprovação na Comissão de Educação. O projeto volta, agora, à Câmara dos Deputados.
O texto aprovado pelos senadores prevê que, das 3.000 horas de todo o ensino médio, 2.400 (80%) serão destinadas a uma grade comum para todos os alunos, que abrange aulas de disciplinas tradicionais como matemática e português.
Atualmente, devido à reforma aprovada em 2017 no governo Michel Temer (MDB), são separadas 1.800 horas para as disciplinas obrigatórias e 1.200 para o itinerário formativo escolhido pelo aluno.
Para quem optar pelo ensino profissionalizante, a carga comum cai para 2.200 horas, restando 800 horas para aulas específicas dos cursos técnicos. Na Câmara, os deputados tinham fixado em 2.400 horas a grade comum para a maioria e 2.100 para os alunos de ensino técnico.
O texto da Câmara, aprovado em março, foi fruto de amplo debate do relator, deputado Mendonça Filho (União Brasil-PE), e do ministro da Educação, Camilo Santana. Ambos se desentenderam e tiveram discussões ríspidas ao longo da negociação, mas, ao final, relator, deputados ligados à educação e governo chegaram a um entendimento.
No Senado, a relatora, professora Dorinha (União Brasil-TO), fez mudanças significativas em relação ao projeto que saiu da Câmara. Ela alterou pontos centrais, como a questão da carga horária, a retomada do espanhol como disciplina obrigatória e a restrição a professores contratados em cursos técnicos por notório saber, sem formação específica.
Agora, os deputados irão negociar se mantêm parte das alterações feitas pelos senadores ou se retomam totalmente o texto que haviam aprovado em março deste ano.
Uma das controvérsias diz respeito à obrigatoriedade do espanhol. O texto aprovado do Senado prevê que as duas línguas estrangeiras obrigatórias (espanhol e inglês) poderão ser substituídas em algumas situações. Isso pode ocorrer, por exemplo, em regiões que tenham fronteira com países ou regiões que falem outro idioma, como no caso do Amapá e a Guiana Francesa.
Cidades com grande influência de cultura de outros países devido ao fluxo migratório, como em colônias alemãs e italianas na região Sul, também poderão substituir as línguas estrangeiras obrigatórias.
O Senado também aprovou uma transição para que, a partir de 2029, todos os alunos tenham 2.400 horas de grade comum curricular, inclusive quem fizer curso técnico.
Com isso, quem optar pelo ensino profissionalizante terá uma carga horária geral maior no ensino médio, de 3.200, 3.400 e 3.600 horas para cursos de, respectivamente, 800, 1.000 e 1.200 horas.
O Senado também restringiu a possibilidade de contratação de professores de ensino técnico por terem notório saber em uma área.
A proposta foi mais restritiva e prevê que possam ser contratados profissionais que não sejam docentes por terem atuação em uma determinada área apenas em casos excepcionais.
Proposta visa sanar problemas da reforma de 2017
O projeto que altera a reforma do ensino médio sancionada em 2017 e estabelece novas regras para essa etapa escolar no país foi aprovada na Câmara em março, em uma votação simbólica, depois que o governo Lula (PT) cedeu nas negociações para evitar uma desfiguração ainda maior do texto em relação ao que enviou ao Legislativo no ano passado.
A proposta do Executivo previa 2.400 horas obrigatórias do currículo geral para todos os itinerários formativos. O relator Mendonça Filho (União Brasil-PE), afirmava que o patamar obrigatório inviabilizaria os cursos profissionalizantes. Ele contou com o apoio da maioria dos secretários estaduais de educação.
Assim, pelo texto aprovado em março na Câmara, estudantes que optarem por fazer curso profissionalizante terão a carga horária comum reduzida para 2.100. Alunos que escolherem cursos técnicos que demandem 1.200 horas, como de enfermagem, por exemplo, serão aproveitadas 300 horas do currículo comum, considerando 3.000 horas no ciclo completo.
Mendonça Filho foi o ministro da Educação na gestão Temer e responsável por formular a reforma de 2017. A lei, em vigor desde 2022, estabeleceu que os alunos devem ter 3.000 horas de aulas ao longo dos três anos da etapa, sendo 1.800 (60%) comum a todos com as disciplinas tradicionais. As outras 1.200 horas (40%) são destinadas aos chamados itinerários formativos.
Esses itinerários foram criados com o objetivo de dar aos jovens a opção de escolher uma área para aprofundar os estudos e dar maior conexão do conteúdo escolar com o projeto de vida do estudante.
Na prática, como a Folha de S.Paulo mostrou em diversas reportagens, as escolas passaram a oferecer matérias com o nome de “brigadeiro gourmet” e “como se tornar um milionário”. Sem vagas para todos, também houve casos em que os itinerários foram sorteados ou impostos aos alunos.
Em São Paulo, onde estudantes foram os primeiros do país a concluir os três anos do ensino médio após a mudança sancionada por Temer, 85% dos estudantes entrevistados disseram que a redução do tempo destinado para as disciplinas regulares fez com que eles não se sentissem preparados para fazer o Enem e outros vestibulares ou acreditar que podiam ingressar no ensino superior.
O estudo feito pela Repu (Rede Escola Pública e Universidade) e pelo Gepud (Grupo Escola Pública e Democracia), divulgado em março, mostrou que 60,2% dos alunos disseram não ter ficado satisfeitos com o itinerário que cursaram e 81,5% não aprovaram as disciplinas criadas para essa parte optativa do currículo.
MATHEUS TEIXEIRA / Folhapress