SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira (PSD), disse nesta sexta-feira (12), durante evento do setor elétrico em São Paulo, que os benefícios setoriais individuais causam prejuízo aos mais vulneráveis.
A fala acontece após o governo assinar MP (medida provisória) que beneficia empresa dos irmãos Joesley e Wesley Batista, e que deve onerar os consumidores, segundo especialistas.
A MP foi enviada para o Congresso após uma série de reuniões de representantes da Âmbar Energia, empresa do grupo J&F, dos irmãos Batista, no Ministério de Minas e Energia fora da agenda oficial. Uma dessas reuniões que aconteceu neste ano pouco antes da assinatura da MP foi com o próprio Silveira. A empresa nega irregularidades.
“O setor elétrico brasileiro vive uma encruzilhada muito clara. Ou seguimos adiante, buscando benefícios setoriais individuais em prejuízo daqueles mais vulneráveis e que não podem se defender, e caminhamos para a insustentabilidade, ou podemos mudar a nossa direção em busca de um setor mais construtivo, equilibrado e justo para as pessoas”, afirmou durante o Seminário Justiça Tarifária e Liberdade do Consumidor, dois dias após essas reuniões virem a público.
Depois, em conversa com jornalistas nesta sexta, o ministro negou que a MP vá pressionar a conta de luz dos brasileiros e disse que a compra de térmicas pela Âmbar Energia, que foi beneficiada pela medida provisória, aconteceu entre empresas privadas e não passou pelo governo. Silveira, porém, sabia das empresas que estavam competindo pelos ativos, como o BTG e a Eneva, além da Âmbar.
A companhia de energia dos irmãos Batista recentemente comprou um conjunto de termelétricas da Eletrobras no Amazonas em uma transação de R$ 4,7 bilhões.
Quatro dias depois da aquisição, no dia 13 de junho, o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) enviou ao Congresso a MP 1.232, que altera uma série de regras no mercado de energia local, uma delas voltada à Amazonas Energia, concessionária de distribuição do estado que compra cerca de 30% da energia das termelétricas, agora dos Batista.
A Amazonas Energia é uma empresa em dificuldade financeira e tem uma série de pendências com as termelétricas do estado. A vendedora das usinas à Âmbar, a Eletrobras, tem provisões de centenas de milhões em dívidas da empresa.
A MP flexibiliza uma série de condições para garantir a viabilidade econômica da Amazonas Energia. O texto ainda permite a transferência do controle societário como alternativa à extinção da concessão. Uma iniciativa desse tipo era vista como necessária pelo setor devido à situação da empresa e das condições de mercado no estado, sujeito a entraves como um elevado patamar de furto de energia.
Mas especialistas dizem que a MP abre caminho para que contratos de compra de energia térmica dos ativos adquiridos pela J&F passem a ser totalmente bancados pelo conjunto dos consumidores do Sistema Interligado Nacional.
A medida deve aumentar não apenas a conta de luz dos clientes residenciais do Brasil, como também para comerciais e industriais, afetando ainda mais os consumidores de todo o país, já que as empresas podem repassar o preço para seus produtos.
A uma plateia de empresários e representantes de associações do setor elétrico, Silveira disse nesta sexta que haja um mínimo de consenso entre os segmentos e diálogo entre governo e o setor privado, para que os subsídios que sejam dados ocorram em favor de todo o sistema e não apenas de algumas empresas.
Silveira também voltou a dizer que o mercado livre de energia prejudica os clientes do Sistema Interligado Nacional, ao causar um ciclo vicioso, em que as pessoas, para driblarem as tarifas cada vez mais altas que bancam os descontos do mercado livre, acabam entrando nesse mercado.
Silveira criticou os lobbies no setor, e disse que se não houver solução para essa questão todo o setor elétrico vai sofrer as mesmas dificuldades financeiras que prejudicam a Amazonas Energia. Ao dizer isso, o ministro acabou se contradizendo sobre a possibilidade de aumento na conta de luz com a MP 1.232.
“Em vez dos lobbies se defenderem individualmente, como se defendem hoje, que eles se unam, porque eles estão notando que o mesmo que está acontecendo com a Amazonas Energia vai acontecer com todo o setor elétrico. Isso é inevitável. Vai chegar a um ponto de insustentabilidade. E aí quem vai socorrer? De novo brasileiras e brasileiros? É isso que acontece”, declarou.
O ministro defendeu que as políticas públicas que são feitas no setor de energia para baratear a conta de luz não recaia sobre os demais consumidores que estão fora dessas medidas, mas que o Orçamento banque essa conta.
“O setor elétrico acabou absorvendo políticas públicas e sociais que deveriam estar, sim, no Orçamento Geral da União. Na luta por recursos para políticas púbicas no escasso Orçamento que temos hoje, o custo sobrou para o mais frágil: o consumidor de energia”, disse.
O ministro repetiu tudo o que painelistas que falaram antes dele no evento defenderam. Entregou o que a plateia quis ouvir e foi aplaudido. Mas não apresentou nenhuma medida prática. Disse apenas que recebeu do presidente Lula a incumbência de trazer uma solução definitiva para a questão das tarifas altas de energia.
“Para concluir tarefa tão desafiadora, algo indispensável é escutar. Escutar todos os segmentos”, disse.
STÉFANIE RIGAMONTI / Folhapress