Síria admite que rebeldes ocupam 2ª maior cidade do país após 8 anos

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O regime de Bashar al-Assad, que trava uma guerra civil contra grupos rebeldes na Síria desde 2011, admitiu neste sábado (30) que combatentes entraram em Aleppo, a segunda maior cidade do país, e que dezenas de soldados morreram nos confrontos.

Trata-se do primeiro reconhecimento público de que os insurgentes invadiram a localidade, no noroeste da nação, em oito anos —em 2016, a ditadura restabeleceu o controle da cidade, antes a maior do país, com a ajuda da Rússia, do Irã e do Hezbollah, movimento libanês apoiado por Teerã.

Em conversa por telefone com o presidente dos Emirados Árabes Unidos, o xeque Mohammed bin Zayed Al Nahyan, Assad chamou os grupos rebeldes de terroristas e afirmou que o país os derrotará.

“A Síria continua defendendo sua estabilidade e integridade territorial contra todos os terroristas e seus apoiadores e é capaz, com a ajuda de seus aliados e amigos, de derrotá-los e eliminá-los, não importa a intensidade de seus ataques”, disse ele, segundo comunicado do gabinete do ditador sírio.

Imagens deste sábado mostraram pessoas posando para fotos ao lado de uma estátua derrubada de Bassil al-Assad, o falecido irmão do ditador, e combatentes circulando pela cidade em caminhões.

“Sou filho de Aleppo e fui deslocado há oito anos, em 2016. Graças a Deus acabamos de retornar. É um sentimento indescritível”, disse Ali Jumaa, um combatente, em imagens televisionadas de dentro da cidade.

Os rebeldes teriam assumido o controle do aeroporto de Aleppo, de acordo com comunicado divulgado pelos próprios insurgentes —a informação não havia sido confirmada pelo regime. Segundo o Irã, também atacaram o consulado do país na cidade. “Todos os membros do consulado estão bem”, disse o porta-voz do Ministério de Relações Exteriores iraniano, Esmaeil Baghaei, à imprensa estatal.

A ofensiva contra o regime e seus aliados, liderada pelo grupo Hayat Tahrir al Sham, ex-braço sírio da Al Qaeda, é um desdobramento dos ataques que tiveram início na última quarta (27) e representa o maior desafio para o ditador em vários anos.

Os combates estavam congelados desde 2020, quando houve um acordo de desescalada firmado entre Rússia e Turquia —Ancara apoia alguns dos grupos rebeldes no noroeste da Síria.

Apesar da parcial suspensão dos combates desde então, há amplos setores do território que escapam ao controle do regime. O Hayat Tahrir al Sham já dominava partes da região de Idlib, também no noroeste da Síria, e porções das províncias vizinhas de Aleppo, Hama e Latakia.

“A multiplicidade de frentes de batalha levou nossas Forças Armadas a realizar uma operação de reimplantação com o objetivo de fortalecer as linhas de defesa e de preparar um contra-ataque”, disse o Exército sírio, acrescentando que os combates se estenderam por mais de 100 quilômetros. “Dezenas de homens de nossas Forças Armadas morreram. Outros ficaram feridos.”

Apesar de reconhecer o avanço dos rebeldes em Aleppo, os militares afirmam que os insurgentes não conseguiram estabelecer posições na cidade devido ao bombardeio contínuo do Exército.

Uma delas seria Saraqib, que tem importância estratégica por estar na estrada que leva a Aleppo, a cerca de 40 quilômetros a sudoeste da cidade. As forças insurgentes afirmaram à agência Reuters que capturaram também o município de Maraat Al-Numan, ao sul de Idlib.

Tal feito colocaria sob controle rebelde quase toda a província de Idlib, colocando em xeque o cessar-fogo mediado por Turquia e Rússia em março de 2020.

Segundo o OSDH, durante a noite, “aviões de guerra russos lançaram incursões em áreas da cidade de Aleppo pela primeira vez desde 2016” —Moscou já havia enviado reforço aéreo à Síria em 2015 para ajudar Assad.

“Pela primeira vez em cerca de cinco anos, ouvimos foguetes e artilharia o tempo todo”, contou à AFP Sarmad, morador de Aleppo. “Estamos com medo de que se repita o cenário da guerra e que sejamos obrigados a fugir.”

Segundo três pessoas afirmaram à Reuters, isso já começou a acontecer. Eles afirmam que milhares de civis fugiram da cidade em seus carros após a invasão. Os moradores estariam indo principalmente para Latakia e Salamiya.

O OSDH (Observatório Sírio de Direitos Humanos), por outro lado, disse que as facções “tomaram o controle da maior parte da cidade, dos edifícios governamentais e das prisões”. Também afirmou que autoridades da região, incluindo os chefes da polícia e da segurança, retiraram-se do centro.

“Não houve combates, não foi disparado um único tiro, pois as forças do regime se retiraram”, afirmou Rami Abdel Rahman, diretor do observatório, à agência de notícias AFP. Ao todo, os jihadistas e seus aliados teriam conquistado cerca de 70 vilas e aldeias no norte do país.

Na sexta (29), o porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov, disse que Moscou considerava o ataque rebelde uma violação da soberania síria. “Somos a favor de as autoridades restabelecerem a ordem na área e restaurarem a ordem constitucional o mais rápido possível”, afirmou.

No sábado, Abbas Araqchi e Serguei Lavrov, chanceleres do Irã e da Rússia, respectivamente, expressaram apoio à Síria. Segundo a mídia estatal iraniana, eles falaram em um telefonema que os ataques eram parte de um plano israelense-americano para desestabilizar a região. Os ministros ainda teriam concordado com a necessidade de intensificar os esforços conjuntos para estabilizar a crise.

Apesar das declarações, a presença da Rússia na Síria diminuiu consideravelmente, segundo afirmou à AFP o analista Aaron Stein, presidente do Foreign Policy Research Institute, organização sediada nos Estados Unidos. Para ele, o aparente sucesso da ofensiva “lembra o quão fraco é o regime” sírio.

Já Dareen Khalifa, especialista no International Crisis Group, o Hayat Tahrir al Sham observou a mudança de forças imposta pelo conflito regional e preparava uma ofensiva havia meses. “Eles acreditam que agora os iranianos estão enfraquecidos e o regime, encurralado”, disse à agência de notícias.

A operação relâmpago do grupo coincide com a entrada em vigor de um frágil cessar-fogo entre Israel e Hezbollah no vizinho Líbano após dois meses de intensos combates. Os aliados do Irã na região sofreram uma série de golpes no último ano, à medida que a guerra em Gaza se expandiu pelo Oriente Médio.

O OSDH atualizou o número de mortos devido aos combates na Síria desde quarta (27) para 311. Entre eles haveria 183 combatentes do Hayat Tahrir al Sham e seus grupos aliados, 100 soldados sírios e milicianos pró-regime e 28 civis.

Redação / Folhapress

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