RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) – O ex-secretário de Obras Alexandre Pinto, que trabalhou nas duas primeiras gestões de Eduardo Paes (PSD) na Prefeitura do Rio de Janeiro, afirmou em delação premiada que o sogro do prefeito, o engenheiro Paulo Cézar Assed, obteve propina por meio de tráfico de influência na administração municipal.
Pinto disse que Paes demonstrava contrariedade com o envolvimento do sogro em assuntos da prefeitura. Ele não relaciona a atuação de Assed a eventuais benefícios ao atual prefeito, candidato à reeleição, mas afirma que o engenheiro fazia “tráfico de influência” na administração municipal.
As informações fazem parte do anexo 69 do acordo de colaboração premiada firmada por Pinto em 2019 com a PGR (Procuradoria-Geral da República).
Procurado, Paes disse, por meio de sua assessoria, que se trata “de uma delação antiga, descredibilizada pela Justiça, que já foi usada politicamente pelo juiz Marcelo Bretas para manipular a eleição de 2018 e beneficiar o seu amigo e ex-juiz Wilson Witzel e o então vice Cláudio Castro na disputa ao governo do RJ”.
“Agora, em 2024, às vésperas de mais uma eleição, não surpreende que esse mesmo grupo que comanda o estado do Rio de Janeiro há seis anos use de novo politicamente a polícia para requentar declarações mentirosas que já foram invalidadas pela Justiça e beneficiar a candidatura de Alexandre Ramagem, afilhado político de Castro e o novo Witzel”, afirmou a nota.
A reportagem não conseguiu contato com Assed por meio do telefone de sua empresa.
Segundo a Folha apurou, as informações foram enviadas em 2022 ao Ministério Público do Rio de Janeiro, que as encaminhou para a Polícia Civil. A Delegacia de Combate à Corrupção ainda realiza uma verificação preliminar para decidir se instaura ou não um inquérito policial. Pinto indicou como provas de corroboração quatro agendas e tem depoimento marcado para os próximos dias.
Não é a primeira vez que o ex-secretário tem um depoimento marcado em período eleitoral. Em 2018, quando Pinto negociava o acordo, Bretas marcou um interrogatório dele para três dias antes da votação do primeiro turno, quando Paes disputava o governo estadual com Witzel (então no PSC), amigo do magistrado.
Na ocasião, Pinto prestava seu quarto depoimento ao magistrado e, pela primeira vez, afirmou que o prefeito recebeu propina. O episódio foi um dos elementos analisados para o afastamento de Bretas da 7ª Vara Federal Criminal, responsável pelos desdobramentos da Operação Lava Jato no Rio de Janeiro.
A defesa de Pinto afirmou que vai pedir o adiamento do depoimento. O advogado Rodrigo de Souza Costa, que o representa, disse que o ex-secretário já teve “declarações manipuladas anteriormente para tentar influenciar o processo eleitoral, trazendo um prejuízo considerável para ele próprio”.
“Meu cliente segue com a intenção de colaborar com o sistema de Justiça Criminal, mas não pode ser prejudicado por esse tipo de situação. Acredita-se que não seria o caso, mas achamos prudente evitar qualquer risco nesse sentido, até por saber que as declarações de Alexandre nesse caso já foram prestadas anteriormente ao MP-RJ”, disse o advogado.
O acordo de Pinto com a PGR foi assinado em agosto de 2019. Poucos detalhes sobre a delação foram revelados desde então. Em 2022, o jornal O Estado de S. Paulo informou que o ex-secretário disse na delação que o prefeito solicitou R$ 8 milhões em caixa dois de campanha a empresas com contrato com o município.
O anexo 69, que envolve o sogro de Paes, trata da obra da Arena Carioca em Pedra de Guaratiba (zona oeste). Segundo o resumo do relato do ex-secretário, a licitação foi direcionada para a LM Engenharia a pedido de Assed.
De acordo com o ex-secretário, “Assed fazia tráfico de influência na prefeitura e cobrava propina em troca”.
“Paes não queria seu sogro envolvido em assuntos da prefeitura, mas Paulo Assed sempre procurava os secretários”, afirma o documento que descreve as informações de Pinto.
Segundo ele, o dono da LM, identificado apenas como Alcides (possivelmente José Alcides Silveira), lhe informou-lhe que pagava 2% dos contratos da empresa ao sogro do prefeito. Pelo contrato da arena, que custou R$ 6,4 milhões, o colaborador disse que Assed recebeu R$ 128 mil em dinheiro vivo.
“Em uma das visitas de Paulo Assed ao colaborador, no gabinete da SMO [Secretaria Municipal de Obras], Paulo disse que usou os recursos prometidos, oriundos de propina, para ajudar a pagar a festa de casamento da filha mais nova, cunhada de Eduardo Paes, no Copacabana Palace”, diz o documento.
Alexandre Pinto foi preso duas vezes entre setembro de 2017 e janeiro de 2018 sob acusação de corrupção em obras do município, algumas vinculadas às Olimpíadas de 2016. Ele chegou a ser condenado em quatro processos conduzidos por Bretas, mas três deles foram anulados por tribunais superiores.
Ele firmou a delação quando estava preso e com a família em investigação. A íntegra dos anexos da colaboração ainda permanece sob sigilo. A Folha apurou que ele citou cinco conselheiros do TCM (Tribunal de Contas do Município), motivo pelo qual o acordo foi homologado no STJ (Superior Tribunal de Justiça) pelo ministro Herman Benjamin.
PAES FALA EM USO POLÍTICO DE INVESTIGAÇÕES
Além de afirmar que delação de Alexandre Pinto é antiga e descredibilizada e citar a atuação de Bretas na eleição de 2018, Paes mencionou em nota investigações da Polícia Federal e do MP-RJ que apontaram a atuação de delegados na tentativa de forjar flagrantes e inquéritos contra ele e seus aliados em 2020 e 2022.
Segundo Paes, “não surpreende que o mesmo grupo […] use de novo politicamente a polícia para requentar declarações mentirosas”.
A nota afirma que “o Supremo anulou tudo o que mencionava Eduardo Paes nos processos conduzidos por Bretas e ele não está envolvido em nenhum processo criminal”.
A reportagem não obteve resposta da LM Engenharia por meio do telefone e e-mail que constam em seu site.
ITALO NOGUEIRA E BRUNA FANTTI / Folhapress