BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) afirmaram nesta quarta-feira (6) reservadamente que a volta de Donald Trump à Casa Branca não terá efeito no Judiciário em relação às condenações de inelegibilidade impostas a Jair Bolsonaro (PL) nem sobre investigações já avançadas, como a que trata da trama golpista que culminou nos ataques de 8 de janeiro de 2023.
Apesar disso, magistrados dizem avaliar que pode crescer a pressão política para que o ex-presidente tenha a inelegibilidade revertida via perdão dado pelo Congresso Nacional.
Antes mesmo da vitória de Trump, bolsonaristas e o próprio Bolsonaro já vinham se articulando para incluir o perdão no projeto que tramita na Câmara e que, por ora, só trata da anistia aos que participaram dos ataques na praça dos Três Poderes.
Após o resultado anunciado nesta quarta-feira, interlocutores do ex-presidente disseram que o STF não conseguirá resistir ao “vento contra” que surgirá a partir do êxito do candidato republicano.
A avaliação de que a situação jurídica de Bolsonaro pode mudar diante da vitória de Trump é compartilhada por integrantes da defesa do ex-presidente -especialmente com uma eventual anistia aos envolvidos nos ataques às sedes dos Poderes.
Na semana passada, o próprio Bolsonaro foi ao Congresso negociar tanto a anistia aos que participaram dos atos de 8 de janeiro como a ele próprio.
“Foi um julgamento político [a inelegibilidade] e estamos buscando maneiras de desfazer isso aí. A prioridade nossa é o pessoal que está preso, eu sou o segundo plano”, afirmou o ex-presidente após reunião em que o seu partido, o PL, selou o apoio à candidatura de Davi Alcolumbre (União Brasil-AP) à presidência do Senado.
Na leitura de ministros do Supremo e de tribunais superiores, se aprovada no Congresso, a anistia pode levar a um novo embate institucional, já que a cúpula do Judiciário é contra o perdão aos invasores que destruíram as sedes dos três Poderes.
A reportagem conversou com seis ministros e auxiliares do Supremo nesta quarta. A avaliação majoritária é que o novo governo Trump terá outras preocupações, como o avanço da China, a política de imigrantes e as guerras na Ucrânia e no Oriente Médio.
Acreditar que a eleição do republicano pode impactar a situação criminal ou eleitoral de Bolsonaro, avaliam estes ministros, é um erro de avaliação sobre as prioridades de Trump e a capacidade do Brasil de solucionar seus dilemas internos.
Não se descarta, porém, que um eventual apoio da Casa Branca aos ataques de Elon Musk contra o ministro Alexandre de Moraes possa causar desassossegos. O bilionário, dono da rede social X (antigo Twitter), deve assumir um cargo no governo Trump em 2025 -o presidente eleito já prometeu a ele o posto de chefe de um novo Departamento de Eficiência Governamental.
A expectativa atual no Supremo é que a Polícia Federal apresente até o fim do ano o relatório final da investigação sobre a trama golpista envolvendo Bolsonaro e aliados para reverter o resultado da eleição de 2022. A eventual denúncia da PGR (Procuradoria-Geral da República) deve ficar para o primeiro semestre de 2025.
Ministros do Supremo afirmam, reservadamente, que preferem encerrar os casos antes das eleições de 2026, para não haver pendências antes do pleito. Os julgamentos também poderiam cessar a apreensão do mundo político sobre o destino de Bolsonaro, abreviando o protagonismo do tribunal nas investigações.
Bolsonaro está inelegível devido a duas decisões do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) expedidas em 2023. Com isso, por ora não poderá figurar nas urnas eletrônicas pelo menos até 2030.
Ele foi condenado no ano passado por abuso de poder político e econômico e uso indevido dos meios de comunicação sob acusação de difundir mentiras sobre o processo eleitoral em reunião com embaixadores e utilizar eleitoralmente o evento de comemoração do Bicentenário da Independência.
Além disso, o ex-presidente está no centro de outras investigações, entre elas a que apura as tratativas em torno de um golpe de Estado que visava impedir a posse de Lula (PT) em 2023.
Uma eventual anistia a Bolsonaro e aos golpistas que depredaram as sedes dos Poderes pode ser analisada pelo STF caso o tribunal seja provocado a se manifestar. O projeto de lei que perdoa os invasores ainda será analisado por uma comissão especial da Câmara dos Deputados.
O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), promete encerrar a análise da proposta de anistia sobre o 8/1 ainda em sua gestão. Isso significa que o deputado quer uma solução para o imbróglio ainda este ano, já que ele não deve comandar mais a Casa após o recesso parlamentar entre dezembro e janeiro.
Mesmo com o impacto político gerado pela eleição de Trump à Presidência do EUA, os ministros do STF fizeram piada nesta quarta antes da sessão no plenário, como mostrou a colunista Mônica Bergamo.
A brincadeira era adivinhar qual dos ministros seria o primeiro a ter o visto para entrada nos Estados Unidos negado por Trump. Em setembro, um grupo de deputados e senadores dos EUA encaminhou carta ao secretário de Estado americano, Antony Blinken, solicitando a revogação de vistos de todos os magistrados do STF.
Eles chamavam o ministro Alexandre de Moraes de “ditador totalitário” e argumentavam que os outros membros do Supremo eram “cúmplices destas práticas antidemocráticas”.
CAMILA MATTOSO E CÉZAR FEITOZA / Folhapress