SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O deputado estadual Paulo Fiorilo, líder do PT na Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp), afirma que a relação do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) com a Casa precisa ser azeitada. “Quando o governo não cumpre o que acordou, vai perdendo credibilidade inclusive com a oposição”, diz.
Em entrevista no plenário, que ganhava reparos na iluminação para a volta do recesso nesta terça-feira (1º), o petista falou sobre a fragilidade da base governista em meio à insatisfação de bolsonaristas com Tarcísio. O PT, por sua vez, apoiou o governador em quase todas as votações.
Ao manter um pé na canoa do bolsonarismo e outra no centro, o governador “corre o risco de morrer afogado”, avalia Fiorilo, que vê continuidade entre o governo João Doria (ex-PSDB) e o atual.
Ele critica a truculência da Polícia Militar, que foi defendida por Tarcísio apesar do saldo de ao menos oito mortos em operação em Guarujá, no litoral paulista.
**Mortos em operação da Polícia Militar em Guarujá**
A bancada da federação PT, PC do B e PV condenou a ação da PM, acionou o Ministério Público para investigar a operação e declarou que a Alesp irá acompanhar o caso.
“É preciso que se investigue com todo rigor. Há uma preocupação grande, porque a gente tem um governo de direita, que, por exemplo, não ampliou o uso de câmeras nos uniformes. Uma preocupação de que a polícia possa descambar para ações que não queremos, que é essa visão de direita, de violência, de combater o crime não com estratégia e inteligência, mas com as mortes que estamos vendo. Isso não serve só para a Baixada, mas para a cracolândia. Ali são ações em cima de ações que não têm resolvido, está faltando inteligência e não truculência”, diz.
**Configuração da Alesp**
Ao avaliar a nova dinâmica da Alesp, em que o PL substituiu o PSDB como sigla mais numerosa e que comanda a Casa, o petista afirma que a bancada do partido de Jair Bolsonaro “passa pelo processo de entender que é governo”. O PT segue na oposição, agora com uma esquerda mais numerosa -25 das 94 cadeiras.
Assim como os tucanos, o governo Tarcísio manobrou para impedir a instalação de CPIs pela oposição. “Não era para investigar o governo Tarcísio, era para olhar o governo Doria. Essa coisa de que eles eram oposição ao Doria, na prática o que estamos vendo é outra coisa”, diz.
Fiorilo afirma, porém, que “o governador ainda não está governando do ponto de vista legislativo” e “optou por um semestre com baixa intensidade em projetos de lei”.
**PT vota a favor do governo Tarcísio**
Até agora, o PT votou contra o governo apenas em um projeto, o da Lei de Diretrizes Orçamentárias –fidelidade que daria inveja à bancada governista, que frequentemente é balançada por rebeliões de bolsonaristas.
Os petistas deram voto sim ao aumento do salário mínimo, das polícias e do funcionalismo, apesar de questionarem alguns pontos. “Mas não eram projetos ideológicos, eram projetos de benefícios para categorias”, justifica.
“Projetos que Tarcísio anunciou que seriam de grande impacto e estruturantes ele não mandou. Não mandou a [privatização da] Sabesp, a mudança de recursos para saúde e educação, a reforma administrativa”, diz ele, listando propostas que devem ter a oposição do PT.
**Tarcísio entre o bolsonarismo e o centro**
Questionado se a produção legislativa do governo comprovaria a imagem de técnico que Tarcísio busca manter (e menos bolsonarista do que os bolsonaristas gostariam), Fiorilo diz que não. A falta de propostas complexas viria da “falta de acúmulo e traquejo”. Ele lamenta que Tarcísio não tenha enviado projetos que ajudem a criar empregos.
“Mesmo os projetos que vieram tiveram problemas. O da polícia tinha uma pegadinha. Podia ter sido um ganho e virou um desgaste. Ele pode querer passar essa imagem, mas está faltando uma produção legislativa mais intensa. Ou ele optou por fazer um governo de baixa intensidade para dialogar com o setor bolsonarista e com os de centro sem criar confusão”, diz.
O petista tampouco acredita que Tarcísio seja mais progressista do que o esperado, pela série de projetos pró-funcionalismo. “Diria que ele tenta dialogar com as partes. Manter um pé no bolsonarismo, mesmo que balançando, e outro pé mostrando que é um técnico.”
**Relação de Tarcísio com a Alesp**
Para Fiorilo, “falta azeitar a condução”. Ele lembra que Doria visitava a Alesp uma vez por mês e que Tarcísio o fez poucas vezes -“mas não é isso que muda a relação”, e sim o cumprimento de acordos.
O petista conta que, na votação do financiamento do trem intercidades, acertou com o governo emendas de transparência, que Tarcísio vetou. “É isso que pode dificultar a relação. […] Quando o governo não cumpre o que acordou, vai perdendo credibilidade inclusive com a oposição.”
Fiorilo diz que Tarcísio não tem uma base consolidada. “Para conseguir 48 [votos], muitas vezes teve que deixar para outro dia, segurar o máximo a votação para ver se descia alguém [para o plenário]. Isso mostra uma fragilidade grande.”
**Projeto de Tarcísio**
O líder defende o programa de Fernando Haddad (PT), derrotado nas urnas, e diz que Tarcísio “não conhecia e ainda não conhece o estado”. “A ideia era ter um estado indutor de desenvolvimento e não reativo”, diz.
Fiorilo afirma ver continuidade entre os tucanos e Tarcísio. “O que Tarcísio está dizendo é que vai entregar obras que estavam sendo feitas. Agora, eixos novos [ele] não tem. Ele repete Doria com as desonerações de ICMS, que continuam num cofre, ele não se dispôs a abrir. E o governo tem feito muito decreto, por exemplo de escola cívico-militar, e não traz o debate para cá.”
**Alta aprovação e acertos de Tarcísio**
Fiorilo diz que, a nível estadual, a população não costuma ligar a avaliação de serviços, como segurança e a ViaMobilidade, a Tarcísio, o que mantém sua aprovação em alta. “A grande marca do Tarcísio no início do governo foram as marteladas. O que aconteceu de lá pra cá? A gente não sabe.”
**Relação de Tarcísio com Lula e Bolsonaro**
Mas Fiorilo elogia a atuação de Tarcísio na tragédia da chuva em São Sebastião (SP), em fevereiro, e na relação institucional com o presidente Lula (PT). “Ele se saiu muito bem, diferente do Bolsonaro. Foi perfeito, entendeu o papel de ser governador.”
O mesmo serve para a entrevista de Tarcísio ao lado de Haddad para defender a Reforma Tributária. “Para os bolsonaristas é muito difícil. São códigos que dificilmente eles conseguem entender e digerir. Então vão continuar fazendo gestos contra o Tarcísio”, diz.
Como forma de contornar o mal-estar com a direita, Tarcísio hospedou o ex-presidente pela segunda vez no Palácio dos Bandeirantes. Fiorilo perguntou ao governo quais os custos disso. “O problema é hospedar mais de uma vez uma pessoa que não tem relação nenhuma com o estado do ponto de vista institucional. Por que o erário tem que pagar as despesas do ex-presidente?”, questiona.
**Tarcísio presidenciável em 2026**
Fiorilo afirma que não se pode descartar uma candidatura de Tarcísio ao Planalto se Bolsonaro seguir inelegível.
“Talvez por isso ele não se coloque agora [como candidato] para se preservar. E tenta construir esse caminho colocando um pé em cada canoa, a do bolsonarismo e a de centro, sempre correndo o risco de cair e morrer afogado. Isso tem um preço, aliás os bolsonaristas cobram permanentemente.”
**Centrão no governo Lula**
Para melhorar a relação com o Parlamento, Lula quer incluir PP e Republicanos, partidos de oposição em São Paulo, no ministério. “Pode ser contraditório que um partido aqui se posicione assim e lá de outro jeito? Claro que pode. Não há uma contradição que não possa ser explicada se a gente entender que o governo precisa compor uma maioria. Lula vai ter a serenidade e a sabedoria de fazer as mudanças necessárias sem tirar do PT ou das mulheres”, justifica.
**PT e Boulos na eleição de 2024**
Fiorilo defende o acordo do PT com Guilherme Boulos (PSOL) e diz que o deputado do PSOL tem grandes chances de ser eleito prefeito de São Paulo, já que o atual, Ricardo Nunes (MDB), é desconhecido do ponto de vista de entregas e de trajetória. “É uma minoria que tem defendido candidatura própria ou levar o Boulos para o PT, que não está em discussão mais.”
**PT em São Paulo**
Fiorilo admite que o PT tem dificuldade no estado, onde o antipetismo é aflorado. “Acho que a gente volta a crescer em 2024 até por conta do governo Lula, que começa a quebrar resistências. Precisamos aproveitar esse momento para distensionar e fazer com que as pessoas façam boas escolhas em 2024.”
Raio-X | Paulo Fiorilo, 59
Líder da federação PT, PV e PC do B na Assembleia Legislativa de São Paulo, é deputado estadual no segundo mandato. Foi vereador na capital paulista também por dois mandatos. Nascido em Araraquara (SP), tem graduação em filosofia e mestrado em ciências políticas pela PUC-SP.
CAROLINA LINHARES / Folhapress