SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Alguém que se guie apenas pela agenda oficial do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), não saberá dos encontros dele com seu padrinho político, o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), ou com próceres do centrão como o senador Ciro Nogueira (PP).
Isso porque, apesar de ter assumido com um discurso favorável à transparência, o bolsonarista Tarcísio omite de sua agenda encontros políticos com aliados, assim como parte das entrevistas a veículos de comunicação.
Além disso, o dia a dia de seu secretariado é uma incógnita, uma vez que boa parte não divulga nenhuma agenda.
Especialistas ouvidos pela Folha afirmam que a legislação prevê a divulgação das atividades das autoridades, embora não haja citação expressa à agenda.
A gestão Tarcísio tem entre suas bandeiras a regulamentação do assunto em esfera estadual o que não foi feito até o momento. O governo afirma que publica os compromissos do governador, mas que podem ocorrer alterações ao longo do dia, com reuniões imprevistas.
Um exemplo de omissão aconteceu no dia 7, quando Tarcísio acompanhou Bolsonaro em um encontro com o prefeito paulistano Ricardo Nunes (MDB), em mais um passo de aproximação entre o ex-presidente e o chefe do Executivo de São Paulo mirando as eleições de 2024.
Naquele dia, os compromissos oficiais do governador na agenda foram apenas a abertura de um congresso e os chamados despachos internos.
Na semana passada, em meio aos rumores sobre a possível saída de Tarcísio do Republicanos, ele tomou café da manhã com o presidente do PP, senador Ciro Nogueira.
O registro apareceu nas redes sociais do parlamentar, mas passou em branco na lista de compromissos do governador situação similar à do encontro dele com o deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG).
No dia 6 de julho, Tarcísio e Bolsonaro tiveram um desentendimento público durante a reunião do PL para discutir a posição do partido sobre a reforma tributária. O evento virou notícia no país todo, mas, no site do governo, não há nenhum compromisso do governador naquele dia.
O governador também divulga erraticamente compromissos com veículos de comunicação, uma praxe entre os governantes. No dia 9, por exemplo, não houve menção à entrevista ao podcast Flow.
Atualmente, não há uma norma estadual sobre o tema. No entanto, dizem especialistas, a Lei de Acesso à Informação (LAI) prevê a divulgação das atividades das autoridades.
Para Marina Atoji, diretora de programas da Transparência Brasil, não cabe ao governante adotar seletividade sobre o que vai divulgar para não deixar a sociedade no escuro sobre como gasta seu tempo.
“Não precisa divulgar quando vai ao médico, mas, se está se encontrando com pessoas também públicas e politicamente expostas, tem que ser divulgado ativamente e com antecedência”, diz ela.
O advogado Bruno Morassutti, cofundador da Fiquem Sabendo, agência de dados independente especializada na LAI, acrescenta que, se for caso de sigilo, isso também deve ser informado na agenda.
“No caso de sigilo, não é que a gente não saiba com quem se reuniu, pode ser que eventualmente não se saiba o conteúdo da reunião”, diz ele.
Morassutti diz que a divulgação faz bem ao próprio governante, por mostrar que ele não tem por que esconder seus compromissos.
No governo federal, há uma política oficial com regras de divulgação de agendas, com direito até a um painel da CGU (Controladoria Geral da União) com estatísticas sobre os encontros. Na Prefeitura de São Paulo, também há divulgação de compromissos de maneira mais detalhada que a do Palácio dos Bandeirantes.
A exemplo do governo federal, em um programa anticorrupção, a gestão Tarcísio acena com a bandeira da transparência ao prometer regulamentar as agendas, a participação de agentes em audiências e a concessão de hospitalidade por agente privado.
O decreto sobre o tema ainda não saiu e, por ora, o que se vê são retrocessos neste quesito.
A reportagem encontrou, por exemplo, compromissos do secretário de Governo da última gestão, cargo que pertenceu ao ex-governador Rodrigo Garcia (PSDB). Neste ano, sob Gilberto Kassab (PSD), os dados não constam do site.
O site da Secretaria da Educação até tem um espaço para agendas, mas os dados não foram preenchidos. Com isso, fica impossível saber o dia a dia do titular da pasta, Renato Feder, hoje envolto em questionamentos de conflito de interesse devido à sua ligação com a empresa Multilaser, que tem contrato com o governo.
Alguns secretários dificultam ao máximo possível a tarefa de controle externo de suas atividades.
A reportagem solicitou, via Lei de Acesso à Informação, a agenda da secretária de Políticas para Mulheres, Sonaira Fernandes, em fevereiro. A pasta ignorou os pedidos e recursos por meses, e os dados só chegaram em maio, via Ouvidoria Geral.
Nem todos, porém, adotam esse critério. O secretário da Casa Civil, Arthur Lima, divulga uma agenda completa, com um sistema de busca. Na terça-feira (15), recebeu os deputados estaduais Alex Madureira, Dani Alonso e Delegada Graciela, todos do PL.
Questionado, o governo citou reuniões imprevistas.
“O Governo de SP, prezando pela transparência das informações e dos seus atos, publica diariamente em seu site oficial os compromissos do governador Tarcísio de Freitas. No entanto, é importante ressaltar que a dinâmica da agenda pode levar a alterações no decorrer do dia, a exemplo de reuniões e compromissos imprevistos que podem surgir dada a natureza da função de governador”, diz, em nota.
A administração também ressalta que a lei federal sobre agendas se refere apenas a agentes públicos daquela esfera de poder.
ARTUR RODRIGUES / Folhapress