SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – No espírito de “sou brasileiro e não desisto nunca”, como costuma brincar, o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) se tornou o principal cabo eleitoral de Ricardo Nunes (MDB) e tem assumido tarefas complicadas, como convencer o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) a fazer campanha para o emedebista e assegurar aos conservadores e evangélicos que o prefeito pensa como eles.
No fim, a missão é uma só: impedir que o eleitorado antiesquerda da capital faça o M de Pablo Marçal (PRTB).
A dupla Nunestar, como tenta emplacar o jingle, terminou a semana aliviada com a pontuação de 27% para o prefeito no Datafolha de quinta-feira (12). Guilherme Boulos (PSOL) tem 25% e Marçal, 19%.
Admirado com o comprometimento de Tarcísio, o entorno de Nunes vê também uma racionalidade na atitude do governador que passa por aproveitar a coligação de 12 partidos do prefeito como uma insipiente aliança para 2026, ainda que o próprio MDB possa estar com Lula (PT) na eleição nacional.
Quem convive com o governador, no entanto, afirma que não há um cálculo político envolvido, até porque Tarcísio evita se posicionar como presidenciável, mas sim um pragmatismo de livrar a cidade de Marçal, considerado por eles um aventureiro e possível fonte de problemas para o Palácio dos Bandeirantes.
Outra razão para o comprometimento de Tarcísio é o fato de que foi ele quem, no princípio da corrida eleitoral, bancou a ideia de que o PL e o bolsonarismo se juntassem a Nunes em vez de lançar um candidato próprio –no caso Ricardo Salles (Novo), um desafeto do governador.
Um dos argumentos na época era o de que a direita sozinha não venceria na capital, onde Lula superou Bolsonaro em 2022, mas Marçal desafiou essa tese.
Se as agendas de governo conjuntas eram frequentes, agora Tarcísio participa de caminhadas no comércio da periferia, acompanha Nunes em jantares com empresários, dedica os fins de semana aos cultos ao lado do prefeito, se dispõe a gravar podcast conjunto para recortes nas redes e aparece na TV dizendo que “Marçal é a porta de entrada para Boulos”.
Marçal sentiu o golpe do efeito Tarcísio sobre os evangélicos. Na semana passada, acusou o governador de se reunir com líderes evangélicos para freá-lo e pediu: “não levante os meus irmãos contra mim”. Também orientou seus seguidores a irem para cima de Tarcísio nas redes.
O governador chegou a se encontrar com o influenciador, a pedido dele, no fim de agosto, como revelou o UOL, mas apenas reforçou que apoiará Nunes até o fim.
O mergulho de Tarcísio na campanha de Nunes, iniciado na segunda metade de agosto, quando o prefeito apareceu numericamente atrás de Marçal no Datafolha, contrasta com o vaivém de Bolsonaro, que chegou a flertar com o influenciador.
No início do mês, o ex-presidente aconselhou Tarcísio a não se associar a Nunes para não ser prejudicado por uma eventual derrota, mas o governador seguiu o caminho contrário. Horas após a recuperação do prefeito no Datafolha, na última quinta, Bolsonaro fez uma ligação de vídeo para apoiá-lo publicamente durante um evento com empresários.
Nos bastidores, Tarcísio afirmou a interlocutores que os gestos mais recentes de Bolsonaro têm a ver com a melhora de Nunes nas pesquisas e uma desilusão com Marçal, chamado de “arregão” e “traidor” em vídeo compartilhado pelo ex-presidente após o 7 de Setembro.
Para a campanha de Nunes, trocar Bolsonaro por Tarcísio é um bom negócio, a questão é que o próprio governador insiste na presença do ex-presidente na campanha.
Até aqui e apesar de Marçal, o prefeito recuperou o favoritismo ancorado em Tarcísio, no domínio da propaganda de rádio e TV e na estratégia inicial de focar em obras e políticas públicas entregues e não na polarização, o que se mostrou acertado, na avaliação dos emedebistas, dada a volatilidade e rejeição de Bolsonaro.
O Datafolha mostra que, entre eleitores de Tarcísio, Nunes lidera com 42%, seguido de Marçal com 36%. Entre os eleitores de Bolsonaro, o prefeito está atrás, mas alcançou o influenciador– o placar é de 39% a 42% ante 31% a 48% há uma semana. Além disso, a rejeição do governador como padrinho é de 52%, enquanto a de Bolsonaro alcança 63%.
Nesse sentido, como mostrou a coluna Painel, aliados de Nunes avaliam que a presença do ex-presidente não é mais tão necessária, o que o prefeito nega. Ele e Tarcísio têm dito que o entrave é a falta de espaço na agenda de Bolsonaro, lotada de viagens pelo país para fazer campanha, mas, segundo o governador afirmou no sábado (14), haverá uma brecha.
Em ao menos três encontros recentes, Tarcísio conversou pessoalmente com Bolsonaro para convencê-lo a se engajar por Nunes –no 7 de Setembro, quando o ex-presidente se hospedou no Bandeirantes, e em viagens a Registro (SP), na terça (10), e a Brasília, no último dia 4.
A dificuldade da tarefa ficou clara no dia seguinte, quando Tarcísio declarou à imprensa que Bolsonaro estava animado para entrar na campanha, e o ex-presidente disse em entrevista o contrário, que era “muito cedo”.
O discurso pró-Nunes de Tarcísio, seja qual for o ouvinte, já está ensaiado. Passa por dizer que o prefeito é humilde e trabalhador, enumerar as obras conjuntas com a prefeitura e ressaltar que Marçal é uma perigosa incógnita.
Ao estrear na campanha de Nunes comendo sanduíche de mortadela no Mercado Central, no último dia 27, Tarcísio foi mais tietado que o prefeito. E, no comércio de Itaquera, no último dia 5, chegou a ser mais animado que Nunes ao microfone.
Em um café da manhã de Nunes e Tarcísio com o mercado financeiro na casa do ex-governador Rodrigo Garcia, o tom foi de pito na Faria Lima, que estaria se encantando demais por Marçal, como mostrou o Painel no último dia 5.
Em troca, Nunes, que ao contrário de Marçal não tem pretensões eleitorais para além da prefeitura, apontou para 2026 e disse aos investidores querer se reeleger para ajudar Tarcísio a chegar à Presidência.
CAROLINA LINHARES / Folhapress