Tarifa zero começa com desconhecimento de passageiros e reclamações e ofensas a prefeito de SP

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Em um aceno visando as eleições municipais de 2024, o prefeito Ricardo Nunes (MDB) foi ao terminal Santo Amaro, na zona sul de SP, no início da madrugada deste domingo (17), para estrear a tarifa zero de ônibus na capital paulista aos domingos. Nunes se deparou com pessoas que não sabiam o que era o programa, reclamações e até um dedo do meio próximo a seu rosto.

A medida de Nunes tem início ao mesmo tempo em que o governo estadual de São Paulo, sob Tarcísio de Freitas (Republicanos), anuncia o aumento do valor da passagem para metrôs, trens e para a integração entre ônibus e transportes sobre trilhos. O anúncio do aumento, inclusive, pegou Nunes de surpresa.

Para a estreia do programa, Nunes pegou o ônibus —lotado de imprensa, assessores e alguns vereadores—no Terminal Parque D. Pedro 2°, pouco depois da meia noite. Enquanto entrava no veículo, duas mulheres, do lado de fora, protestavam. Uma delas, que afirmou ser servidora pública, mencionava a acusação, de 2011, feita pela esposa de Nunes por violência doméstica, ameaça e injúria. Após a exposição na imprensa, Regina Carnovale afirmou não se lembrar de ter feito um boletim de ocorrência.

Enquanto isso, no terminal, a reportagem encontrou pessoas que não sabiam sobre o programa de gratuidade dos ônibus aos domingos.

O próprio Nunes se deparou com a situação. Ao descer do ônibus próximo ao shopping Ibirapuera, o prefeito se sentou ao lado de duas mulheres, as quais não sabiam do programa. Em seguida, com um Bilhete Único em mãos —que, pouco antes tinha travado na catraca (o prefeito disse que por já ter sido usado pouco antes no mesmo lugar)—, explicou brevemente o funcionamento.

No mesmo local, Nunes começou a ouvir algumas reclamações sobre itinerários e disponibilidade dos ônibus noturnos. Uma das reclamantes comentou que já chegou a passar a madrugada esperando ônibus no terminal Parque D. Pedro, na região central, para conseguir ir para o terminal A. E. Carvalho, na zona leste de SP.

Nunes disse que há poucos usuários na madrugada —citou 22 mil pessoas— e perguntou a quantidade de pessoas que pegava ônibus com a reclamante. “Mas se tem passageiro a gente vai pôr ônibus. O Levi [dos Santos Oliveira; que estava no local] é presidente da SPTrans e já vai avaliar isso”, prometeu.

O prefeito, então, junto com a sua equipe, pegou um ônibus de volta para o terminal Santo Amaro. Dessa vez, o veículo estava cheio de usuários cotidianos da linha.

Dentro do ônibus, ao ver a movimentação, uma das passageiras perguntou quem era a pessoa que estava ali; recebeu a resposta de que era o prefeito.

No decorrer do caminho de volta para o terminal Santo Amaro, já próximo à 1h, foram surgindo reclamações dentro do ônibus —e uma selfie com o prefeito. Entre as queixas, pessoas pedindo mais agilidade para o embarque dos passageiros que subiram junto ao prefeito, reclamação de cansaço, e gente comentando que o veículo não estava em velocidade normal e que os passageiros acabariam perdendo os próximos ônibus até suas casas.

Logo após chegar ao terminal e descer do coletivo, Nunes caminhou alguns passos e deu de cara com um dedo do meio em frente ao seu rosto. O jovem que empunhava o dedo perguntou ao prefeito sobre a possibilidade de reeleição e falou que Nunes não contaria com o seu voto. Alguns passos a mais trouxeram outra reclamação —por demora— de um homem que esperava sua condução chegar.

Nunes planeja um novo trajeto de ônibus neste domingo. O prefeito deve visitar a Vila de Natal Água Espraiada, na zona sul.

MOTIVAÇÃO PARA A TARIFA ZERO AGORA

Em entrevista coletiva pouco antes da estreia do programa batizado de “Domingão Tarifa Zero”, Nunes apontou o lazer como motivação para a iniciativa.

Segundo o prefeito, aos domingos há uma ociosidade na frota de 60% dos ônibus. “A gente está dando a gratuidade porque vai aumentar o número de pessoas utilizando o transporte coletivo, de algo que a gente já pagava e estava ocioso. E as pessoas poderem conhecer a cidade, irem nos parques, equipamentos culturais, equipamentos esportivos, visitar o centro, um parente, enfim, fazer o uso da sua cidade”, disse Nunes.

“O trabalhador recebe o vale-transporte para, durante a semana, ir trabalhar. E, no final de semana, fica ali, às vezes em casa, sem a possibilidade de ir com a sua família, poder fazer o seu lazer, curtir as atividades culturais da cidade, conhecer a cidade”, afirmou o prefeito.

Anteriormente à estreia, o prefeito citava que a tarifa zero deverá contemplar 1.175 linhas e uma frota de 4.830 ônibus. O funcionamento deve ocorrer da 0h às 23h59 dos domingos e se espera beneficiar 2,2 milhões passageiros.

Para quem tem o Bilhete Único, a SPTrans diz que o usuário poderá passá-lo na catraca, porém, o valor não será debitado do cartão. Para quem não tem o Bilhete Único, o cobrador irá liberar a catraca. Em ônibus sem cobrador, o motorista irá liberar a passagem.

Nunes afirma que é possível que algumas adequações, por parte da SPTrans, sejam necessárias após o acompanhamentos da demanda nos primeiros domingos de funcionamento.

A Folha questionou o prefeito sobre quais estudos foram usados para embasar a decisão. Nunes apontou o dado de 40% da frota em atividade aos domingos. “É possível a gente fazer, aproveitando a ociosidade que já tem”, disse.

Metrô e CPTM não aderiram à gratuidade e a cobrança no transporte sobre trilhos permanece aos domingos. Inclusive, para elas, a partir de 1º de janeiro, as tarifas serão reajustadas para R$ 5.

A prefeitura diz que a medida terá custo de R$ 238 milhões por ano. Esse é o valor que as tarifas que são pagas atualmente aos domingos rendem aos cofres públicos. Segundo a gestão, não será necessário aumentar os subsídios pagos às empresas de ônibus, atualmente de R$ 6 bilhões por ano.

Desde 2022, a prefeitura arca com mais da metade do serviço de ônibus da capital. A gestão atual destinou R$ 5,2 bilhões como forma de subsídio às empresas, cobrindo 51% dos gastos de R$ 10,3 bilhões de toda a operação. Os outros R$ 5,1 bilhões foram pagos com receitas do sistema.

PHILLIPPE WATANABE / Folhapress

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