SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Chovia forte, o congestionamento em São Paulo era grande e o Brasil atravessava as primeiras horas do luto coletivo após a queda do avião da Voepass, em Vinhedo, no interior paulista, no dia da segunda apresentação da peça “Último Ensaio”, no Sesc Pompeia.
Parte das comemorações dos 15 anos da Cia OmondÉ, o espetáculo aborda as calamidades cotidianas e a busca de sentido para a vida. “Lá fora tudo está inconcebível”, repetem os artistas em cena, enquanto o barulho do temporal parece confirmar a sentença.
No bunker teatral, o público é convidado a respirar e a se divertir para escapar do caos e da violência. É como um aconchego no interior do prédio projetado por Lina Bo Bardi. No palco, no entanto, também há conflitos, dores e aflições.
“A qualquer momento parece que uma catástrofe vai cair na nossa cabeça”, afirma Inez Viana, autora e diretora da peça. “A sensação que eu tenho é que está acelerando demais. É avião que cai, são incêndios, enchentes”.
Em um determinado momento da encenação, uma das atrizes revela que viu uma mãe ser baleada com seu bebê no colo. Ela salva a criança, mas comete um delito ao levá-la para o ensaio, o que gera desavenças.
Enquanto ensaia e faz palavras cruzadas, a trupe repete que, ali, as pessoas podem se sentir bem. É como um esforço para que a arte salve o mundo do caos. É possível?
“Como estamos contaminados pelo que acontece lá fora, a realidade vai quebrando, os humores mudam, brigas acontecem, o elenco se desentende, mas, no final, há a possibilidade de que as histórias fiquem guardadas. E daqui a cem anos, as nossas histórias continuarão sendo contadas”, afirma a diretora.
Inédita, a peça foi criada inicialmente para apenas dois atores, como parte da pós-graduação em direção artística cursada por Viana. Com o convite para a mostra de repertório no Sesc Pompeia, o espetáculo cresceu e incluiu no elenco todos os integrantes da companhia, além de duas artistas convidadas, Lux Nègre e Jade Maria Zimbra.
Entre os recursos cênicos usados estão a metalinguagem e um jogo de contação de histórias que envolve a plateia e surpreende. Além disso, em solilóquios que mesclam realidade e ficção, os atores e atrizes constroem uma espécie de linha do tempo sobre os últimos 15 anos.
A Cia OmondÉ foi criada em 2009, a partir de um encontro teatral que resultou na montagem de “As Conchambranças de Quaderna”, de Ariano Suassuna, apresentada inicialmente na Festa Internacional de Teatro de Angra, no Rio de Janeiro.
A peça foi um sucesso de público e crítica, ocupou outros espaços e levou o grupo a ser reconhecido e premiado.
O nome vem de uma fala do texto de Suassuna e o elenco original continua na companhia, sobrevivendo às dificuldades do fazer teatral. É formado por sete atores e atrizes: Carolina Pismel, Debora Lamm, Iano Salomão, Júnior Dantas, Leonardo Brício, Luis Antonio Fortes e Zé Wendell.
A companhia tem nove peças no repertório, todas de autores brasileiros, como Suassuna, Nelson Rodrigues, Grace Passô, Jô Bilac, Alcione Araújo e Inez Viana.
Além de “Último Ensaio”, duas outras peças estão na mostra do Sesc Pompeia: “Nem Mesmo Todo o Oceano” (29 e 30/8, às 20h), de 2013, inédita em São Paulo, inspirada no livro homônimo de Alcione Araújo; e a premiada “Mata teu Pai” (31/8 às 20h, e 1º/9, às 17h), de 2017, escrita por Grace Passô, que reconta a trajetória de Medeia, trazendo para os nossos dias a tragédia grega de Eurípedes.
A ocupação no Sesc Pompeia inclui também um bate-papo e uma oficina gratuitos.
Último Ensaio
Quando Qui. a sáb., às 20h; dom., às 17h. Até 25/8Onde Sesc Pompeia – r. Clélia, 93, São Paulo
Classificação 14 anos
Elenco Carolina Pismel, Debora Lamm, Iano Salomão
Direção Inez Viana
CRISTINA CAMARGO / Folhapress