BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Dias Toffoli suspendeu nesta terça-feira (6) o sigilo das ações em que determinou uma investigação sobre a ONG Transparência Internacional e em que interrompeu o pagamento de multas do acordo de leniência da Novonor (antiga Odebrecht) e da J&F, grupo dos irmãos Joesley e Wesley Batista.
Toffoli considerou que, diante da publicidade dada ao caso, “não mais se justifica a manutenção do sigilo inicialmente imposto”.
Com isso, peças dos processos, as petições 12.061 e 11.972, ficam públicas. O ministro, porém, ponderou que a Secretaria Judiciária deve preservar em sigilo as peças que porventura possam ser usadas futuramente em decisões do relator no caso, ele mesmo.
Os documentos mostram que a procuradora-geral interina Elizeta Ramos, que ficou no posto de setembro a dezembro passado, foi contra o envio para Toffoli da notícia-crime apresentada contra a ONG.
Em parecer em outubro, Ramos afirmou que o procedimento sob responsabilidade do ministro aborda o acordo com a Odebrecht, enquanto o questionamento relativo à atuação da Transparência Internacional trata do compromisso firmado com a J&F, fora do âmbito da Lava Jato.
“Os envolvidos nos acordos, bem como as operações policiais e até mesmo as entidades envolvidas nos acordos de leniência são distintos e, a princípio, não possuem prerrogativa de foro perante o Supremo”, escreveu a interina.
O Ministério Público, porém, já tinha se posicionado a favor da remessa do caso para Toffoli, por meio da ex-vice-procuradora-geral Lindôra Araújo.
Entre os documentos do caso liberados agora pelo ministro, estão os acordos de leniência firmados pelas duas empresas, espécie de delação premiada em que elas reconhecem desvios em contratos com o setor público e se comprometem a ressarcir o prejuízo.
Também foram divulgadas atas de assembleias das empresas, ofícios do MPF (Ministério Público Federal) e relatórios da PF.
Os autos trazem parte das mensagens trocadas entre procuradores da extinta força-tarefa da Lava Jato vazadas e do então juiz Sergio Moro no âmbito da Operação Spoofing, além dos pedidos das defesas das empresas.
Na segunda (5), Toffoli determinou que a ONG Transparência Internacional seja investigada por supostamente se apropriar indevidamente de recursos públicos na época da Operação Lava Jato.
Segundo o ministro, a ONG, que ele chamou de instituição privada “alienígena” e “com sede em Berlim”, pode ter recebido valores que deveriam ter sido destinados ao Tesouro Nacional. Escreveu ainda que “fatos gravíssimos” não passaram pelo crivo do Judiciário e do TCU (Tribunal de Contas da União).
A PGR (Procuradoria-Geral da República) referendou, em 2020, a informação de que a entidade não recebeu remuneração pela assistência prestada na leniência.
Já a decisão sobre a suspensão de pagamento do acordo entre a Novonor e o MPF foi tomada em 31 de janeiro, até que a holding dona da construtora consiga analisar todo o material relacionado à Spoofing.
No mesmo processo, Toffoli interrompeu em dezembro o acordo do pagamento da multa de R$ 10,3 bilhões prevista no acordo de leniência da J&F, sob o mesmo argumento.
As duas empresas alegaram que os agentes públicos responsáveis pela condução da Lava Jato em Brasília teriam desvirtuado instrumentos legais de combate e que teria havido coação para que fossem celebrados os acordos de leniência.
Nesta segunda-feira (5), o procurador-geral da República, Paulo Gonet, recorreu contra a decisão. O chefe do MPF defendeu que o recurso seja redistribuído pelo magistrado a um colega ou, se ele assim não entender, que reveja seu posicionamento. Caso mantenha o decidido, que submeta a controvérsia ao plenário do tribunal, composto por 11 integrantes.
TRANSPARÊNCIA INTERNACIONAL DIZ SOFRER RETALIAÇÕES INJUSTAS
A direção mundial da Transparência Internacional divulgou nota em inglês nesta terça (6) em que denuncia o que vê como retaliações injustas em resposta ao trabalho anticorrupção que vem desempenhando no Brasil. Diz ainda que a autorização de Toffoli para iniciar uma investigação contra a organização é baseada em desinformação.
A nota afirma que é “lamentável testemunhar ação legal baseada em acusações infundadas e informações falsas, suprimindo os esforços da sociedade civil para expor a corrupção e a influência sem controles dos poderosos”.
O texto acompanha declaração do presidente da organização, François Valérian, em que ele declara apoio e total confiança na filial brasileira e define o episódio como um ataque.
“Estes ataques ressaltam o papel crucial do trabalho da Transparência Internacional no Brasil para manter o poder sob controle. Não seremos intimidados e nosso compromisso de denunciar a corrupção permanece firme”, afirma ele.
“É digno de nota que esse pedido de investigação coincidiu com a publicação, uma semana antes, do Índice de Percepção da Corrupção”, declara ainda, adicionando que a publicação destacava decisões do Judiciário que, segundo a ONG, “têm perpetuado a impunidade generalizada para esquemas de corrupção em larga escala”.
CONSTANÇA REZENDE / Folhapress