Trump se declara inocente de todas as acusações em processo do 6 de Janeiro

WASHINGTON, EUA (FOLHAPRESS) – O ex-presidente Donald Trump voltou a Washington nesta quinta (3), mas não como gostaria. Ele se apresentou à Justiça às 16h25 para ser acusado formalmente por atentar contra pilares da democracia.

Na audiência, que durou cerca de meia hora, ele se declarou não culpado pelos quatro crimes de que é acusado, uma lista que inclui de conspiração para defraudar os Estados Unidos à obstrução de procedimento formal, segundo documento divulgado pelo conselheiro especial do Departamento de Justiça Jack Smith na última terça.

Ele foi liberado sob algumas condições, como não se comunicar com nenhuma das testemunhas do caso, a não ser via advogados, e não violar nenhuma lei. Smith, a quem Trump vem atacando continuamente, acusando-o de perseguição política, também estava presente na sala.

A pena máxima prevista para os crimes varia de 5 a 20 anos, a depender da acusação. O tempo total de prisão, porém, vai depender da sentença e por quais acusações ele for condenado, caso seja.

Depois da audiência, ao embarcar de volta para Nova Jersey, o ex-presidente afirmou a jornalistas que aquele era “um dia muito triste para o seu país. “Esta é uma perseguição política. Isso não deveria poder acontecer nos EUA.”

Ele também aproveitou para criticar o presente Joe Biden, reclamando do estado das ruas da capital americana.

“Foi também um dia muito triste passando de carro por Washington (DC) e vendo a sujeira e a decadência e todos os edifícios quebrados e paredes e o graffiti. Esse não é o lugar que eu deixei”, afirmou.

A primeira audiência com a juíza responsável pelo caso, Tanya S. Chutkan, foi marcada para 28 de agosto. Ela já afirmou que pode dispensá-lo de comparecer pessoalmente a essa etapa. A data do julgamento ainda não foi definida. Acusação e defesa devem apresentar suas propostas nos próximos dias.

As acusações feitas esta semana se somam àquelas de outros dois processos criminais: um na Justiça de Nova York, envolvendo a compra do silêncio de uma atriz pornô na campanha de 2016, e outro, na Justiça Federal, relacionada à posse ilegal de documentos secretos da Casa Branca após Trump ter deixado a Presidência.

Assim, trata-se da terceira vez que o republicano comparece perante um juiz neste ano. A audiência desta quinta, chamada em inglês de “arraignment”, equivale à audiência de instrução no Brasil, etapa inicial de um processo criminal, em que o réu ouve as acusações e é questionado se declara-se culpado ou não.

Nas duas audiências anteriores, Trump afirmou não ser culpado. Ele também teve apenas as digitais coletadas –não tiraram a fotografia, conhecida como “mugshot”, que costuma ser registrada pela Justiça.

A audiência ocorreu no tribunal E. Barrett Prettyman, nas proximidades do Capitólio, palco da invasão orquestrada por apoiadores do ex-presidente em 6 de janeiro de 2021, na tentativa de impedir a confirmação da vitória de Joe Biden à Presidência, em 2020. Então, cinco pessoas morreram.

O episódio, junto às tentativas de Trump de reverter sua derrota na eleição, é o pano de fundo do processo na Justiça Federal ao qual ele responde agora.

Em preparação para a audiência, um grande esquema de segurança foi montado na capital americana. No entanto, apenas algumas dezenas de manifestantes apareceram, que se dividiam entre apoiadores e opositores do ex-presidente.

Enquanto esperavam Trump chegar, eles disputavam a atenção de jornalistas. Caixas de som, megafones, bandeiras e fantasias foram alguns dos métodos empregados.

Segurando um mastro com uma bandeira em apoio ao republicando e usando um boné com a frase “Make America Great Again”, Daniel de Moura, 32, diz que Trump “defende a população de toda a corrupção”.

Daniel afirma ser brasileiro-americano, e diz que está nos Estados Unidos há cerca de seis anos. Para ele, o empresário teve a eleição roubada, assim como teria ocorrido com o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) no Brasil.

O manifestante se define como um ativista político, e afirma que pessoas que participaram da invasão do Capitólio foram presas sem terem feito nada.

Já Domenic Santana, 61, protestou contra Trump. Apesar de se identificar como republicano, ele afirma que o ex-presidente é um “rato”, um “artista da mentira”, e que os republicanos que ainda o apoiam são “zumbis”. Nas primárias republicanas, ele diz apoiar o ex-governador de Nova Jersey Chris Christie.

O restante dos manifestantes estava concentrado numa mesma área, o que gerou alguns embates verbais. Uma mulher com um megafone fez críticas ao republicano para se sobrepor às falas de trumpistas, e outra levou uma caixa de som, circulando com a placa “turnê de celebração da acusação contra Trump”.

Após a chegada do republicano ao tribunal, manifestantes de cada lado continuaram medindo forças —pacificamente.

Um homem que se apresentava como “negro, republicano e apoiador de Trump” cantava uma música contra Biden com auxílio de uma caixa de som. Ao mesmo tempo, outro homem pulou em frente a ele e começa a balançar uma placa com a frase “prendam o traidor”. Em uma outra esquina, um grupo de pessoas repetia em conjunto “prendam-no, prendam-no”.

Além dos manifestantes, muitos curiosos se aglomeravam no ponto da calçada mais próximo da garagem por onde Trump entrou no prédio. Bloqueios policiais em vários pontos do quarteirão impediam a aproximação do local onde o ex-presidente entrou e saiu do prédio.

Enquanto aguarda a definição de uma data de julgamento nesse caso, Trump já tem que se preocupar com outro, de Nova York, marcado para março do ano que vem. Nenhuma dessas ações pode tirá-lo da corrida pela Casa Branca, mesmo no caso de ele ser condenado, uma vez que a legislação americana não prevê nenhum impedimento para que uma pessoa acusada ou presa dispute um cargo público.

Em sua defesa, o ex-presidente afirma sofrer perseguição política –o Departamento de Justiça, lado acusador nos processos dos documentos sigilosos e do questionamento da eleição, está sob o guarda-chuva do governo Biden. Em resposta à acusação mais recente, seus advogados têm afirmado ainda que o republicano exercia seu direito à liberdade de expressão ao questionar o resultado do pleito e que ele genuinamente acreditava que uma fraude ocorreu —os procuradores dizem que ele sabia estar mentindo.

Em uma longa nota enviada a jornalistas pouco antes da audiência, a campanha de Trump listou diversas situações que supostamente mostrariam o partidarismo de Smith e seu “histórico de processos fracassados”.

Por fim, Trump também afirma que as acusações são uma estratégia para desviar a atenção das investigações contra Hunter Biden, filho de Joe Biden, por possíveis violações de leis relacionadas a impostos e por lavagem de dinheiro em transações comerciais estrangeiras.

FERNANDA PERRIN / Folhapress

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