SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, disse nesta segunda (10) que abrirá caminho para a adesão da Suécia à Otan (aliança militar ocidental) caso a UE (União Europeia) aceite seu país como membro.
“Peço a esses países que fazem a Turquia esperar à porta da União Europeia por mais de 50 anos. Primeiro, venham e abram caminho para a Turquia na UE e então nós abriremos caminho para a Suécia, assim como fizemos para a Finlândia”, afirmou a repórteres antes de embarcar para a cúpula da Otan em Vilinus (Lituânia).
Ele afirmou que levará a mensagem, surpreendente, à reunião que ocorrerá na terça (11) e quarta (12). É um cavalo-de-pau na tática turca até aqui, que visava pressionar o país nórdico a enquadrar e extraditar os dissidentes contrários a Erdogan lá exilados.
Além disso, o presidente busca voltar a ter acesso a material militar americano, no caso caças F-16. Ancara e Washington estão às turras desde que Erdogan comprou sistemas antiaéreos S-400 da Rússia, algo que os americanos consideraram ameaçador para os segredos de seu mais moderno caça, o F-35, que os turcos ajudavam a produzir e iriam operar.
Resultado, o então presidente Donald Trump, já criticado por Erdogan após rejeitar a extradição do clérigo a quem um golpe militar contra o turco em 2016 foi atribuído, mandou cortar Ancara do consórcio do F-35. A Turquia tem uma robusta frota de 252 F-16, mas a maioria está ficando obsoleta e precisa de reposição.
No domingo (9), Erdogan falou disso com o americano Joe Biden, e negou condicionar o apoio à entrada dos suecos na Otan aos F-16. Agora, sacou essa nova carta, que deverá desagradar diversos membros da União Europeia -o clube político e econômico europeu tem 27 integrantes, 22 dos quais são também aderentes da Otan.
Erdogan falou em 50 anos de espera, mas na realidade as negociações começaram em 2005, quando ele já era primeiro-ministro. A França sempre foi um vocal opositor da medida, por motivos que os turcos consideram xenofóbicos: Paris lida com crise nas suas comunidades de imigrantes muçulmanos, religião predominante da Turquia.
Para piorar o azedume, depois do golpe de 2016 a UE criticou a repressão interna na Turquia, país que namora o conceito de democracia iliberal há anos. E a França estabeleceu uma parceria militar para armar a Grécia, rival histórica de Ancara, apesar de ambos fazerem parte da Otan.
Nos últimos anos, contudo, a relação melhorou justamente devido a acordos visando restringir a imigração ilegal que passa por território turco.
A posição de Ancara é única. Erdogan é o líder da Otan mais próximo de Vladimir Putin, e no sábado (8) disse que o irá receber em seu país. Por outro lado, apoia a Ucrânia na guerra em curso, e naquele mesmo dia rompeu um acordo com Moscou e devolveu a Kiev comandantes do grupo neonazista Azov, que haviam sido exilados na Turquia após serem derrotados em Mariupol no ano passado.
A introdução do item UE na lista de Erdogan adiciona dificuldades para a Suécia. O país escandinavo abandonou 200 anos de neutralidade no ano passado, ao pedir para integrar a Otan ao lado de sua vizinha Finlândia, que por sua vez deixou de lado sete décadas de não alinhamento militar.
Ambos os países são integrantes da UE desde 1995 e decidiram que a agressão russa à Ucrânia os colocava na fila do Kremlin. Fizeram o pedido de adesão juntos e todos os então 30 países da aliança, menos Turquia e a sua aliada iliberal Hungria, ratificaram o movimento em seus Parlamentos. Sem unanimidade, não há entrada no clube.
Ao fim, turcos e húngaros admitiram Helsinque em abril, numa derrota de Putin, que viu sua fronteira com a Otan dobrar em uma canetada. Agora, tanto turcos quanto húngaros jogam juntos para atrasar a vida de Estocolmo.
A reação da Otan foi a possível. O secretário-geral, o norueguês Jens Stoltenberg, correu aos microfones para dizer que apóia o pleito turco de adesão à UE. E disse que “estamos trabalhando duro” para garantir que a Suécia seja admitida, o que ele pretendia que ocorresse nessa cúpula.
Mais reuniões estão previstas para esta segunda na capital lituana, uma joia barroca transformada em base militar, com blindados nas ruas, mil soldados da Otan como reforço e baterias antiaéreas americanas Patriot, operadas por alemães, alinhadas junto à pista de seu aeroporto internacional. A cidade fica a 30 km da aliada de Putin Belarus, e o país tem fronteira ao sul com o encrave russo de Kaliningrado.
A questão sueca é uma das espinhosas da cúpula, que deverá lidar entre outras coisas com a relação Otan-China, mais armas para Kiev em meio à difícil contraofensiva em curso, a nuclearização eventual da Polônia e o reforço do flanco leste da aliança.
IGOR GIELOW / Folhapress