TAIPÉ, TAIWAN (FOLHAPRESS) – As ações da gigante taiwanesa de chips TSMC caíram 0,6% na sexta-feira, em movimento creditado ao retorno da chinesa Huawei aos smartphones avançados, com chips fabricados pela SMIC, também da China. Até três anos atrás, quando chegou a liderar as vendas mundiais, a Huawei usava chips da TSMC.
Daniel Nystedt, um dos analistas de referência para chips ou semicondutores em Taiwan, sugere calma na avaliação do impacto do Mate 60 Pro, o aparelho lançado na semana passada pela Huawei –e que vem causando espécie não só no mercado financeiro, mas em Washington, com ameaças de retaliação.
“Um celular não vence a guerra dos chips”, afirma Nystedt, que passou a semana na Semicon Taiwan, em Taipé. É uma das maiores feiras voltadas a chips no mundo, e o Mate 60 Pro foi um dos assuntos, pelos corredores, com especulações e dúvidas sobre como a Huawei conseguiu romper o bloqueio dos EUA.
“A notícia sobre a Huawei não chega a ser surpresa”, comenta ele, lembrando que a SMIC, que fabricou o chip, “tem um histórico de contratação de ex-engenheiros da TSMC”. O próprio co-CEO da empresa baseada em Xangai, Liang Mong Song, é lembrado como “gênio renegado da TSMC”, da qual foi tirado.
Outro ponto é que a tecnologia usada para a fabricação teria sido de geração anterior, mais simples, DUV (deep ultraviolet), com capacidade menor para produzir em massa e limite de 7nm. Liang, com sua experiência de três décadas, entre TSMC e SMIC, teria conseguido tirar do processo mais do que ninguém, na China.
Mas em 2018 a TSMC já produzia chips de 7nm usando DUV, para sua primeira versão do semicondutor. Ou seja, o chip de 7nm do Mate 60 Pro, identificado por vários analistas que abriram o aparelho, está cinco anos atrasado. “A SMIC produziu com esse processo, eles não usaram tecnologia EUV”, sublinha Nystedt.
EUV (extreme ultraviolet) é o processo usado pela TSMC para fabricar os chips de 3nm que estarão na nova linha iPhone, a ser lançada na próxima terça-feira (12). A Apple teria comprado toda a produção deste ano do semicondutor de 3nm da empresa taiwanesa, mas também suas ações vêm caindo nos últimos dias.
Além da concorrência direta da Huawei, a razão é que, no rastro do lançamento do Mate 60 Pro, o governo chinês restringiu o uso de iPhone, da Apple, por funcionários de governos locais e de empresas estatais. A restrição a celulares de marcas estrangeiras já existia desde 2020 para ministérios e outros órgãos centrais.
A Apple perdeu, quinta e sexta, US$ 190 bilhões de seu valor de mercado. A consultoria inglesa Oppenheimer Analysis projeta que, com a concorrência do smartphone da Huawei, que acrescentou dois modelos nesta sexta, Mate 60 Pro+ e Mate X5, dez milhões de iPhones deixarão de ser vendidos no ano que vem.
Como a TSMC, a fabricante americana de chips Qualcomm, que fornece para diversas empresas chinesas, inclusive a Huawei, também viu suas ações caírem. Segundo o analista Ming-Chi Kuo, da TF International Securities, ela deverá deixar de vender entre 50 e 60 milhões de semicondutores no ano que vem.
Nystedt insiste, porém, que um semicondutor de 7nm é um avanço pequeno para a Huawei e a própria China se firmarem. “Eles podem copiar, podem fazer bastante engenharia reversa, mas será muito difícil ir além da tecnologia de processo de 7nm, não importa quanto dinheiro eles gastem”, afirma.
“Há pessoas inteligentes na China e ela pode um dia se tornar líder em algum aspecto, mas é uma indústria em que nenhuma nação tem toda a tecnologia”, argumenta. “Os EUA inventaram, mas sem equipamentos da Holanda e Japão, fabricação da Coreia e Taiwan, embalagens e testes da China, não funciona.”
Questionado sobre o festejado avanço da Shanghai Micro, que segundo o jornal Zhengquan Ribao, de Pequim, vai entregar neste ano máquinas de litografia para fazer chips de 28nm, muito usados de carros elétricos a mísseis, Nystedt diz que “certamente é possível que ela tenha desenvolvido tal máquina e vai ajudar”.
No entanto, “é um milímetro na jornada de mil milhas que a China terá que percorrer antes de poder realmente ganhar terreno na indústria”.
NELSON DE SÁ / Folhapress