SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Cinco meses após o fim da greve motivada pelo déficit de professores, a USP (Universidade de São Paulo) não cumpriu sua principal promessa aos alunos: a contratação de 148 docentes temporários. Até fevereiro deste ano, foram apenas 12, o que corresponde a 8% do total previsto.
Em negociação para o fim do movimento, ocorrido entre setembro e novembro de 2023, a reitoria prometeu admitir os educadores até dezembro. Eles se juntariam a outras 879 vagas efetivas já previstas até 2025.
Segundo levantamento realizado pela Adusp (Associação de Docentes da Universidade de São Paulo), com base nas folhas de pagamento disponíveis no Portal da Transparência, apenas 7 das 42 faculdades –na capital e no interior– haviam contratado temporários de setembro de 2023 até fevereiro deste ano.
Em nota, a reitoria afirma que não houve mudanças em relação à distribuição de vagas, liberadas como mencionado no final do ano passado.
“O processo de preenchimento dessas vagas fica a cargo das unidades e passa por trâmites legais e regimentais, inclusive para distribuição interna, o que pode demorar. Além de ter várias etapas, os concursos também precisam passar por discussões em reuniões colegiadas e respeitar prazos regimentais obrigatórios”, afirma a gestão de Carlos Gilberto Carlotti Júnior.
Conforme a Adusp, das 12 contratações prometidas, três foram realizadas na Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, duas na Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia, duas na Faculdade de Odontologia de Bauru e duas na Escola de Engenharia de São Carlos.
Além disso, houve uma na Faculdade de Ciências Farmacêuticas, uma na Escola de Engenharia de Lorena e uma no Instituto de Física.
Das unidades que não contrataram, 16 perderam professores temporários. Dentre elas estão a FEA (Faculdade de Engenharia e Administração), a ECA (Escola de Comunicação e Artes), a Faculdade de Medicina, a Faculdade de Educação, a FFLCH (Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas) e a Escola Politécnica, conhecida como Poli.
No caso de professores efetivos, as contratações tiveram mais avanço. Até fevereiro, 70 novos chegaram. O número corresponde a 8% das 879 vagas previstas até o fim do próximo ano.
Em algumas faculdades, porém, nenhum novo docente foi acrescentado ao quadro. O caso mais chamativo é o da Poli, que ainda perdeu quatro profissionais de setembro a fevereiro. A escola aderiu à paralisação dos estudantes no ano passado após duas décadas sem participar desse tipo de protesto.
No período de 2020 a 2023, a unidade responsável pelos cursos de engenharia recebeu 42 vagas, preenchendo nove. Outros 12 postos foram disponibilizados pela reitoria no pós-greve de 2023. Até hoje, nenhuma foi a concurso.
O chefe da área de contratações da Poli, Gustavo Cubas Gusmão, explica que a simples concessão da vaga não autoriza realização imediata do processo.
Segundo ele, após receber o cargo, a unidade deve decidir em colegiado seu departamento de destino. Com a distribuição aprovada, é viabilizado o início do processo para abertura do edital, para o qual inscrições devem ficam abertas de 30 a 120 dias.
O diretor da unidade, Reinaldo Giudici, diz que as etapas são complexas. “Por exemplo, só a discussão sobre a distribuição de claros [professores temporários] entre os departamentos pode levar meses, […] além do risco da realização de provas sem indicado ou com desistência. Tivemos três casos no ano passado.”
Com muita facilidade, afirma o gestor, o rito completo para admitir um professor pode levar mais de um ano. Isso explicaria porque conseguiram preencher somente nove vagas até o momento.
A falta de docentes causa problemas em algumas faculdades. No início deste ano, alunos do curso de alemão, sob responsabilidade da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciência Humanas, reclamaram sobre aulas canceladas.
Graduandos da Escola de Arte Dramática, uma das mais importantes instituições de ensino de teatro da América Latina, também estão sem atividades. Em crise, a escola tem apenas cinco professores para um total de 80 alunos.
A USP ampliou, nas últimas duas décadas, o número de estudantes matriculados sem garantir o mesmo ritmo na contratação de professores. Em 2002, a instituição tinha 0,07 educador para cada matriculado, em média. Em 2022, o número caiu para 0,05.
No intervalo, a quantidade de estudantes de graduação e pós-graduação passou de 70.563, em 2002, para 93.040, em 2022 (aumento de quase 32%). Já o número de docentes foi ampliado em apenas 5%, passando de 4.804 para 5.043.
BRUNO LUCCA / Folhapress