SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A USP tenta instalar grades para controle de acesso em sua moradia estudantil, o Crusp (Conjunto Residencial da Universidade de São Paulo), durante o período de férias acadêmicas. Estudantes, porém, impedem os trabalhos.
O projeto existe desde julho de 2024, quando uma licitação foi realizada. Em setembro, a reitoria anunciou ter desistido da obra após recorrentes protestos de moradores. Mas a instituição seguiu com os trabalhos, inclusive contratando uma empresa para cuidar da automação dos portões, em novembro.
Na última quinta-feira (2) pela manhã, homens tentaram instalar o controle de acesso nas entradas dos blocos do conjunto, quando moradores se uniram e conseguiram impedir os trabalhos. Agora, eles fazem vigília para garantir que as grades não sejam colocadas.
Em nota, a Prip (Pró-Reitoria de Inclusão e Pertencimento) responsável pelo Crusp diz que está investindo em melhorias na segurança e qualidade de vida no local e possui um contrato para instalar portões nos edifícios do conjunto, o qual deve ser cumprido.
“Garantir a segurança de 1.200 estudantes têm sido responsabilidades da Prip. A pró-reitoria lamenta que o movimento de poucos impeça a segurança de todos”, diz o texto. Segundo a universidade, 12 alunos barraram a instalação na quinta-feira.
A confusão sobre o controle de acesso no Crusp começou em julho no último ano. Os moradores acusam a USP de planejar a instalação para fazer uma varredura nos apartamentos, nos quais também vivem clandestinos. A instituição nega. Das cerca de 1.200 pessoas no Crusp, 300 estão irregulares, segundo a AmorCrusp (Associação de Moradores do Crusp).
Muitos matriculados foram acolhidos ali por outros estudantes por não terem sido contemplados com vaga nos editais da universidade. Também há casos de ex-alunos que seguem no apartamento após conclusão do curso e daqueles totalmente sem vínculo com a universidade que invadiram o espaço.
É defendida pela AmorCrusp a análise caso a caso, sem expulsão compulsória dos ocupantes irregulares.
MORADORES ACIONAM MINISTÉRIO PÚBLICO
Os estudantes que vivem no Crusp acionaram o Ministério Público de São Paulo para denunciar a instalação das grades. Eles miram os contratos firmados entre a USP e duas empresas responsáveis pela instalação e automação dos equipamentos.
As reclamações são baseadas no possível vício do edital e possuem respaldo na Procuraria Geral da universidade.
A USP, por sua vez, afirma que o processo de contratação foi feito conforme a legislação que rege as licitações públicas e prestará todos os esclarecimentos necessários caso seja acionada pela Promotoria.
Em setembro, a Prip notificou ao departamento financeiro da instituição que o valor inicial do pregão R$ 168 mil deveria ser corrigido com o acréscimo de R$ 31 mil. Isso porque o arquiteto responsável havia solicitado diretamente ao fornecedor alterações no escopo do projeto, por fora do processo licitatório, procedimento que é irregular.
Em parecer sobre o caso, divulgado em outubro, a Procuradoria Geral da USP disse que “a alteração do projeto licitado sem a regular tramitação do aditamento suprimiu das instâncias competentes a oportunidade de análise e de autorização da alteração” e que a Prip deveria providenciar a “apuração de responsabilidade do responsável técnico e adoção das providências necessárias para o ressarcimento dos danos causados à administração”.
Em novembro, a Prip contratou outra empresa, sem licitação, para realizar os serviços de automação das grades. A companhia contratada havia vencido e sido depois excluída da licitação de instalação dos equipamentos por não comprovar regularidade financeira. Mesmo assim, fechou contrato de R$ 57,3 mil com a USP.
Segundo os moradores, deveria ter sido realizado novo edital voltado ao projeto de automação, dando oportunidade à concorrência. Para embasar isso, eles citam a Lei de Licitações e Contratos Administrativos, que afirma ser dispensável processo licitatório apenas para contratações públicas que envolva valores inferiores a R$ 50 mil.
“O presente caso afronta os princípios constitucionais e legais que regem o uso de recursos públicos, especialmente no que tange à lisura das contas das empresas participantes e à regularidade do processo de contratação”, diz a representação encaminhada ao Ministério Público. “É preciso constatar que o projeto original presente na licitação estava viciado, visto constar falha no projeto”, segue.
Para os estudantes, a pressa da instituição em instalar as grades ainda durante as férias, quando a moradia estudantil está esvaziada, teria motivado as ditas irregularidades.
BRUNO LUCCA / Folhapress