SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Giovanni Cardoso viajou para a África do Sul na semana passada. O inverno no Brasil nem tinha acabado. Isso aconteceu apenas no último sábado (23). Deveria ter sido o período do ano mais difícil para o sócio-fundador da Mondial, principal fabricante de ventiladores do país. Não foi.
“Vendemos 42% a mais [em relação ao inverno de 2022]. Se pensarmos de setembro a março, nossa projeção é de crescimento de 62% em relação ao mesmo período do ano passado”, afirma.
A alegria não foi apenas dele. O mercado de ventiladores e ares-condicionados teve três meses para a história. Ou, como define Cardoso, tratou-se de um inverno muito aquecido para as indústrias do setor.
“Se olharmos o mês de agosto e principalmente os últimos 20 dias de setembro, as vendas foram 54% maiores. Para os condicionadores de ar Split, setembro foi ainda mais expressivo: houve aumento de 73% em relação ao mesmo mês do ano anterior”, diz Natacha Tcholakian, CEO da catarinense Ventisol.
De acordo com o Inmet (Instituto Nacional de Meteorologia), o inverno de 2023 foi o mais quente desde 1961. O São Paulo e partes de Minas Gerais tiveram até 70 dias de temperaturas acima dos 30º C. Mesmo índice de algumas regiões do Norte, Nordeste e Centro-Oeste.
O calor foi impulsionado pelo El Niño, fenômeno atmosférico e oceânico que aquece as águas do Oceano Pacífico e impulsiona intensas massas de ar quente e seco.
A média é que os termômetros no inverno fiquem em 23,6º C. Neste ano, chegaram a 29,5º C, quase cinco graus a mais que em 2022 (24,7º C).
A onda de calor trouxe discussões sobre aquecimento global e mudanças climáticas, mas foi comemorada pelas empresas do setor.
“Nos últimos três anos tivemos um verão atípico devido ao fenômeno La Niña, que trouxe muita chuva para todo o país. Foram realizadas vendas dentro da normalidade. Agora, além das altas temperaturas que tivemos durante o inverno, o verão tende a ser muito quente. Sentimos que a venda de modo geral nos últimos meses foi muito expressiva e obtivemos um crescimento de aproximadamente 25% comparado a 2022”, diz Fabio Lins, diretor comercial de portáteis da Britânia.
É percentual semelhante ao registrado pela Philco na venda de ares-condicionados.
“Nosso crescimento [neste inverno] foi superior a 30%. Nos anos anteriores, tivemos temperaturas mais equilibradas e a procura não foi tão intensa quanto agora. Sentimos, o qual sentimos que desde o início do ano a busca foi alta em todas as regiões do Brasil”, completa Pedro Cheliga, gerente de desenvolvimento da empresa.
A indústria busca fazer ajustes para o tamanho do mercado brasileiro do setor em 2023. São vendidos cerca de 18 milhões de ventiladores e 5,5 milhões de ares-condicionados por ano. Mas os executivos acreditam que, no verão, a partir do final de dezembro, a demanda pode ser maior do que a oferta.
“A gente cresceu 37% nesse período. Desde o começo do ano a gente se preparou para isso, com crescimento fechado para o terceiro trimestre. Historicamente, a gente observa que o sellout [a venda total do estoque] é concentrado de outubro a fevereiro, com picos de novembro a janeiro. A questão da mudança climática é importante, mas não é o único. Existe uma nova etiquetagem, um novo processo de teste do ar-condicionado que elevou o índice de eficiência energética e toda nossa linha atende isso”, afirma Thiago Dias, diretor da divisão de ar-condicionado da Samsung.
Há também datas que tradicionalmente incrementam as vendas, como a Black Friday, em 24 de novembro.
“A LG está otimista para os resultados deste ano, especialmente no segundo semestre, que traz datas especiais para o varejo, como Black Friday e Natal. São efemérides que antecedem a estação mais quente do ano. É o momento ideal para os consumidores adquirirem aparelhos de ar-condicionado”,opina Rodrigo Fiani, vice-presidente de vendas da IT, BSB e ar-condicionado da LG do Brasil.
A companhia registrou incremento nas vendas em 98% entre julho e agosto deste ano, comparado a junho. Em relação ao inverno de 2022, o crescimento foi de 26%.
Existe a preocupação de empresários com os pedidos de redes do varejo, que teriam reagido tarde ao aumento da procura e podem fazer o mesmo para os meses de final de ano. Se não acontecerem as encomendas para a indústria, pode haver um buraco no suprimento de ventiladores e ares-condicionados.
“A gente presta consultoria para o varejo e avisa [sobre as projeções de produção]. Mas eles sempre deixam sempre para a última hora. Nós teremos de produzir muito. No verão, o consumo será maior que a produção”, analisa Giovanni Cardoso, da Mondial.
Natacha Tcholakian reconhece que se o calor atual se mantiver até o final do ano, a produção da Ventisol terá de ser reforçada. A Britânia está ampliando a linha de produção de ventiladores em sua fábrica em Joinville, Santa Catarina. A Samsung planejou entre março e abril a produção para o restante do ano, mirando um crescimento de 20%.
Todas as marcas do setor contratam serviços de meteorologia para ter uma estimativa de temperatura dos meses futuros e adequar a produção. Cardoso diz já pensar em como vai ser 2024.
“A procura está acima da média e a previsão é de que se mantenha assim”, comemora Fabio Lins, diretor da Britânia.
ALEX SABINO / Folhapress