Viabilidade fetal é tese que guia favoráveis ao PL Antiaborto por Estupro

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Aborto não é assunto pacificado no Brasil. Enquanto 24% da população defende a ampliação do acesso ao procedimento, 38% querem a proibição completa, inclusive dos casos já autorizados por lei, segundo o Datafolha.

O levantamento, feito em nos dias 17, 18 e 19 de junho, mostra também que 1 em cada 3 brasileiros é favorável ao PL Antiaborto por Estupro, que iguala a pena para quem fizer procedimento após a 22ª semana de gestação decorrente de estupro à reclusão prevista em casos de homicídio simples.

Aqueles que defendem a proposição se dizem favoráveis à vida, afirmam que a mulher não tem o direito de tirar a vida de um bebê e se guiam pela tese da viabilidade fetal, que indica quando um feto poderia sobreviver fora do útero.

“Sou a favor da vida”, diz Laura Ferreira Cairo, 35, que classifica o aborto como um “assassinato”. O motivo principal para que apoie a proposição é sua filha, que foi considerada “incompatível com a vida” durante a gestação. Apesar de médicos orientarem que ela tentasse o aborto legal na Justiça, uma vez que a criança teria pouca chance de sobrevivência, Cairo decidiu seguir com a gravidez.

No Brasil, o aborto só é permitido em caso de risco à vida da mãe, anencefalia fetal e estupro.

“Fui orientada pelos médicos a abortar, pois, segundo eles e a literatura, não era possível que ela sobrevivesse. Se sobrevivesse, seria em condições gravíssimas.”

O diagnóstico da menina foi de holoprosencefalia alobar, condição grave em que o cérebro do bebê não se desenvolve adequadamente e há anomalias faciais. “Se eu não tivesse me permitido viver isso, ela não estaria aqui hoje para contar sua história”, diz. “A medicina e a literatura não podem dar sentença para nenhum indivíduo.”

Nos casos de aborto de gestações ocorridas devido a estupro, ela defende que o procedimento não possa ser feito mesmo antes das 22 semanas. “Existe uma desinformação da mídia para tentar manipular a opinião das pessoas, e a grande massa não lê, não se informa.”

Cairo é católica e se diz conservadora. Segundo o Datafolha, os católicos representam 28% dos que são a favor da proposição. Entre os evangélicos, a aprovação é maior, de 37%.

A bióloga Denise Moreira, 35, também se define como católica e conservadora. Ela afirma que o “aborto é um assassinato cruel”, pois um “bebê” de 22 semanas já poderia viver fora do útero. “Se a mãe não quer ou não tem condições de ter este bebê, que o retire com vida. O bebê vai precisar sair via de parto de qualquer forma, que seja com vida”, diz ela.

O agente de trânsito Marcos Demétrio Cervera, 55, é contra a interrupção voluntária da gravidez, pois, para ele, “não temos o direito de tirar a vida de ninguém”. Ele também diz ser conservador.

“Não sou a favor de aborto seja por qualquer hipótese”, afirma. “Se após 22 semanas a pessoa fizer o aborto, ela matou um ser humano e tem que ser responsabilizada.”

O guarda civil metropolitano Ronaldo Barbosa, 61, compartilha da mesma opinião. “Eu não sou a favor do aborto porque nada justifica a morte de um ser humano que não teve a chance de decidir por ele mesmo”, diz. “Foi esse motivo que me levou a ser a favor da PL Antiaborto.”

Profissionais de saúde pública que atuam em serviços de aborto legal ouvidos pela Folha afirmam que o projeto afetaria, principalmente, crianças e adolescentes, uma vez que meninas nesta faixa etária demoram mais para detectar a gravidez decorrente de estupro. Isso indica, segundo especialistas em direito, que a aprovação do PL faria com que menores de idade fossem passíveis de privação de liberdade em caso de aborto após 22 semanas.

Para Barbosa, a vulnerabilidade é um argumento para que meninas não sejam penalizadas. “Se é vulnerável, ela não consegue decidir por ela mesma. Então ela não deve ser responsabilizada”, diz.

Segundo o Datafolha, entre os homens entrevistados 34% são favoráveis à proposição, enquanto as mulheres que apoiam representam 25% das participantes.

Dentre os que não concordam com a interrupção voluntária da gravidez, há também aqueles que não estão de acordo com o projeto. O professor de geografia Wanderley José, 58, é um deles. Ele se diz contra o aborto, mas favorável à legislação atual.

“Sou contra esse novo texto na parte em que limita o tempo para se realizar o aborto, principalmente no caso de violência sexual”, afirma.

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RAÍSSA BASÍLIO E VITÓRIA MACEDO / Folhapress

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