SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Em meio à Mata Atlântica, Dira Paes resolveu alçar novos voos. A atriz passou um tempo refletindo sobre seus desejos e valores durante a pandemia. Ela, então, se propôs a dirigir o seu primeiro filme, “Pasárgada”, que chega aos cinemas nesta quinta-feira, 26. Além disso, ela também é a protagonista e produtora.
“Começou com esse impulso, mas depois eu vi que era uma necessidade de lidar como se a finitude estivesse perto e você precisasse de projetos”, afirma. Dira queria ultrapassar fronteiras e realizar algo que ainda não tinha feito ao longo de sua consolidada carreira. “Foi uma vontade de me virar do avesso”.
O filme acompanha Irene, uma mulher solitária na casa dos 50 anos, que enfrenta questões que envolvem a maternidade e a família em um processo de autoconhecimento. O enredo é desenvolvido a partir de sua profissão como ornitóloga, aquela que estuda e observa aves, tendo como trilha sonora o canto dos pássaros e de pano de fundo as montanhas e cachoeiras do Arraial do Sana, em Macaé, Rio de Janeiro.
Foi na mesma fazendo usada para a locação do filme que Dira, assim como a personagem, se refugiou durante a pandemia. Ela afirma que criou o seu universo particular, assim como o poeta Manuel Bandeira no poema “Vou-me embora pra Pasárgada”, que inspirou o nome do filme. Ela desejava esse paraíso que o eu-lírico buscava.
Lá, Dira foi observar pássaros. A área, que está em estados do sul e sudeste, abriga uma das maiores variedades de espécies de pássaros. Ela começou a pesquisar sobre a profissão da personagem e a imaginar a trama. O que chamou sua atenção foi o fato de o comércio ilegal de animais silvestres no Brasil ser o terceiro maior do mundo, segundo a Proteção Animal Mundial. “Parecia que eu estava sendo convocada”, diz. “Isso é uma trama que a gente tem que entender.”
“Pasárgada” é recheado de momentos de apreciação da natureza da personagem, que é guiada pelo mateiro Manuel, interpretado por Humberto Carrão. O filme, que se destaca pelo aspecto sensorial, estreou no Festival de Gramado deste ano e ganhou o prêmio de Melhor Desenho de Som.
Essa é o primeiro cargo de Dira na direção, que reconhece que sempre houve pioneiras, mas há uma subrepresentação feminina. Uma pesquisa do Centro de Estudos de Mulher na Televisão e no Cinema da Universidade Estadual de San Diego mostrou que em 2022 mulheres era 22% dos diretores, roteiristas, produtores e editores dos 250 filmes de maior bilheteria daquele ano.
“Nós estamos corrigindo esse déficit porque as mulheres sempre estiveram presentes, mas dificilmente chegavam aos cargos de direção, dificilmente eram chefes de departamento, dificilmente assumem o papel de donas do projeto”, afirma.
Dira quer que a equidade seja fomentada e essa é uma das bandeiras que levanta nessas eleições. “É o meu sonho que as mulheres votem em mulheres”, diz a cineasta. Mas, reconhece que às vezes não é possível por questões que ultrapassam a de gênero. “É importante que a gente busque, na legalidade que a gente tem direito numa democracia, de ocupar os cargos, começando pelo próprio Congresso, pelo Senado, pelas produções cinematográficas em todas as instâncias da sociedade”.
Sobre a nova fase como diretora, Dira não consegue negar a afinidade. “Eu me sinto em casa”, diz. Afinal, são 40 anos de carreira com 41 longas-metragens. “Eu sou do cinema, sempre fui”.
Além da carreira consolidada no cinema, Dira também se tornou um rosto popular nas novelas da Globo. Ao todo foram 16, com destaque para “Caminho das índias” e “Salve Jorge”. Diferente de outros atores de sua geração, como Gloria Pires, Antonio Fagundes, e sua parceira de elenco no filme “Pasárgada” Cássia Kiss, Dira ainda tem contrato de exclusividade com a emissora e se diz muito feliz lá.
Para ela, a debandada dos artistas do canal tradicional é algo natural e uma forma deles se reorganizarem. “O mercado se movimentou muito durante e pós-pandemia”, diz. “A gente entendeu que nós agora somos nossos próprios editores da nossa relação profissional”. Diante de novidades como as plataformas de streaming, ela afirma que os atores estão descobrindo os limites e os direitos em relação a elas.
Dira agora vive um momento de realizações. Além da estreia de “Pasárgada”, ela também contracenou no filme “Manas”, de Marianna Brennand, que venceu prêmio no Festival de Veneza. “Nós somos um manancial de talentos, como o Brasil é uma fonte inspiradora, muito grande para o mundo. E nós temos que ter muito orgulho disso”, diz. “Temos que entender que a gente pode ser muito mais forte no sentido artístico e de mercado também.
Nesse sentido, Dira ressalta a importância da cota de tela para filmes brasileiros nos cinemas até 2033, para não “americanizar a vida”. “Não adianta a gente fazer um filme se a gente não tem onde exibir”, diz.
PASÁRGADA
– Onde Nos cinemas
– Classificação 14 anos
– Elenco Dira Paes, Humberto Carrão, Cássia Kiss
– Produção Brasil, 2024
– Direção Dira Paes
VITÓRIA MACEDO / Folhapress