JOANESBURGO, ÁFRICA DO SUL (FOLHAPRESS) – A eleição que definirá o comando da África do Sul pelos próximos cinco anos começou nesta quarta-feira (29) com longas filas, falta de energia e muito tumulto em Joanesburgo, centro econômico do país.
Na maior seção da cidade, em Joubert Park, região central, houve problemas com o sistema que escaneia as identidades dos eleitores. Isso levou à verificação manual dos nomes no registro eleitoral, em listas de papel que, muitas vezes, estavam desatualizadas, inclusive com nomes de mortos.
A situação gerou longas filas, que chegavam a duas horas. O trâmite para votar contribuía para a demora, uma vez que os eleitores, após terem seus nomes verificados na lista, tinham um dedo marcado com tinta indelével, para evitar que votassem mais de uma vez.
Depois, recebiam três enormes cédulas, para listas nacionais, locais e regionais uma delas, do tamanho de um papel A3, tem os nomes de 52 partidos. Feita a escolha, é preciso dobrar os papéis e colocá-los em três urnas separadas, o que alguns votantes, especialmente os mais velhos, faziam com alguma dificuldade.
Com as reclamações se avolumando, fiscais de partidos se reuniram e exigiram que a comissão eleitoral paralisasse a votação até que o sistema eletrônico fosse restabelecido.
“Muitas vezes os nomes das pessoas não aparecem na lista. Decidimos que estamos parando o processo todo até que tudo seja feito”, dizia, exaltado, Aviwe Mdaniso, fiscal do partido Combatentes da Liberdade Econômica. “Acompanho eleições desde 2019, nunca passamos por isso antes. A comissão eleitoral muda de tempos em tempos, e eu acho que esta equipe é mal treinada e mal equipada.”
O resultado da paralisação total da votação foi mais caos e bate-boca. Alguns eleitores mais revoltados precisaram ser contidos por policiais.
“Nada acontece na África do Sul se a gente não usar violência. Não queremos fazer isso, mas talvez seja a única maneira'”, afirmou Sabelo Mungwe, eleitor do partido MK.
Sem reação, fiscais eleitorais não tinham resposta para dar aos eleitores, apenas pediam paciência até que o sistema fosse consertado. “Ninguém sabe de nada, ficam lá sentados, só olhando nos seus celulares”, reclamava Veli Mungwe.
Apesar dos problemas, as pessoas na fila prometiam não ir embora até conseguirem votar. “Eu vim aqui porque quero mudança nesse país. Estou desempregada há muito tempo”, disse Kagiso Lpokana, 40, que esperava havia mais de 1 hora e pretendia votar num partido de oposição ao Congresso Nacional Africano (CNA).
Em outra parte da cidade, no rico bairro de Houghton, local de mansões, consulados e clubes de golfe, a votação ocorria de maneira bem mais amena numa escola de elite, mas não sem problemas. Um funcionário orientava os eleitores a formarem filas separadas pelas iniciais dos sobrenomes, e havia uma exclusiva para maiores de 60 anos.
Faltou energia elétrica no local, algo constante no país, e assim a checagem dos nomes na lista de votação também era feita manualmente. Ainda assim, a votação ocorria de forma rápida, demorando 20 minutos no máximo.
Alguns eleitores saíram sem conseguir exercer seu direito, no entanto. Uma mulher, resignada, disse à reportagem que foi informada de que seu nome não estava registrado e, portanto, ela não poderia votar.
A maioria se mostrava satisfeita e pronta para aproveitar o feriado de sol. Alguns paravam numa barraca para tomar café ou chá.
Na favela de Thembisa, ao norte de Joanesburgo, houve longas filas pela manhã, também em razão de problemas com o sistema informatizado de identificação de eleitores.
“A votação começou um pouco complicada, por causa da queda na rede. O sistema vai e volta, e a fila com isso aumenta ou diminui”, disse Johanes Leshaba, fiscal do partido CNA.
Assim como representantes de outros partidos, ele direcionou sua frustração à comissão eleitoral, um órgão independente. “A comissão disse que estava pronta, mas não estava. Isso precisa ser dito à nação”.
Moradora da comunidade, Ntombi Mthetwa disse que não teve problemas para votar. “Mas minha irmã, que se mudou para Pretória [a 40 km de distância] e transferiu o título, teve que vir votar aqui, pois não achavam seu registro lá. Isso desencoraja muitas pessoas”, afirmou.
No meio da tarde, quando a Folha visitou o local, a situação estava mais calma. A fila na seção eleitoral, montada numa pequena igreja ortodoxa etíope, era pequena, e eleitores aguardavam sentados em cadeiras de plástico batendo papo até serem chamados.
A votação estava prevista para terminar às 21h locais (16h no Brasil). Partido que governa o país desde o fim do apartheid, em 1994, o CNA pode ter uma derrota histórica e pela primeira vez perder a maioria no Congresso.
FÁBIO ZANINI / Folhapress