BRASÍLIA, DF, E SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O STF (Supremo Tribunal Federal) voltou a julgar, nesta quarta-feira (12), a ação que trata da revisão do FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço).
O primeiro a se manifestar foi o ministro Cristiano Zanin. No ano passado, Zanin pediu vista (mais tempo para análise) da ação, e agora apresentou o seu voto de forma contrária à revisão.
“Não vislumbro, com o devido respeito às compreensões no sentido contrário, violação a preceito constitucional da propriedade ou da moralidade administrativa no critério da correção monetária e da capitalização de juros”, disse Zanin, ao votar.
Ele disse que considera a ação e improcedente “seja em razão da natureza peculiar e complexa do direito ao FGTS, que não se confunde, na minha compreensão, com mera aplicação financeira, seja em razão da autocontenção devida pelo Poder Judiciário em questões que são eminentemente da política econômica e monetária”.
Afirmou, ainda, que o Poder Legislativo não tem sido omisso em tratar do tema. O ministro Alexandre de Moraes acompanhou o entendimento de Zanin.
Em seguida, votou o ministro Flávio Dino, em consonância com uma proposta apresentada pelo governo no último mês.
Em manifestações recentes, o advogado-geral da União, Jorge Messias, disse que o governo se dispõe a manter a correção atual do Fundo de Garantia e incluir a distribuição dos lucros de forma obrigatória no cálculo, como forma de garantir atualização de, no mínimo, a inflação medida pelo IPCA, índice oficial do país.
Messias afirma que esse valor foi acordado com as centrais sindicais.
Após o voto de Dino, quem se manifesta é o ministro Alexandre de Moraes. Ainda faltam votar os ministros Luiz Fux, Cármen Lúcia, Dias Toffoli, Gilmar Mendes e Flávio Dino.
Há quatro votos pela mudança na remuneração, de Barroso, de Kassio Nunes Marques, de André Mendonça e de Edson Fachin.
Nesta quarta, Barroso disse que manteria seu voto, mas propôs adiar a correção para 2026, devido à necessidade de financiar a recuperação do Rio Grande do Sul.
Já Fachin afirmou que “não parece ser possível cometer essa grave injustiça [falta de revisão] com os saldos que estão na conta dos trabalhadores brasileiros”.
O pedido na ADI 5.090 é para que os ministros afastem a TR, substituindo-a por um índice de inflação, que pode ser o INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor) ou IPCA-E (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo – Especial). O FGTS rende, atualmente, 3% ao ano mais a taxa referencial.
Há algumas propostas sendo analisadas, como a da própria ação, a do ministro Luís Roberto Barroso, presidente da corte, que indica correção do Fundo de Garantia pela poupança hoje em 6,17% ao ano mais TR, e a do governo, de pagar ao menos a inflação medida pelo IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo).
Existe, ainda, a possibilidade de que a ação seja rejeitada e que não ocorra mudanças na correção.
Ao votar no ano passado, Barroso disse que não há direito constitucional à correção monetária para repor a inflação, mas o modelo atual de remuneração do FGTS “não é razoável”.
Desde 2017, o FGTS paga o lucro que o fundo obtém no ano, aumentando os ganhos dos trabalhadores. Com a distribuição desses resultados, houve ganhos acima da inflação. No ano passado, a Caixa distribuiu 99% do lucro, creditando R$ 12,719 bilhões na conta dos trabalhadores.
A AGU argumenta que a proposta do governo não trará prejuízo aos trabalhadores, porque defende que a inflação seja o mínimo que se pague como correção. Cálculos do órgão apresentados no processo são de que, se a revisão for concedida da forma como foi solicitada, o impacto nas contas da União seria R$ 661 bilhões, e o Ministério da Fazenda calcula desembolsar R$ 8,6 bilhões a mais com o FGTS.
O julgamento começou em 2023 e foi paralisado após pedido de vista do ministro Cristiano Zanin, logo que assumiu cadeira na corte.
O QUE ESTÁ EM JOGO?
A correção do FGTS é uma ação bilionária, com impacto previsto em R$ 661 bilhões, segundo documento da AGU (Advocacia-Geral da União), que representa o governo na Justiça, apresentado no dia 18 de abril de 2023, às vésperas do início do julgamento no STF.
Para os trabalhadores, a perda seria de R$ 756 bilhões desde 1999, quando a TR passou a ser aplicada, de acordo com cálculos do Instituto Fundo de Garantia do Trabalhador.
A ação inicial apresentada ao STF em 2014 pelo partido Solidariedade e pela Força Sindical mostrou perdas de 88,3% entre janeiro de 1999 e 2013, data do estudo encomendado pelas entidades para calcular as perdas da categoria.
QUEM TEM DIREITO CASO O STF JULGUE FAVORÁVEL A AÇÃO?
Uma mudança na correção do FGTS, mesmo que futura, vai impactar 217 milhões de contas vinculadas ao Fundo de Garantia, segundo os últimos dados da Caixa Econômica Federal. O número de trabalhadores envolvidos é menor, porque cada profissional pode ter mais de uma conta.
COMO VOTARAM OS MINISTROS
Pela remuneração da poupança:
– Luís Roberto Barroso
– Kassio Nunes Marques
– André Mendonça
– Edson Fachin
Contra a revisão do FGTS:
– Cristiano Zanin
– Alexandre de Moraes
Pela proposta do governo:
– Flávio Dino
Se for aprovada a remuneração da poupança como correção do fundo, o trabalhador teria duas formas de ganho, conforme a Selic, que é a taxa básica de juros da economia. A regra mudou em 2012 e diz que para depósitos realizados até 3 de maio de 2012, a atualização é fixa, de 0,5% ao mês mais TR, o que dá 6,17% ao ano mais TR.
ENTENDA O FGTS
O FGTS funciona como uma poupança para o trabalhador. O fundo foi criado em 1966, com o fim da estabilidade no emprego, e passou a valer a partir de 1967. Todo mês o empregador deposita 8% sobre o salário do funcionário em uma conta aberta para aquele emprego.
Há ainda a multa de 40% sobre o FGTS caso o trabalhador seja demitido sem justa causa. Desde a reforma trabalhista de 2017, há também a possibilidade de sacar 20% da multa após acordo com o empregador na demissão.
O fundo, no entanto, é utilizado em políticas públicas de habitação, saneamento básico e infraestrutura urbana, conforme prevê a legislação. O saque do FGTS é autorizado apenas em 16 situações previstas em lei. Fora isso, o trabalhador não tem acesso ao dinheiro.
JOSÉ MARQUES E CRISTIANE GERCINA / Folhapress