Apoiadores de ‘Bolsonaro paraguaio’ acusam sem provas fraude em eleição

ASSUNÇÃO, PARAGUAI (FOLHAPRESS) – Roncos de motor, fogos de artifício e buzinaços ecoam a alguns metros do Tribunal Superior de Justiça Eleitoral do Paraguai nesta segunda (1º), menos de 24 horas depois da votação que elegeu à Presidência o conservador Santiago Peña, do partido Colorado.

Assim como nos protestos de 2022 no Brasil, apoiadores do candidato Paraguayo Cubas, comparado a Jair Bolsonaro pelo extremismo nos discursos, alegam fraude eleitoral sem provas, com base em vídeos nas redes sociais que mostram supostas irregularidades. À noite, havia 30 pontos com fechamentos de ruas pelo país.

Apesar de diversos relatos de indução de voto que circularam neste domingo (30) durante o pleito, considerados comuns no país, a Justiça Eleitoral, o Ministério Público e comissões internacionais que acompanharam a eleição reconheceram o resultado no mesmo dia.

Já o opositor Efraín Alegre, que havia admitido a derrota, pediu nesta segunda-feira a recontagem dos votos. “Diante das numerosas denúncias apresentadas com relação às eleições, exigimos ao TSJE [Tribunal Eleitoral] que realize de imediato o cômputo manual de 10% das mesas escolhidas aleatoriamente em cada colégio eleitoral de todo o país”, escreveu nas redes sociais.

O extremista Paraguayo Cubas ficou em terceiro lugar, mas surpreendeu ao conseguir uma votação expressiva tanto em sua candidatura à Presidência quanto no Legislativo. Seu partido Cruzada Nacional, que concorreu pela primeira vez, elegeu 5 dos 45 senadores e 5 dos 80 deputados.

O protesto começou no início da tarde em outra rua de Assunção, com cerca de 20 pessoas que levavam bandeiras do Paraguai e cartazes em folhas sulfite. “Tíbios, tíbios”, repetiam em coro, uma expressão de Cubas que quer dizer “mornos” ou “passivos”, no sentido de criticar os que não vão às ruas para protestar.

Ao longo do dia, a informação foi se espalhando, e mais gente foi se juntando, inclusive com o incentivo de Cubas. “Efraín se calou. Recebeu para se calar. Por isso não há hoje um único companheiro reclamando disso, porque são cúmplices”, discursou mais tarde.

Por volta das 20h (21h em Brasília), o grupo do centro já somava centenas de pessoas e ocupava uma esquina, com o fechamento de ruas no entorno e uma grade colocada na direção do tribunal. No fim da noite, o ato terminou em confronto entre manifestantes, que atiravam pedras, e policiais, que lançavam bombas de efeito moral.

O protesto foi composto principalmente por jovens, eleitorado considerado “farto” da política tradicional, formada por dois partidos centenários: os liberais e os colorados. Esse último domina o país há quase 70 anos, com exceção do governo do ex-bispo de esquerda Fernando Lugo (2008-2013). No Paraguai, a maioria das famílias é dividida entre uma ou outra sigla.

Um desses jovens era Marcos Fariña, 29, estudante de fisioterapia. “Esses dois partidos negociam tudo entre eles, por isso Efraín não reclama. Até o tribunal é vendido”, afirma ele, que diz ter sido mesário e visto a lista de sua mesa com um número diferente do mostrado pela Justiça Eleitoral.

Essa foi a principal narrativa no protesto, além da suposta compra de votos e dos chamados votos acompanhados, quando uma pessoa entra na urna com outra para supostamente ajudá-la (o que só é permitido em caso de eleitores com deficiência), que teriam induzido votos num determinado candidato.

É a primeira vez que o país utiliza máquinas nas eleições gerais, que já haviam sido usadas nas primárias e em eleições municipais. Não são urnas eletrônicas, já que não “guardam” o resultado e não estão ligadas a uma rede, mas imprimem um boletim de voto.

“Achamos que o Payo ganhou as eleições, mas o Colorado fez uma trama com a Justiça Eleitoral. Tem vídeos e fotos de documentos, não é boato”, diz o técnico de refrigeração Herme Gimenez, 53, um dos únicos manifestantes mais velhos. “O Colorado está aí há mais de 70 anos, a dívida externa sobe, na pandemia roubaram asquerosamente.”

“Foi fraude”, grita tentando superar as vuvuzelas o barbeiro Ugo Verga, 28, enquanto bate numa panela com um facão. “Isso é para protestar, nada mais”, diz ele, apontando para o objeto. Mas não são apenas os apoiadores de Cubas que se dizem “fartos”.

A estudante de direito Lujan Mendez, 21, votou no liberal Efraín Alegre. “Viemos contra a fraude. Tem muitos que compram cédulas, votos, e também entram com as pessoas para votar”, diz, ao lado de amigas de 16 e 18 anos.

Apesar da semelhança com os protestos no Brasil, como as cores da bandeira do país, as motocicletas e o discurso de fraude, poucos sabem quem é Jair Bolsonaro. Alguns só ouviram de nome que ele é ex-presidente, mas não acompanham a política brasileira, ainda que muitos paraguaios falem e ouçam músicas em português.

Outra diferença para os protestos golpistas em frente aos quartéis no Brasil é a distância dos policiais. Não há sinais de envolvimento ou concordância dos agentes, que apenas observam de longe. Também não há resistência aos profissionais da imprensa, que no Brasil não podiam se identificar ao público por riscos à sua segurança.

JÚLIA BARBON / Folhapress

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