SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Taxistas da cidade de São Paulo tem reclamado das cláusulas de um contrato que deve ser assinado obrigatoriamente por quem quiser manter seu alvará e continuar trabalhando nessa categoria na capital paulista.
O contrato em questão foi elaborado pela empresa Taksim, que venceu uma licitação no ano passado para administrar o aplicativo municipal SPTaxi.
Para seguir com a licença, os carros devem instalar um equipamento eletrônico chamado desacoplador, que monitora os taxímetros e se comunica com aplicativos de celular.
Entre as reclamações dos taxistas está a cobrança de uma multa de R$ 500 mil em caso de violação do equipamento, além da preocupação com a segurança e o uso dos dados que serão coletados. A empresa diz que dialoga com a prefeitura para reduzir o valor da multa.
Criado em 2018, na gestão de João Doria (então no PSDB, hoje sem partido), o SPTaxi sofreu com a baixa adesão de passageiros e ficou fora do ar de 2021 até o início de 2023. Em março deste ano, a prefeitura publicou um decreto que torna obrigatória a instalação do aplicativo para todos os taxistas.
O prazo para regularização vence no dia 16 de maio –depois disso, quem não estiver regularizado terá o alvará bloqueado.
O cadastro no aplicativo de celular já agenda automaticamente uma data para a instalação do aparelho eletrônico, que é feita gratuitamente. Já há mais de 31 mil taxistas cadastrados, segundo a Taksim.
O contrato prevê que o taxista deve ressarcir a empresa em caso de roubo ou furto do equipamento. O dano ou má conservação do desacoplador pode gerar uma multa de R$ 2.000. As condições de risco ao equipamento são de inteira responsabilidade do motorista, inclusive em casos de força maior (como uma enchente, por exemplo).
As dívidas geradas por força do contrato podem ser repassadas a familiares do motoristas. Além disso, uma das cláusulas exige que o contrato entre a empresa e os taxistas seja mantido em sigilo.
A multa de R$ 500 mil aparece no contrato como uma proteção à propriedade intelectual e industrial da empresa, e pode ser cobrada em caso de “abertura do equipamento, desconstrução, engenharia reversa, análise ou mesmo empreender qualquer outra atividade ou dar uso diverso ao equipamento, que não as hipóteses previstas” em contrato.
Questionada, a Prefeitura de São Paulo diz que essa multa só deve ser aplicada quando houver má-fé na violação do equipamento.
A preocupação dos motoristas é que os veículos não ficam sob sua guarda o tempo todo –são levados ao mecânico com frequência, por exemplo, e há casos de carros que são divididos com outros taxistas.
Outro receio da categoria é que as informações coletadas pelo equipamento tornem possível, no futuro, a cobrança de ISS (Imposto Sobre Serviço) das corridas de táxi, hoje isentas. Essa possibilidade é citada em uma apresentação feita pela Taksim no ano passado.
“Estou carregando um equipamento no meu carro que não quero carregar, e ainda por cima estou sujeito a pagar uma multa de R$ 500 mil?”, questiona o taxista Éder Caetano, 40, diretor da Frennataxi (Frente Nacional do Táxi). “A gente se preocupa com as informações que esse aparelho vai coletar, como quantas corridas o taxista fez, quantas horas trabalhou, porque estamos ouvindo que ele pode virar um sistema semelhante a um cartão de ponto. E o princípio da nossa atividade é autônomo, nós que decidimos qual é nossa jornada.”
Em uma audiência pública na Câmara Municipal há pouco mais de um mês, um representante da Frennataxi chegou a sugerir um projeto de lei que limite a operação do desacoplador, garantindo que o aparelho apenas confira o valor no taxímetro para evitar fraudes e transmita os dados para o aplicativo.
Há uma preocupação com o que a empresa fará com os outros dados coletados, e com a possibilidade de que a própria Taksim seja alvo de um vazamento de dados.
O Simtetaxi (Sindicato dos Motoristas e Trabalhadores nas Empresas de Táxi) informou durante a audiência que pediu a rescisão do contrato entre a Taksim e a prefeitura.
A sugestão do projeto de lei tem pouca chance de ganhar adesão na Câmara, uma vez que a maior parte dos vereadores não se opõe ao aplicativo. Próximo da categoria, o vereador Adilson Amadeu (União Brasil) diz que sua única crítica é contra a multa de R$ 500 mil, e que trabalha para diminuir o valor. Ele é favorável, no entanto, que o aparelho sirva para monitorar a atividade dos taxistas.
Ele relata que há veículos que usam placa vermelha, destinada a táxis, apenas para se beneficiar do trânsito liberado nos corredores de ônibus, sem exercer a profissão. “Pelo aparelho, a gente pode começar a pegar dados dessa maneira”, diz. “Aquele taxista que realmente trabalha e não faz nada diferente do que precisa fazer a não ser trabalhar, bem arrumado e com carro bonito, não precisa ter preocupação nenhuma.”
OUTRO LADO
Questionada sobre o motivo para o SPTaxi ter se tornado obrigatório, a prefeitura diz que os alvarás de veículos e o cadastro profissional (Condutax) agora devem ser emitidos exclusivamente de forma digital, e que o aplicativo foi a plataforma escolhida para fazer esse trâmite.
A gestão de Ricardo Nunes (MDB) diz, também, que os taxistas não são obrigados a usar o SPTaxi para intermediar as corridas, apenas a instalação é obrigatória.
As corridas intermediadas pelo app terão uma cobrança de 10,97% do valor pago pelo passageiro destinada à empresa.
“Apesar dessa obrigatoriedade, os taxistas têm total liberdade para trabalhar e fazer corridas normalmente sem utilização do aplicativo”, disse a prefeitura, em nota.
A Secretaria Municipal de Fazenda diz que não há qualquer estudo para alterar a isenção da cobrança de ISS para os taxistas.
A Taksim diz que a redução do valor da multa pela violação do desacoplador, de R$ 500 mil para R$ 20 mil, está sendo acertada com a prefeitura nesta sexta-feira (5). “Ela se refere apenas à preservação dos direitos de propriedade industrial e intelectual, para aqueles que danificarem o desacoplador de forma intencional”, diz a empresa.
TULIO KRUSE / Folhapress