SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – As áreas da cidade de São Paulo onde não há limite de altura para prédios, ao redor dos eixos de transporte, podem aumentar em até 160% se a revisão do Plano Diretor da cidade for aprovada na versão atual.
O cálculo, feito pelo laboratório Arq.Futuro do Insper, mostra que um território equivalente a 51 parques do Ibirapuera -ou 81,6 km², quase 9% de toda a área urbana do município- poderia ter regras alteradas a qualquer momento para permitir mais verticalização.
Após ter sido aprovada em primeiro turno na Câmara Municipal, a votação definitiva da lei urbanística mais importante da cidade, que orienta seu crescimento, está prevista para a próxima quarta-feira (21).
Até agora, a prefeitura e os vereadores não apresentaram estudos que mostrem os impactos da proposta. As estimativas do laboratório mostram que essa nova regra pode levar a uma dispersão de novos empreendimentos na cidade, alcançando terrenos mais periféricos.
Hoje, nas quadras ao redor de estações de metrô e corredores de ônibus, por exemplo, há uma série de regras que permitem construir prédios mais altos sem pagar taxas. O projeto em discussão propõe que se permita ampliar a área que recebe esses incentivos.
Assim, a permissão para construir espigões chegaria a áreas mais distantes das estações e corredores. Isso aumentaria o tempo de caminhada entre as bordas dessas zonas mais adensadas e o transporte público.
O alargamento das zonas com incentivo para prédios mais altos não será automático. O total de 81,6 km² é o potencial de crescimento dessas áreas.
São terrenos onde hoje há limites mais rígidos para a construção de edifícios, e se abriria a possibilidade de transformá-las em locais sem limite de altura. Hoje há 51,5 km² com essas características, e se 100% do potencial criado fosse aproveitado, esse número cresceria para mais de 133 km² sem limite de altura para prédios (14,5% da área urbana).
A lei prevê que isso seja discutido, quadra a quadra, na tramitação da Lei de Zoneamento -que deve ser revisada logo após aprovação da mudança no Plano Diretor, pois a prefeitura já apresentou uma minuta do projeto.
Um detalhe que preocupa os pesquisadores, porém, é que o projeto propõe que a mudança dessas áreas possa ser feita a qualquer momento. Ou seja, uma proposta da prefeitura ou de qualquer vereador poderia ser aprovada com pouca ou nenhuma discussão com a população afetada.
Outra novidade criticada por urbanistas é que a ampliação dessas zonas seria feita por lotes, e não por quadras. Ou seja, apenas alguns terrenos de um quarteirão poderiam ganhar o direito de construir prédios mais altos, e outros não.
A ampliação dessas áreas é o ponto da revisão mais debatido por acadêmicos e pela população nas últimas três semanas, desde que a proposta foi apresentada pelo vereador Rodrigo Goulart (PSD), relator do projeto na Câmara Municipal.
Para o time de pesquisadores do Insper, essa mudança não é necessariamente problemática. Eles reclamam mais de outros pontos, como uma brecha que permite aumentar em 50% o limite de altura dos prédios nos miolos de bairro de toda a cidade, uma regra que libera mais vagas de garagem e uma permissão para se construir apartamentos maiores nos eixos de transporte público.
“Aumentar as áreas que podem ser verticalizadas, desde que elas sejam próximas do transporte público, é o objetivo do Plano [Diretor] e a gente não está mudando de rota [com a revisão]”, diz o professor Adriano Borges Costa, que coordenou o estudo. “A sociedade pode discutir se tem que ser mais ou menos, e para isso que fizemos essas simulações.”
Já é consenso entre especialistas e políticos que a cidade precisa acelerar a construção de moradia para reduzir o déficit habitacional. Estudos já mostraram que a política dos eixos de transporte teve sucesso para atrair empreendimentos -mais da metade dos lançamentos imobiliários nos últimos anos ocorreu nessas áreas-, mas não para estimular a habitação social.
“A leitura preliminar do texto da primeira votação indica que vai ter mais gente migrando para o eixo [de transporte e que vai ter mais múltiplas rendas dentro desse eixo”, diz o coordenador do núcleo de habitação e real estate do laboratório, José Police Neto, que foi vereador por 16 anos.
Calcula-se que São Paulo, a maior cidade da América Latina, terá que construir em média 73 mil moradias por ano até 2030 para zerar o déficit atual e a demanda de novas famílias, segundo um estudo encomendado pela Abrainc (Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias) e publicado há um ano. O número é três vezes superior ao que é atualmente produzido, cerca de 24 mil unidades anuais.
TULIO KRUSE / Folhapress