Bolsonaro ignora condenação do STF e livra da cadeia deputado que criticou ministros

Presidente afirmou que medida é constitucional e será cumprida; STF não comentou

0

O presidente Jair Bolsonaro (PP) decretou, nesta quinta-feira (21), um indulto individual (uma espécie de perdão presidencial) ao deputado federal Daniel Silveira, que havia sido condenado pelo Superior Tribunal Federal (STF) a oito anos e nove meses de prisão por tecer críticas contra ministros da Suprema Corte. Procurado, o Supremo Tribunal Federal (STF) disse que não vai se manifestar sobre a decisão de Bolsonaro.

O anúncio foi feito pelo presidente em uma transmissão ao vivo na tarde desta quinta (21), menos de 24 horas depois de o STF finalizar o julgamento de Silveira. Bolsonaro afirmou que a medida visa preservar a liberdade de expressão. Com isso, fica extinta a punibilidade de Silveira.

“Tudo aqui está fundamentado, em decisões do próprio senhor Alexandre de Moraes, presidente do STF (sic). O presidente da República, no uso da atribuição que lhe confere o artigo 84, caput, inciso 12 da Constituição, tendo em vista o exposto do artigo 734, do decreto-lei 3.689, de 3 de outubro de 1941, código de processo penal E, considerando que a prerrogativa presidencial para concessão de indulto individual é medida fundamental à manutenção do Estado Democrático de Direito, inspirada em valores compartilhados por uma sociedade fraterna, justa e responsável”, afirmou Bolsonaro.

Bolsonaro ainda ameaçou, veladamente, o STF, ressaltando que a graça concedida é incondicional. “É um decreto que vai ser cumprido”, disse Bolsonaro, em uma transmissão ao vivo nas redes sociais.

Confira o pronunciamento do presidente Jair Bolsonaro.

O caso

Silveira é acusado pela Procuradoria-Geral da República de agressões verbais e graves ameaças contra os integrantes do Supremo em três ocasiões; de incitar o emprego de violência e grave ameaça para tentar impedir o livre exercício dos Poderes Legislativo e Judiciário por duas vezes; e de estimular a animosidade entre as Forças Armadas e o STF, ao menos uma vez. Ele virou réu em abril de 2021.

O inquérito que condenou Silveira foi conduzido pelo próprio STF, a pedido do ministro Alexandre de Morais, que também julgou o caso. Muitos juristas acreditam que o processo, como um todo, apresentou vícios e nulidades.
É o caso do jurista Adilson Dallari, que considera “um absurdo um processo por crime de opinião”. Dallari lembrou que o artigo 53 da Constituição assegura a inviolabilidade do parlamentar por suas opiniões, palavras e votos. “Em síntese, o processo nasceu nulo”, disse Dallari. “Qualquer condenação por ato que não constitui crime é abusiva. Não concordo com as declarações de Silveira, mas a Carta Magna lhe confere o direito de dizer.”

Ivan Sartori, ex-presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, vê a sentença original “com preocupação”. “A condenação mostra que nossa democracia está mal”, afirmou, ressaltando ainda que outro elemento da condenação ressaltado pelo jurista é o fato de os julgadores serem as próprias vítimas, o que dificulta um recurso do réu, que teria de ser apresentado ao próprio STF, que condenou o deputado. “O deputado é um preso político”, constatou Sartori. “Ele pode solicitar todas as garantias a outros países, de acordo com os tratados internacionais, por sua situação de condenado”, disse. “Vemos claramente a suspeição dos julgadores do STF.”

O advogado criminalista e professor de direito penal da Universidade de São Paulo (USP) Pierpaolo Cruz Bottini, entretanto, tem posição diferente. Ele destaca que Silveira viola a lei ao incitar a violência. “O critério é muito claro. Se ele quiser defender a extinção do Supremo Tribunal Federal, ele poderia. O que não pode é defender a violência para isso, a agressão física. Quando você passa a defender a ideia de incitar a violência, então, claramente, ultrapassou a liberdade de expressão”, ressalta Bottini.