Com nome atraente, o chamado “chip da beleza” vem se difundindo ao longo dos últimos anos no País. Do tamanho de um palito de fósforo, o dispositivo de silicone é implantado no corpo para liberar continuamente hormônios como a gestrinona, esteroide com ações anabolizantes. A promessa é que, com os efeitos androgênicos do hormônio, ocorra emagrecimento, ganho de massa muscular e aumento na disposição física.
Costuma-se omitir, contudo, que o ‘chip da beleza’ não é regulamentado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e pode gerar efeitos colaterais graves. Apesar das contraindicações de tratamentos subcutâneos com a gestrinona, hormônio cuja aplicação é a mais frequente, os relatos médicos sobre efeitos colaterais envolvendo os ‘chips’ têm crescido.
Na última semana, a Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM) se posicionou contra o implante de gestrinona. “Nós somos 5 mil endocrinologistas no Brasil, tinha profissionais de todo o País mandando denúncias sobre o ‘chip da beleza’ para a gente”, disse o presidente do Departamento de Endocrinologia Feminina, Andrologia e Transgeneridade da SBEM, Alexandre Hohl. Segundo ele, foram enviados ofícios à Anvisa e ao Conselho Federal de Medicina (CFM) demandando atenção para o assunto.
O médico explica que, em um primeiro momento, o dispositivo com gestrinona era injetado no corpo sob a justificativa de tratar a endometriose, distúrbio ligado ao crescimento de tecidos do útero. De uns cinco anos para cá, porém, percebeu-se que o uso do dispositivo para fins estéticos e a combinação com outros tipos de hormônios passou a se intensificar. O nome ‘chip da beleza’ veio no meio desse processo.
“Quando se viu, estavam colocando todo tipo de anabolizante nos ‘chips’, principalmente com a justificativa de aumentar massa magra e diminuir massa gorda. Mas não há indicação médica para benefício estético”, conta Hohl. “Pode dar acne, problemas no fígado, no coração, na mama, aumentar colesterol e gerar uma série de outros efeitos.”
À medida que o diagnóstico dessas consequências se intensificou nos consultórios, o médico explica que começou um movimento coletivo das entidades médicas, uma vez que mastologistas, por exemplo, começaram a observar mulheres que usaram o ‘chip’ com o problemas de mama.
ERROS
Triatleta, a bancária Roberta Mori, de 40 anos, ficou sabendo o que era o ‘chip da beleza’ no início do ano passado, quando procurava novas formas de melhorar sua performance no esporte. Roberta pagou R$ 5 mil antecipadamente para um tratamento com ‘chips’ de gestrinona que duraria 12 meses. Poucos após o implante, a experiência passou a ser marcada por complicações. “Tive inchaço, meu corpo reteve líquido, deu tudo de ruim que poderia dar”, conta a bancária, que relata ter engordado cerca de 7 kg.
Os médicos responsáveis, então, receitaram um diurético, que não foi suficiente para evitar que a situação se complicasse ainda mais. Ao ir a uma consulta com um nutrólogo, Roberta conta que seus “exames de sangue bagunçaram absurdamente”, aparecendo inclusive taxas de colesterol alto. Ela relata também ter perdido a libido e o ânimo para a prática de esportes.
O médico Alexandre Hohl explica que atualmente os ‘chips da beleza’ estão em um “limbo”, uma vez que não há normas específicas para regulamentar o uso do dispositivo no País. “A SBEM quer normatizar, que existam regras, que determinem que o implante seja limitado só para determinados casos”, explica o médico.
A entidade realizou uma reunião inicial com a Anvisa para, entre outros pontos, solicitar a inclusão da gestrinona na lista C5, que regula os anabolizantes utilizados no País, e a criação de outras formas de controle. Na nota divulgada, a SBEM reforça que a gestrinona está na lista de substâncias proibidas no esporte e que não é recomendada por entidades americanas. O documento foi endossado pela Associação Médica Brasileira (AMB). A Federação Brasileira de Associações de Ginecologia e Ostetrícia (Febrasgo) apontou que não há dados suficientes que apontem eficácia e segurança na implementação dos chips.
INVESTIGAÇÃO
A Anvisa informou, em nota, que não há medicamento registrado no Brasil contendo o princípio ativo gestrinona. Complementou, porém, que está a par de propagandas de implantes e que está tomando as “medidas necessárias para investigação e apuração dos fatos”.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.