Estacionamento improvisado com grades atrapalha cegos no vale do Anhangabaú

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A instalação de grades e tapumes no entorno do vale do Anhangabaú, no centro de São Paulo, tem causado transtornos a pessoas cegas que moram e trabalham na região. No início da avenida São João, em trecho teoricamente reservado ao trânsito de pedestres, gradis demarcavam vagas de estacionamento improvisadas, que são utilizadas por funcionários da prefeitura e da concessionária que administra o vale.

No local, veículos ficam estacionados por cima do piso tátil para auxílio na locomoção de deficientes visuais, obstruindo a passagem. Alguns carros têm o símbolo da gestão municipal na porta.

“A gente lida com isso todo dia, temos que desviar até de viatura às vezes”, disse o massoterapeuta Jeferson dos Santos, que, nesta terça-feira (16), caminhava do trabalho, na rua Libero Badaró, até a estação São Bento do Metrô.

Santos é cego e estava acompanhado de outros três colegas, também deficientes visuais, e de uma acompanhante. “Sozinho não tem nem como, a gente fica batendo bengala e se trombando pelo caminho até alguém ajudar. Podiam colocar alguém orientando”, cobrou Weslley Silva, que também é massoterapeuta.

Após contato da reportagem, a concessionária Viva o vale removeu os gradis, mas a área continuou sendo utilizada indevidamente como estacionamento. Nesta quarta-feira (17), veículos com identificação da prefeitura continuavam estacionando sobre o piso tátil.

A administração municipal, sob gestão de Ricardo Nunes (MDB), foi questionada mas não comentou o uso inadequado do espaço por servidores. Disse apenas que esclarecimentos devem ser prestados pela concessionária. A empresa não se manifestou até a publicação desta reportagem.

De acordo com o grupo de deficientes visuais que passava pelo local, o caminho fica ainda mais difícil durante a montagem de palcos e, especialmente, em dias de eventos, quando uma área maior do vale do Anhangabaú fica interditada. “A gente tem que dar uma volta maior para chegar até a estação, por um caminho que não conhecemos e que não tem a mesma sinalização”, acrescentou Santos.

Após reforma e concessão à iniciativa privada, o vale do Anhangabaú passou a ser mais utilizado como arena para grandes eventos, como shows e festivais. Nos períodos de montagem dos palcos, a área é cercada por grades e tapumes, que atrapalham a circulação de pedestres. Desde o início da gestão privada, em dezembro de 2021, o vale já passou mais de 100 dias interditado para eventos particulares.

Cercado

No início dessa semana, o vale voltou a ser gradeado para a montagem de palcos para a Virada Cultural, que será promovida pela prefeitura nos dias 27 e 28 de maio. “Vai ser mais um fim de semana complicado. Da última vez que teve evento a empresa teve que fechar por causa do barulho e dificuldade de acesso dos funcionários”, disse o operador de cobrança Caíque Afonso, que trabalha em um edifício na rua Formosa, bem em frente ao vale.

Ele conta que, desde que começou a trabalhar no local, há três meses, foram poucas as vezes em que viu o vale completamente liberado. “Acho ruim que um lugar público fique fechado desse jeito”, disse.

As restrições à circulação são a principal reclamação de quem trabalha na região. “Atrapalha muito, porque quando tem show o acesso é dificultado e tenho colegas que já foram barrados pelos seguranças porque tinham esquecido o crachá da empresa”, relatou operadora de telemarketing Erilaine Marques, 23.

Já o técnico de informática Luiz Gustavo Braga, 22, diz que os bloqueios dificultam o acesso a bancos e outras áreas livres, normalmente utilizadas no horário de almoço por quem trabalha na região. “Pra chegar até os bancos que ficam do outro lado, a gente tem que dar uma volta enorme. Isso faz com que a maioria das pessoas fiquem pra cá”, disse Braga, que trabalha em um prédio ao lado da praça Ramos de Azevedo.

Questionada, a concessionária Viva o Vale não esclareceu até a conclusão desta reportagem o motivo do posicionamento de gradis para delimitação de estacionamento, nem há quando tempo a estrutura foi colocada no local. A empresa também não se posicionou sobre as dificuldades enfrentadas por pessoas com deficiência em razão dos bloqueios, nem disse se oferece suporte especial para este público nos dias de evento.

LEONARDO ZVARICK / Folhapress

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