LISBOA, PORTUGAL (FOLHAPRESS) – As recentes declarações do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) reacenderam as críticas ao petista em Portugal às vésperas da visita oficial que ele fará ao país entre 22 e 25 de abril.
Nos últimos dias, o líder brasileiro voltou a afirmar que a Ucrânia também tem responsabilidade pela guerra com a Rússia e acusou os EUA e a União Europeia de incentivarem o prosseguimento do conflito.
Estado-membro do bloco europeu e da Otan, a aliança militar ocidental, Portugal tem declarado apoio ativo ao país invadido por Vladimir Putin, inclusive com o envio de tanques Leopard a Kiev.
As maiores críticas vieram dos partidos lusos mais à direita. O deputado Rui Rocha, líder da IL (Iniciativa Liberal), quarta maior bancada no Parlamento, questionou a recepção ao presidente brasileiro no país.
“A Assembleia da República que convidou [o presidente da Ucrânia, Volodimir] Zelenski para discursar [por vídeo] não pode receber um aliado de Putin. E o presidente que atribuiu a Ordem da Liberdade a Zelenski não pode estar confortável com a presença de um aliado de Putin como Lula na Assembleia da República.”
O eurodeputado Paulo Rangel, vice-presidente do PSD (Partido Social-Democrata), maior sigla de oposição, instou o governo a “tomar uma posição pública e formal” em relação às declarações de Lula sobre o suposto incentivo da Otan e da União Europeia ao conflito. O parlamentar, porém, contemporizou, afirmando que seu partido considera a visita do petista “muito importante para as relações bilaterais”.
Líder da legenda de ultradireita Chega, o deputado André Ventura, que em 2022 gravou um vídeo de apoio à reeleição de Jair Bolsonaro (PL), voltou a prometer um grande protesto contra a presença de Lula.
Além de criticar as declarações do líder brasileiro sobre a guerra, Ventura insistiu nas denúncias de corrupção contra o petista, chamando-o de “o pior que a política representa”. Para o ato, Ventura disse contar com o apoio de brasileiros em Portugal, como empresários e pessoas ligadas a igrejas evangélicas.
A Associação dos Ucranianos em Portugal também avalia integrar as manifestações contra as falas sobre a guerra. À agência Lusa o presidente da entidade, Pavlo Sadokha, afirmou que a organização preparou uma carta para entregar ao presidente brasileiro e, agora, pensa em realizar um protesto.
Portugal já tinha uma grande comunidade ucraniana antes da guerra, que ficou ainda maior após o conflito. O país implementou um programa de autorizações de residência quase automático para os refugiados, com mais de 58 mil pessoas já beneficiadas por essa iniciativa.
Questionado sobre o posicionamento de Lula, o ministro dos Negócios Estrangeiros de Portugal, João Gomes Cravinho, negou que as falas do líder brasileiro causem algum constrangimento. “Não é embaraço nenhum. Como é que podemos estar constrangidos com posições de outros? Poderíamos estar envergonhados com as nossas próprias posições. Mas as nossas posições são claras”, afirmou.
A visita de Lula a Portugal já havia chamado a atenção na política local, em fevereiro, após uma fala do próprio Gomes Cravinho. Em Brasília, o chanceler luso anunciou que Lula discursaria no Parlamento na sessão solene de 25 de abril, feriado nacional que marca a Revolução dos Cravos e o fim da ditadura.
Na ocasião, diversos partidos já tinham se manifestado contra a ideia e, principalmente, contra os moldes do anúncio, feito por um membro do governo, não pelos parlamentares.
Questionado se, diante de mais essa polêmica com Lula, não seria prudente repensar a programação das cerimônias do dia 25 de abril, o ministro inicialmente negou. “Temos uma tradição muito importante de convergência entre os principais partidos em matéria de política externa. Não vamos permitir que essa tradição seja quebrada por questões de natureza político-partidária conjuntural”, completou.
Porém, diante da polêmica, o governo recuou: Lula ainda vai discursar no Parlamento, mas em uma sessão separada da agenda de comemoração oficial da Casa.
Além do discurso no Legislativo, a agenda oficial de Lula inclui encontros com o premiê e o presidente e a participação na Cúpula Luso-Brasileira e na cerimônia de entrega do prêmio Camões a Chico Buarque.
Trata-se da segunda visita do petista a Portugal em menos de seis meses. Em 18 de novembro, pouco após ganhar as eleições, esteve por cerca de 24 horas em Lisboa, em uma escala no retorno após participar da COP27 no Egito. Na ocasião, Lula declarou que pretendia voltar a se aproximar do país, depois do período de distanciamento no governo de Jair Bolsonaro. O ex-presidente rompeu uma tradição diplomática e não realizou nenhuma visita oficial a Portugal enquanto esteve no cargo.
GIULIANA MIRANDA / Folhapress