Fraude ‘esquenta’ madeira ilegal do Norte como se fosse extraída regularmente em outras regiões

BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – A operação do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) que bloqueou 1,2 milhão de m³ de madeira ilegal no país revelou um esquema de fraude chamado de “rota inversa”. A quantidade renderia R$ 2 bilhões aos criminosos, estima o órgão.

Os suspeitos utilizavam o mercado de créditos virtuais de madeira para esquentar o material extraído ilegalmente.

A equipe de inteligência do instituto identificou no Sistema Nacional de Controle de Produtos Florestais (Sinaflor) créditos de madeira registrados como tendo origem em locais onde não costuma haver exploração e que eram vendidos a empresas em áreas onde há alta incidência de extração irregular.

O crédito virtual é um documento emitido para comercialização de madeira. A investigação acredita que a chamada “rota inversa” serviria para tentar fazer passar como legal o insumo ilegal.

Fazendas regulares no Centro-Oeste e no Nordeste emitem créditos virtuais de madeira (sem necessariamente ter realizado a extração do produto). Esse crédito é vendido a outras fazendas, essas suspeitas de atuar na extração ilegal.

O segundo proprietário revende esse mesmo crédito, mas agora utilizando a madeira irregular.

A investigação do Ibama faz parte da operação Metaverso, que, como mostrou a Folha de S.Paulo, tem gerado reação de latifundiários, sobretudo do sul da Amazônia Legal.

Fazendeiros têm mobilizado políticos, usado fake news e viajado a Brasília para tentar contestar as ações do órgão ambiental. Já houve reuniões no Ministério do Meio Ambiente e no próprio instituto para contestar as ações.

Para o presidente do Ibama, Rodrigo Agostinho, as ações de fiscalização tem gerado reações das alas conservadoras da sociedade. Ele atribui, inclusive, a reação de bolsonaristas ao caso da capivara Filó a este cenário.

“Estão atacando o Ibama porque temos muitas ações no Amazonas, de embargo de áreas desmatadas, apreensões de gado em terra indígena, em unidade de conservação. Esse caso acabou servindo para tentarem desqualificar o trabalho”, afirmou à Folha de S.Paulo.

A operação Metaverso já realizou ações em Acre, Amapá, Goiás, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Pernambuco, Roraima e Tocantins, além do Distrito Federal.

Uma das rotas inversas de madeira identificadas pelo Ibama começa, justamente, em uma empresa com sede em Brasília.

Essa fazenda vendeu 2.440 m³ de créditos virtuais a outra, que fica na cidade de Escada, no estado de Pernambuco, que então repassou 8.018 m³ para uma terceira propriedade, em Vilhena, em Rondônia.

Outro dos caminhos parte de Prado, na Bahia, e vai para outras duas cidades rondonienses: Ji Paraná e Nova Mamoré, e depois é distribuído a outras propriedades no Amazonas.

Já a capital do estado, Porto Velho, e a vizinha Arquimedes foram os destinos de créditos oriundos da paraibana Cajazeiras.

A operação identificou 30 empresas em Rondônia que receberam créditos virtuais de locais onde não costuma haver extração. As propriedades ficam “geralmente em regiões próximas a terras indígenas, unidades de conservação e locais em que o índice de desmatamento está em larga escala”, afirma relatório do Ibama.

Na última quinta-feira (11), o instituto, junto com a Funai (Fundação Nacional dos Povos Indígenas) e a PF (Polícia Federal), realizaram uma operação na Terra Indígena Karipuna, que fica no estado, para retirar invasores envolvidos com desmatamento e extração ilegal de madeira.

A ação desta manhã se concentrou nos 12 maiores pontos de alerta dentro da terra indígena, e 20 madeireiras foram alvo por fraudarem emissões de crédito no Sistema de Documento de Origem Florestal, segundo a PF.

De acordo com a polícia, o esquema é usado para “esquentar” a origem dos produtos florestais que são comercializados ilegalmente, ou seja, dar aparência de legalidade por meio de laranjas e planos de manejo fraudulentos.

Ainda recentemente, o Ibama multou em R$ 57 milhões um outro esquema de fraude para esquentar madeira ilegal, identificado por meio de monitoramento de imagens via satélite.

“O trabalho de monitorar as transações de madeiras nos sistemas de controle possibilitou a identificação da fraude e impedir que créditos virtuais de madeiras continuem acobertando madeiras extraídas de áreas não autorizadas”, conclui o relatório do Ibama sobre as fraudes de rota inversa.

JOÃO GABRIEL / Folhapress

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