SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Os planos realizados pelos estados e pelo Distrito Federal como requisito para o repasse de verbas do Programa Nacional de Redução das Filas, do governo federal, mostram Goiás e Pernambuco no topo da lista de espera.
Em números absolutos, Goiás (125.894), São Paulo (111.271), Rio Grande do Sul (108.066), Pernambuco (103.955) e Minas Gerais (86,414) encabeçam a relação de estados com mais procedimentos em espera.
Quando considerada a população de cada localidade, porém, a ordem se altera.
Em Goiás, a fila equivale a 1.747 operações paradas a cada 100 mil habitantes e, em Pernambuco, a 1.074. Em seguida, aparecem Rio Grande do Sul, Acre e Rio Grande do Norte.
Com exceção do Acre, a cirurgia de catarata representa a maior parcela de procedimentos estagnados nessas localidades. São 58.393 casos aguardando resolução.
Ao todo, o país tem 1.081.786 cirurgias represadas. A expectativa é que o programa, com repasse de cerca de R$ 600 milhões, leve a uma redução de cerca de 45% da lista.
QUAIS CIRURGIAS SÃO ELETIVAS?
Presidente do Colégio Brasileiro de Cirurgiões, capítulo São Paulo, Elias Jirjoss Ilias explica que são consideradas eletivas as cirurgias em que os pacientes não correm risco de vida. É o caso, por exemplo, do tratamento para hérnia umbilical. A condição pode gerar desconforto, porém não representa uma ameaça à saúde.
Mas isso não quer dizer que os pacientes podem aguardar por tempo indeterminado. Há procedimentos eletivos que devem ser feitos com maior rapidez, sob risco de complicações. Ilias cita as hérnias incisionais, que podem encarcerar e resultar em uma cirurgia de urgência, e a retirada da vesícula biliar.
“A dor é a menor das complicações no caso de pedra na vesícula. A pedra pode causar uma inflamação e levar a uma cirurgia de urgência, colocando a vida em risco. A pedra também pode se deslocar para o pâncreas e causar uma pancreatite, uma complicação muito grave”, diz.
O risco de complicações deve ser levado em conta na escolha dos procedimentos que serão priorizados, mas não é a única. Alguns estados optaram por efetuar uma parcela de todos os procedimentos, enquanto outros vão concentrar os recursos em um número reduzido de tipos de cirurgia.
Para Ilias, a diferença pode estar relacionada à estrutura de cada localidade e à disponibilidade de médicos especialistas. “Um médico generalista não resolve nenhum dos itens da lista”, afirma.
Ele acrescenta que muitos dos procedimentos realizados são considerados de menor complexidade e alguns, como as cirurgias de catarata, têm grande impacto na qualidade de vida e são mais baratos por não demandarem internação. O Ministério da Saúde prevê investir cerca de R$ 600 milhões em 487 mil cirurgias, uma média de R$ 1.232 por procedimento.
O QUE DIZEM OS ESTADOS?
Questionada sobre as cirurgias acumuladas, a Secretaria da Saúde de Goiás afirmou que “realizou mapeamento em conjunto com o Conselho de Secretarias Municipais de Saúde de Goiás, e pela primeira vez houve unificação da fila dos procedimentos cirúrgicos eletivos”.
Segundo a pasta, das 125.894 pessoas em todo o estado à espera de algum procedimento eletivo, 13.893 (11%) aguardam na fila do Complexo Regulador Estadual, que faz a gestão de vagas nos hospitais estaduais.
Pelo programa nacional, o estado receberá cerca de R$ 20 milhões para realizar 25.085 cirurgias, 19,9% da fila.
Como Goiás, o Governo de Pernambuco atribuiu a fila aos municípios. “Esse quantitativo foi o somatório acumulado nas filas internas dos principais hospitais do estado e o que os municípios pernambucanos nos informaram em planilhas enviadas. Desse total, o maior quantitativo está nos próprios municípios, com mais de 90 mil pacientes”, afirmou a Secretaria da Saúde pernambucana.
A gestão também apontou a pandemia de Covid-19 e a ausência de uma política estadual de regulação capaz de promover cirurgias de forma contínua e regular como fatores responsáveis pelo acúmulo.
De acordo com o Ministério da Saúde, o estado receberá repasses para a realização de 20.111 procedimentos, 19,3% do total.
O dinheiro será utilizado em procedimentos como tratamento cirúrgico de varizes, retirada da vesícula biliar, cirurgia para tratamento de hérnia, vasectomia, circuncisão, laqueadura e remoção do útero.
O estado acumula 12.733 cirurgias de catarata represadas, mas não deve direcionar recursos do programa nacional para esses procedimentos. “Elas serão contempladas num segundo momento, pelo fato de conseguirem ser realizadas pelos municípios”, declarou a secretaria.
O Rio Grande do Sul também indicou a pandemia como causa do represamento dos atendimentos eletivos. O estado receberá aproximadamente R$ 32 milhões pelo programa do Ministério da Saúde e prevê realizar com esse montante 16% das cirurgias da lista.
Assim como Pernambuco, o governo gaúcho utilizará os recursos em uma parte específica dos procedimentos, entre os quais a retirada de vesícula e tratamento de varizes. Também estão previstas 3.723 cirurgias de catarata.
A FILA VAI DIMINUIR?
Especialistas consultados pela reportagem avaliam que o programa reduzirá a fila de espera, mas o efeito será apenas temporário se não forem adotadas mudanças estruturais. Ilias menciona, por exemplo, a necessidade de mais médicos especialistas e a maior transparência no repasse e no uso dos recursos.
O cirurgião também lembra que muitos municípios não dispõem de estrutura para a realização de procedimentos simples e é importante facilitar a interlocução e a integração com os equipamentos de saúde estaduais.
“Com a Covid-19, foram realizadas apenas as cirurgias de urgência e tudo que era eletivo teve de esperar. Isso levou a um aumento da lista e vamos precisar de um esforço grande e muito investimento em saúde para chegar ao menos ao patamar pré-pandemia”.
STEFHANIE PIOVEZAN / Folhapress