Indígenas do baixo Tapajós afirmaram nesta quarta-feira (12), durante entrevista coletiva, que a manifestação que terminou em confusão em uma área restrita da COP30 saiu do controle, mas que foi um “recado de resistência”. O grupo destacou que o objetivo era chamar atenção para as pautas relacionadas aos povos originários durante a conferência.
“Nossas manifestações têm sido para que nos ouçam. Quando entram em nosso território, ninguém pede licença, acham que são donos”, diz Margareth Maytapu, coordenadora do Conselho Indígena Tapajós e Arapiuns.
O grupo afirmou que pretende apresentar suas reivindicações na COP30, mas que elas não têm ganhado espaço nas negociações oficiais, ficando restritas aos debates paralelos da cúpula. Além disso, acrescentou ainda que apenas um representante do baixo Tapajós, formado por 14 povos indígenas, a maior concentração do Pará, conseguiu entrar na zona azul. O espaço é administrado pela ONU e reservado a pessoas credenciadas, como negociadores e membros das delegações oficiais dos países participantes.
Entre os pontos levantados pelos manifestantes está a privatização dos rios Tapajós, Tocantins e Madeira para exploração de hidrovias de transporte de cargas. Eles também denunciaram o avanço de madeireiras e da mineração na região, que provoca contaminação por mercúrio.
Outra preocupação das lideranças é o ritmo da demarcação de terras pelo governo Lula e as negociações de crédito de carbono conduzidas pelo governo do Pará. Eles afirmam que não estão sendo ouvidos. “A COP30 é uma negociação, e o que mais está sendo negociado é o nosso território”, diz Auricélia Arapiun, liderança indígena do Tapajós. “Não dá para falar de clima sem nos consultar”, acrescentou.
O cacique Gilson Tupinambá também se queixou da falta de espaço para indígenas na zona azul. “O presidente Lula esteve na nossa terra, mas não nos ouviu. Privatizou o rio e vai privatizar a nossa vida”.
A manifestação
Os manifestantes relataram que acompanhavam a Marcha Global de Saúde e Clima, que reuniu cerca de 3 mil pessoas, quando decidiram seguir até a entrada da zona azul em um ato separado. Eles foram impedidos de avançar por seguranças que formaram cordões humanos. As entradas e saídas chegaram a ser bloqueadas e um segurança ficou ferido.
Vídeos divulgados nas redes sociais mostram o momento em que os manifestantes passam pelos detectores de metal antes de serem contidos. Faixas e bandeiras exibiam críticas à exploração de petróleo, ao conflito na Palestina e à exclusão de temas indígenas das negociações oficiais.
Durante a coletiva desta quarta-feira, as lideranças destacaram que o ato não foi organizado em conjunto com os movimentos sociais que participaram da marcha. Eles também admitiram que o movimento fugiu de controle ao chegar na área de negociações da COP30.
“Não sabemos dos movimentos sociais, só podemos falar por nós”, disse Auricélia. “Não tivemos responsabilidade com o que as pessoas fizeram de entrar forçado”.
Os organizadores da manifestação ressaltaram que a entrada na zona azul não ocorreu em conjunto com a Marcha Global de Saúde e Clima, nem com organizações como a Coiab (Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira) e a Apib (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil).
Por meio de nota, a Apib destacou que não participou da manifestação. “A Apib reafirma que o movimento indígena é amplo e diverso e que esta entidade não coordenou as atividades da referida manifestação. Ao mesmo tempo, reitera o respeito ao direito de manifestação e à autonomia de cada povo em suas formas próprias de organização e expressão política”.
Já o presidente da COP30, o embaixador André Corrêa do Lago, afirmou nesta quarta que a manifestação faz parte de um país democrático, apesar dos excessos, mas não explicou a quem atribuía os excessos.
“Houve um certo excesso, mas eu acredito que é uma coisa que entra dentro de um contexto muito mais amplo, e a gente não pode deixar de lembrar […] que essa já é a COP mais inclusiva. Então as pessoas têm espaço, pleno espaço para manifestar todas as suas reticências, discordâncias, dificuldades”, disse.



