Iphan mantém paralisação de obra no metrô de SP após encontro de novos resquícios quilombolas

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) indeferiu pedido para retomada das escavações na futura estação Praça 14 Bis, da linha 6-laranja do metrô, no Bixiga, região central de São Paulo.

O parecer técnico do último dia 9, assinado pela arqueóloga Gladys Mary Santos Sales, cita o surgimento de novas peças que podem ter origem quilombola no canteiro de obras.

A informação foi publicada primeiramente pelo Diário do Transporte e confirmada pela Folha. O parecer consta no site do Iphan.

As escavações estão interrompidas desde o dia 7 de fevereiro por causa das fortes chuvas na região e por ação do coletivo Mobiliza Saracura Vai-Vai junto ao Iphan, pendido a paralisação das escavações até que seja realizada uma avaliação do solo.

A interrupção ocorreu para preservação do local onde inicialmente foram encontradas cerca de 300 peças supostamente de origem do Quilombo Saracura.

O Metrô de São Paulo atua com o consórcio LinhaUni, que tem a espanhola Acciona à frente, na construção da linha 6-laranja em uma parceria público-privada.

Após a descoberta do sítio arqueológico, de aproximadamente 280 m², durante as escavações, a A Lasca, empresa especializada em arqueologia, foi contratada para retirada e análise dos objetos encontrados.

O parecer técnico do Iphan, que analisa o “Programa de Arqueologia Preventiva da Linha 6,-Laranja, do Metrô de São Paulo -Salvamento Emergencial na área do Sítio Saracura/14 Bis– Estação 14 Bis” cita que no ultimo dia 30 de março foi reportado a identificação de uma nova concentração de material arqueológico, na porção sul da estação, próximo ao limite com a rua Cardeal Leme.

“Considerando o achado, foi delimitada uma nova área no local para salvamento arqueológico e expandido o polígono do sítio Saracura/14 Bis”, afirma o documento.

Segundo o texto, com relato do programa de arqueologia preventiva da linha 6, alguns dos materiais encontrados no fim de março são fragmentos de utensílios cerâmicos, louça, vidro, polímeros e couro (sobretudo sapatos), com características semelhantes aos demais vestígios identificados e coletados no sítio.

“Contudo, duas peças cerâmicas se destacam na coleção, podendo estas ter relação com artefatos utilizados em cerimônias e atividades de religiões de matriz africana. Tratam-se de uma base e uma borda, possivelmente fragmentos de quartilhames. […]”, afirma.

“Algumas das peças identificadas podem ainda apresentar uma datação mais antiga, quiçá do século 19, mas aparecem junto a materiais mais recentes. Conforme descrito, dada a relevância do achado a área foi delimitada para a execução das atividades de salvamento arqueológico, quando da sua retomada.”

No pedido para a volta das escavações, é citado que foram estabelecidas medidas de proteção à área do resgate.

Também afirma que há condições climáticas favoráveis à intervenção arqueológica de subsuperfície, em trabalho coordenado pela arqueóloga Lúcia de Jesus Cardoso Oliveira Juliani.

No parecer, a arqueóloga do Iphan pede que sejam enviados ofícios aos ministérios da Cultura, dos Direitos Humanos e Cidadania e à Fundação Cultural Palmares, entre outros órgãos, inclusive do instituto de preservação.

“Uma vez que o afloramento de materialidade de possível associação com Quilombo nesta área requer a inserção ao debate sobre direito à memória e reparação de patrimônio sensível, de todos os Órgãos de competência no componente de Matriz Africana”, escreve Sales.

A estação está sendo construída onde era a escola de samba Vai-Vai, maior campeã do Carnaval de São Paulo, desapropriada em 2021 e que até hoje não tem uma nova sede.

Ao todo, nove sítios arqueológicos foram encontrados em escavações das obras da linha 6-laranja do metrô de São Paulo. Esses locais, com vestígios de antigas ocupações humanas na cidade, estão descritos em relatórios da concessionária responsável pela construção.

Lançada em 2008, a linha 6-laranja foi prometida inicialmente para 2012. Com 15 estações, a linha vai ligar a Brasilândia, na zona norte, à estação São Joaquim, no centro, onde haverá interligação com a linha 1-azul.

A previsão é que a linha inteira seja inaugurada de uma vez até o fim de 2025, segundo a Secretaria de Transportes Metropolitanos.

As escavações tiveram de ser paralisadas em 1º de fevereiro quando houve o rompimento da tubulação da Sabesp, que fez ceder o asfalto da marginal Tietê, na altura da ponte da Freguesia do Ó. Na ocasião, as pistas local e central, no sentido da rodovia Ayrton Senna, foram interditadas para veículos.

Questionada na noite deste sábado (13) sobre como pretende retomar a obra da estação no Bixiga e se o indeferimento do Iphan pode atrasar a inauguração da linha, a concessionária LinhaUni não respondeu até a publicação desta reportagem. A Secretaria de Transportes Metropolitanos também não havia se pronunciado.

Sobre os objetos encontrados no sítio arqueológico, a Acciona disse recentemente que eles poderão fazer parte do acervo do Centro de Arqueologia de São Paulo, vinculado ao Departamento do Patrimônio Histórico da Secretaria Municipal de Cultura, ou serão identificadas alternativas de exposição em conjunto com a comunidade do entorno.

A empresa também afirmou estar aberta para apoiar a comunidade do Bixiga em projetos futuros de preservação do patrimônio.

O Metrô afirmou no início do mês que vai depender da aprovação do Iphan para encaminhar os objetos encontrados para o Centro de Arqueologia de São Paulo, que poderá estudá-los.

FÁBIO PESCARINI / Folhapress

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