Juíza condena homem negro e aponta raça como motivo para agravar a pena

Professor da USP Ribeirão afirma que conduta contraria leis brasileiras; juíza pode responder por racismo

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Uma juíza do Paraná mencionou a raça de um réu, que é negro, como motivo para a condená-lo pelo crime de associação criminosa. A medida causou intensa repercussão e a magistrada se desculpou, afirmando que a frase foi retirada de contexto.

A juíza Inês Marchalek Zarpelon, da 1ª Vara Criminal de Curitiba, afirmou que criminoso fazia assaltos e roubava aparelhos celulares de vítimas em praças da região central da cidade.

“Seguramente integrante do grupo criminoso, em razão da sua raça, agia de forma extremamente discreta os delitos e o seu comportamento, juntamente com os demais, causavam o desassossego e a desesperança da população, pelo que deve ser valorada negativamente (sic)”, disse a magistrada, na sentença.

A decisão em primeira instância da magistrada condenou Natan Vieira da Paz, 42, a 14 anos e dois meses de prisão por organização criminosa e por roubos no centro da cidade.

O Tribunal de Justiça do Estado do Paraná (TJPR) informou que a Corregedoria Geral da Justiça instaurou procedimento administrativo para apurar o caso.

Fixação da pena

A magistrada ainda cita a raça de Paz em outros dois trechos do documento. Em um dos crimes, o de organização criminosa, a pena foi aumentada por conta da “condição social” do acusado apesar de, na sentença, ela mesma ter declarado que não sabia nada sobre a conduta social do acusado.

Para o professor Daniel Pacheco Pontes, doutor em direito penal e professor da Universidade de São Paulo (USP), a conduta da juíza não atende aos padrões estipulados pela legislação brasileira. “A Constituição veda qualquer discriminação por cor ou raça, e isso certamente inclui não usar a questão racial para justificar um aumento de pena”, comenta.

Outro lado

Em nota, a juíza pediu desculpas. “Peço sinceras desculpas se de alguma forma, em razão da interpretação do trecho específico da sentença, ofendi a alguém”, disse a magistrada em nota.

Procurada, a advogada Thayse Pozzobon, que defende Natan, afirmou que vai recorrer da decisão. “A raça dele não pode, de maneira alguma, ser relacionada com os fatos que ele supostamente praticou”, afirmou a advogada. “A realidade é que ela aumentou em sete meses a pena dele em razão da cor da pele dele”, afirmou.

O caso foi comunicado à Comissão de Igualdade Racial e Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil no Paraná (OAB-PR). O presidente da OAB-PR, Cássio Telles, afirmou que vai pedir ao Ministério Público do Paraná (MP-PR) uma apuração sobre o caso para verificar se houve crime de racismo por parte da magistrada.