RECIFE, PE (FOLHAPRESS) – A limitação ao número de visitantes, prevista no novo acordo de gestão compartilhada de Fernando de Noronha, tem gerado críticas de donos de pousadas e hotéis. O novo formato de cooperação dos governos federal e de Pernambuco, porém, não deve trazer impactos práticos para o acesso dos turistas, salvo a capacidade.
O acordo, em vigor desde a homologação, em março, está em fase de regulamentação pelos governos federal e estadual.
Um dos pontos que pode gerar impacto para o turismo é a limitação a 11 mil turistas por mês e 132 mil por ano na visitação ao arquipélago. Esse trecho do acordo gera críticas de donos de hotéis e pousadas.
Em 2022, Fernando de Noronha recebeu 149,8 mil pessoas, um recorde. São Paulo foi o campeão com 30.532 turistas, seguido por Pernambuco, com 10.199, e Rio de Janeiro, com 9.302 visitantes. O Parque Nacional Marinho recebeu, ao todo, 129 mil pessoas.
Moradores de Fernando de Noronha ouvidos pela Folha, a maioria sob reserva, dizem que foram escanteados na elaboração do novo acordo de gestão compartilhada do arquipélago, que substitui o vínculo anterior, de 2002, no qual a União cedia a Pernambuco a tarefa de gerir Fernando de Noronha.
A homologação pôs fim a um enredo iniciado em março de 2022 pelo então presidente Jair Bolsonaro (PL). Na época, a Advocacia-Geral da União entrou com um pedido no STF para dar à União o controle do arquipélago com o argumento de que a gestão estadual havia descumprido termos do acordo em voga.
A Constituição de 1988 prevê que Fernando de Noronha pertence ao estado de Pernambuco.
Donos de hotéis e pousadas criticam a regra de limitação de turistas até que seja feito um estudo de capacidade com indicadores de sustentabilidade. Para eles, em meses mais requisitados, como no período do verão, poderia haver uma flexibilização maior.
A argumentação é que a distribuição equânime penaliza períodos de maior presença de turistas e amplia vagas ociosas em momentos sem presença maciça de pessoas de fora.
A dona de pousada Dora Costa acredita que o número recomendado foi tomado com base no número potencial de turistas diários em Noronha, cerca de 360, em razão dos leitos disponíveis. “A gente não sabe de onde se tirou esse número.”
Hayrton Almeida, presidente do Conselho de Turismo de Noronha, reclamou, em audiência na Assembleia Legislativa, da distribuição do número de visitantes. Para ele, “a sazonalidade não foi levada em consideração”.
“Existem períodos de baixa estação na ilha, como está acontecendo no mês de abril, em que pousadas estão com menos de 30% de ocupação. Alguns desses estabelecimentos fecharam”, disse, de acordo com notas taquigráficas da Assembleia Legislativa.
A secretária estadual de Meio Ambiente e Fernando de Noronha, Ana Luiza Ferreira, argumenta que a limitação prioriza sustentabilidade ambiental, e não fatores econômicos. “Foi uma análise técnica e ambiental feita pela equipe do ICMBio do que Noronha comporta sem comprometer a sustentabilidade.”
A reportagem também apurou que não há mudanças no radar em relação à taxa paga para acesso ao arquipélago. O valor atualmente está em R$ 92,89 por dia e pode ser pago pela internet. Para ter acesso ao Parque Nacional Marinho, aliás, é preciso desembolsar mais R$ 179.
A atracação de cruzeiros não mudou e segue sem sinalização do governo para que seja liberada. Fernando de Noronha não recebe navios turísticos desde 2013, após 23 anos seguidos de liberação. A mudança aconteceu porque o local precisa seguir critérios rígidos de preservação ambiental.
“Fiquei decepcionado porque o governo [federal] sequer veio aqui nos ouvir. Deveria ter vindo aqui antes. Agora é que estão tentando explicar o que é o acordo. A população está chateada”, afirma Caco Valença, proprietário de restaurante na ilha.
Ana Luiza Ferreira, a secretária, diz que não cabe escuta popular na fase inicial do acordo, e sim, com a elaboração do plano de manejo, que vai regulamentar as diretrizes conforme a atribuição de cada ente envolvido.
O deputado estadual Waldemar Borges (PSB), um dos autores do pedido de audiência pública sobre o novo acordo no mês passado, acredita que os governos federal e estadual se equivocaram. “O congelamento da área urbana da Ilha precisaria de um estudo anterior para respaldar. A população cresce vegetativamente, então, isso parece um equívoco”, diz.
Sob responsabilidade do governo de Pernambuco está um dos focos de preocupação dos visitantes e dos moradores de Noronha: o aeroporto. O terminal segue com restrições para aviões a jato desde outubro de 2022. Assim, as operações comerciais têm sido feitas por aviões de hélice.
A Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) impôs a medida alegando degradação do nível de qualidade da pista do terminal aeroportuário.
A obra foi estimada em 12 meses para conclusão, quando foi iniciada, em dezembro de 2022. A secretária Ana Luiza Ferreira acredita na antecipação do prazo, mas diz que há dificuldade de transporte do material para a requalificação da pista.
O aeroporto de Fernando de Noronha é gerido por uma empresa via concessão do estado. No novo acordo, esse formato segue. Além disso, a gerência da zona urbana e histórico-cultural e do porto também fica com o governo estadual.
A reportagem procurou o ICMBio, mas o órgão não indicou um profissional do Parque Nacional de Noronha para atender a reportagem.
JOSÉ MATHEUS SANTOS / Folhapress