O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) anunciou nesta segunda-feira (5) o texto final do novo PPCDAm -Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal-, um dos eixos mais aguardados da política ambiental do governo petista.
O anúncio ocorre em meio ao esvaziamento do Ministério do Meio Ambiente, comandado por Marina Silva. A pasta teve atribuições retiradas pelo Congresso Nacional na última semana sem maiores resistências do Palácio do Planalto.
O PPCDAm estabelece as diretrizes para a proteção da floresta amazônica nos próximos quatro anos e chega agora à sua quinta versão com a meta de alcançar desmatamento zero até 2030.
Ambientalistas costumam afirmar que, para cumprir essa meta, que é considerada ousada, é necessário que os órgãos ligadas ao tema sejam fortalecidos. No entanto, a bancada ruralista do Legislativo decidiu esvaziar os ministérios do Meio Ambiente e o dos Povos Indígenas e o governo não se esforçou para reverter o cenário.
A gestão do CAR (Cadastro Ambiental Rural), o instrumento para controlar terras privadas e conflitos em áreas de preservação, por exemplo, saiu do guarda-chuva de Marina e foi para a pasta da Gestão e Inovação em Serviços Públicos.
Criado em 2004, o PPCDAm teve quatro atualizações até ser descontinuado por Jair Bolsonaro (PL) em 2019. No primeiro dia de seu novo governo, Lula e Marina publicaram um decreto reinstituindo o plano, mas os detalhes só foram definidos agora.
Considerado um dos principais mecanismos para proteção da floresta amazônica nos governos anteriores do PT, o PPCDAm estabeleceu uma política transversal de atuação e ajudou a reduzir a taxa de desmatamento em 83% entre 2004 e 2012.
O plano atual repete parte da fórmula inicial e prevê obrigações não só para o Ministério do Meio Ambiente, mas também para a Casa Civil e outras pastas, como os ministérios da Agricultura, do Desenvolvimento Agrário, da Indústria, da Defesa, e da Justiça e Segurança Pública.
O texto foi colocado em consulta pública em abril e recebeu mais de 500 sugestões. A versão final inclui o quadro de metas e indicadores, que detalha resultados esperados, prazos e atores-chave. O decreto que restabeleceu o PPCDAm prevê ainda a publicação anual de um relatório de monitoramento.
O plano apresenta 12 objetivos estratégicos, divididos em quatro eixos principais: fomento a atividades produtivas sustentáveis; monitoramento e controle ambiental; ordenamento fundiário e territorial; e infraestrutura ambientalmente sustentável.
Além de acompanhar os alertas de desmatamento por satélite, o novo PPCDAm se propõe a monitorar indicadores de degradação florestal para organizar a fiscalização. A degradação florestal é considerada mais silenciosa porque a “vegetação permanece, mas em estágios que levam à perda da biodiversidade”.
O texto destaca que, nos últimos quatro anos -sob Bolsonaro e seu ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles (PL-SP), hoje deputado federal-, houve a redução da capacidade de atuação dos órgãos ambientais, como o Ibama e o ICMBio.
Uma das alterações mais significativas no padrão da destruição da floresta são a presença cada vez maior do crime organizado e do tráfico de drogas na Amazônia, que potencializam a violência e os conflitos pela posse da terra.
O plano elenca ainda outras cinco mudanças ocorridas nas últimas décadas: interiorização do desmate; reconcentração do desmatamento em grandes áreas; redução da governança estatal em áreas protegidas; persistência do crime ambiental nas cadeias produtivas; e aumento da degradação florestal.
A expectativa do governo federal é iniciar a revisão do Plano de Prevenção e Controle do Desmatamento no Cerrado -o equivalente ao PPCDAm para o cerrado- em julho.
‘RETROCESSO’
Ao lado de Lula no evento desta segunda-feira, Dia Mundial do Meio Ambiente, Marina classificou como “retrocesso” a decisão do Congresso que esvaziou a pasta que está sob sua responsabilidade.
A ministra afirmou que as mudanças aprovadas pelo Legislativo vão “na contramão daquilo que significa ter legislação ambiental robusta”. Ela lembrou que Lula tinha colocado o CAR (Cadastro Ambiental Rural) e a ANA (Agência Nacional de Águas) sob a gerência do Ministério do Meio Ambiente, mas a decisão foi revertida pelo parlamento.
“Infelizmente, em recente decisão do Congresso tivemos um retrocesso e reversão dessa sua decisão. É uma decisão que não está em acordo com aquilo que é o fortalecimento do sistema nacional do meio ambiente, que acatamos porque na democracia a gente acata decisões legítimas do Congresso, mas não posso concordar”, disse.
“Não posso concordar porque vão na contramão daquilo que significa ter legislação ambiental robusta e [que] faça com que o Ministério do Meio Ambiente possa cumprir com suas atribuições que lhe são conferidas na Constituição e em todas as leis que asseguraram a criação do sistema nacional de meio ambiente”, completou.
O texto aprovado desidratou a pasta comandada por Marina e também a de Sônia Guajajara (Povos Indígenas), que perdeu a função de tratar da demarcação de terras indígenas.
O relatório aprovado retirou a ANA do Meio Ambiente e a transferiu para o Desenvolvimento Regional -pasta comandada por Waldez Góes (PDT), indicado por parlamentares da União Brasil.
O CAR, instrumento para controlar terras privadas e conflitos em áreas de preservação, também saiu do ministério chefiado por Marina e foi alocado sob Gestão e Inovação em Serviços Públicos, chefiado por Esther Dweck.
Com receio de derrotas maiores, o governo decidiu não lutar para manter a sua proposta original relacionada com a área ambiental.
Um dia antes, na terça-feira (30), a Câmara dos Deputados também aprovou o projeto de lei do marco temporal, em mais uma vitória da bancada ruralista ante a agenda ambiental do governo.
A tese do marco, defendida pela FPA, determina que as terras indígenas devem se restringir à área ocupada pelos povos na data da promulgação da Constituição de 1988.
Além disso, Marina Silva enfrenta disputa dentro do próprio governo sobre a possibilidade de exploração de Petróleo na Foz do Amazonas. A medida tem o apoio de parte do núcleo político e do ministro das Minas e Energia, Alexandre Silveira.
THAÍSA OLIVEIRA / Folhapress