SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O presidente Lula encaminhou ao Congresso nesta quinta-feira (11) o Acordo de Escazú sobre democracia ambiental. Assinado pelo Brasil e outros 23 países latino-americanos em 2018, o texto precisa ser ratificado pelo Congresso para que se torne lei nacional.
A Folha de S.Paulo havia antecipado em abril que o texto estava na Casa Civil, pronto para ser encaminhado ao Congresso.
A expectativa do Ministério do Meio Ambiente era que o envio ao parlamento acontecesse durante a COP2 do Acordo de Escazú, há três semanas. A ministra Marina Silva representou o país na conferência ainda na condição de observadora.
Segundo funcionários do governo e interlocutores, o atraso no despacho teria acontecido devido a uma lentidão burocrática da Casa Civil. A assinatura do presidente foi publicada junto a outros 18 despachos.
O encaminhamento do texto à Casa Civil foi feito pelo Itamaraty após reunir a anuência de oito ministérios ligados ao tema. A pasta da Agricultura foi a última a concordar com a matéria e estaria sob pressão de entidades do agronegócio contrárias a compromissos do tratado, como o estabelecimento da obrigação de informar a população sobre riscos ambientais.
Embora a pressão do agronegócio seja esperada na tramitação do projeto no Congresso, ONGs contam com a base do governo para mobilizar a aprovação do Acordo.
“[A aprovação] é parte da reinserção do país no mundo pela via ambiental e também da reconstrução da governança ambiental”, afirma Renato Morgado, gerente de programas da Transparência Internacional Brasil.
O anúncio de que o Brasil encaminha o acordo para a ratificação é parte da estratégia de alavancagem do protagonismo regional do país na pauta ambiental. Candidato a sediar a COP30 do Clima em 2025, o Brasil terá sua candidatura avaliada pelos países latino-americanos neste ano.
O acordo regional estabelece avanços comuns sobre três bases: acesso à informação, participação pública e acesso à Justiça em assuntos ambientais. O acordo é pioneiro em prever mecanismos específicos de proteção a defensores ambientais, justamente em uma região que lidera o ranking de assassinatos de ativistas e defensores ambientais.
No último ano, o Brasil ficou no topo do ranking dos países que mais matam defensores ambientais, de acordo com a Global Witness, seguido pela Colômbia. Entre os 10 países do topo do ranking, 7 são da América Latina.
Segundo o advogado e ambientalista Rubens Born, o acordo garante medidas práticas para evitar a repetição de tragédias ambientais conhecidas pelos brasileiros.
Ele cita o caso do assassinato do indigenista Bruno Pereira e do jornalista Dom Phillips na fronteira do Amazonas com a Colômbia e o Peru, no último ano. “O artigo 11 do acordo prevê a cooperação entre órgãos que atuam na prevenção de ilícitos ambientais, o que é muito importante nas zonas fronteiriças.”
Ainda segundo Born, os casos dos rompimentos de barragens de mineração da Vale, que levaram à destruição de Mariana (MG) em 2015 e de Brumadinho (MG) em 2019, também podem deixar de se repetir por meio do acesso à informação ampla sobre os riscos ambientais, e não só sobre os impactos.
“Os artigos sobre acesso à informação preveem que ela deve ser imediatamente liberada em caso de ameaça iminente, que é o oposto do que acontece”, afirma Born. “A primeira reação das autoridades geralmente é sonegar a informação para não gerar pânico. A informação tem que ser liberada.”
Segundo Joara Marchezini, coordenadora de projetos do Nupef e eleita entre as representantes do público no Acordo de Escazú, as leis brasileiras serviram como referência na construção do acordo, o que deve facilitar a adaptação jurídica do país aos novos mecanismos acordados.
ANA CAROLINA AMARAL / Folhapress