Mudança climática deve ser pauta da Casa Civil e Fazenda, diz estudo

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Um novo relatório que será apresentado a representantes do governo federal na manhã desta terça-feira (30) defende que a pauta climática componha as incumbências de ministérios-chave do governo federal, como a Casa Civil e a Fazenda.

“Isso garante que as propostas para a transição climática tenham força política suficiente para serem implementadas, independente das barreiras internas que possam aparecer”, diz o relatório, produzido conjuntamente por Insper, IDS (Instituto Democracia e Sustentabilidade) e plataformas Arq.Futuro e Por Quê? Economês em Bom Português.

A medida ainda teria outros dois impactos, de acordo com a proposta. Um deles é sinalizar para a sociedade que a transição climática irá acontecer e impactará a todos. “Isso pode estimular outros setores da sociedade a começarem a planejar e se preparar para a transição”, diz o relatório.

O outro impacto é a melhora da articulação entre os setores da administração pública, “facilitando uma mudança ampla em diversos aspectos da sociedade”.

Intitulado “Retomada Econômica Verde – Inspirações para o Debate Brasileiro a Partir de Experiências Internacionais”, o estudo reúne experiências da governança climática em quatro países: Chile, China, França e Estados Unidos, reunidas a partir de seminários realizados com representantes do governo de cada nação.

A partir das práticas internacionais, os pesquisadores avaliaram possíveis inspirações e recomendações que poderiam destravar uma retomada econômica verde no Brasil.

A estratégia de levar a pauta climática para ministérios-chave, por exemplo, é inspirada no movimento francês, que instituiu uma secretaria de políticas climáticas junto ao primeiro-ministro. O órgão o assessora na antecipação, planejamento e implementação das mudanças necessárias no país, segundo o estudo.

Os resultados serão apresentados na manhã desta terça-feira em seminário em São Paulo junto a representantes do governo federal, incluindo a ministra do MMA, Marina Silva, que participará por vídeo; o embaixador André Corrêa do Lago, secretário de clima, energia e meio ambiente do Itamaraty; o secretário-executivo do MMA, João Paulo Capobianco; e a diretora de infraestrutura, transição energética e mudança climática do BNDES, Luciana Costa.

Para que que tenha efeito, a medida requer governança, diz a professora associada e líder do centro de sustentabilidade e negócios do Insper, Priscila Claro, uma das autoras do estudo.

“É preciso ter gente que entende do assunto nas equipes dos ministérios que forem corresponsáveis pela política”, afirma Claro. “Colocar meio ambiente e clima na pauta da economia não é só desejável; é a única possibilidade de fazer a mudança acontecer”, completa.

A medida dialoga com uma das possibilidades analisadas pelo governo federal para responder ao esvaziamento dos ministérios do Meio Ambiente e dos Povos Indígenas proposto pelo Congresso na MP 1.154, que estrutura órgãos do governo federal.

Sem força política junto aos parlamentares para evitar a perda de órgãos estratégicos das pastas para ministérios que administram outras agendas, o Palácio do Planalto propôs às ministras Marina Silva (Meio Ambiente) e Sonia Guajajara (Povos Indígenas) a criação de comitês interministeriais para administrar conjuntamente as políticas que seriam transferidas das suas áreas.

A proposta da MP 1.154 retira do MMA as competências sobre o CAR (Cadastro Ambiental Rural), a ANA (Agência Nacional de Águas) e a gestão de resíduos sólidos e saneamento, além de remover do recém-criado Ministério dos Povos Indígenas duas das suas atribuições principais: a demarcação de terras indígenas e a administração da Funai.

A proposta no Congresso veio na esteira de desgastes do Meio Ambiente com pastas fortes do governo, como Minas e Energia e Casa Civil, que buscam reverter o indeferimento do Ibama ao licenciamento ambiental para prospecção de petróleo na Foz do Amazonas.

“O investimento na exploração de petróleo na Foz do Amazonas ou mesmo o pré-sal é totalmente desconectado do discurso brasileiro sobre clima. Se isso se concretiza, teremos um belo greenwashing [maquiagem verde] no governo”, avalia Claro.

A inspiração do estudo para esse caso vem da China. Embora 60% da produção energética chinesa dependam do carvão, o país tem se mobilizado para eletrificar o máximo possível de sua economia, com planos específicos para setores como transporte, aquecimento e indústria.

“A China optou por investir na transição climática por perceber que a neutralidade de carbono pode vir a representar uma vantagem econômica e geopolítica em um mundo que cada vez mais enfrenta as consequências das mudanças climáticas”, aponta o relatório.

“O governo brasileiro parece ainda olhar para as políticas climáticas como um custo, sem efetivamente discutir os potenciais retornos econômicos e políticos que investimentos nesse setor podem trazer para o país no futuro”, compara.

O estudo também se inspira na estratégia para recomendar ao Brasil a elaboração de planos setoriais em cooperação com grandes empresas poluidoras, “reduzindo a resistência setorial e estimulando atores menores a se engajarem com a transição”.

O projeto Planeta em Transe é apoiado pela Open Society Foundations.

ANA CAROLINA AMARAL / Folhapress

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