RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) – “Estou sem chão, sem forças. Eles destruíram meu sonho de gerar uma vida e tiraram o meu sustento, meu trabalho como trancista.” A passista Alessandra dos Santos Silva, 35, afirma que foi vítima de erro médico depois de ter tido o braço esquerdo amputado ao fazer uma cirurgia no útero no Hospital Estadual da Mulher Heloneida Studart, em São João de Meriti, na Baixada Fluminense.
A Fundação Saúde, que administra a unidade, disse que abriu sindicância para apurar o caso e que uma equipe do hospital entrou em contato com familiares para acompanhamento ambulatorial.
O caso também é investigado pelo Cremerj (Conselho Regional de Medicina do Rio de Janeiro) e pela Polícia Civil. A delegacia de São João de Meriti informou que os agentes já pediram o laudo médico de Alessandra para análise.
A advogada Bianca Kald, que representa a passista, afirmou que vai entrar com uma ação de reparação civil contra o estado. “Vamos pedir uma indenização que seja justa devido aos danos irreparáveis pelos erros cometidos pelo hospital”, disse.
O pesadelo, segundo Alessandra, começou em agosto do ano passado quando começou a sentir fortes dores abdominais e sangramentos. Exames apontaram que a passista estava com miomas no útero e os médicos recomendaram a retirada imediata dos nódulos. A partir daí, ela foi em busca de agendar o procedimento na rede pública.
A convocação para a cirurgia, no entanto, só veio em janeiro deste ano e, em 3 de fevereiro, ela foi internada no Hospital da Mulher para o procedimento.
Alessandra entrou em coma e, dois dias após a internação, durante uma visita, a família notou que ela estava com as pontas dos dedos escurecidas, além de braços e pernas enfaixados. No dia 6 de fevereiro, ela apresentou piora e foi transferida para o Instituto Estadual de Cardiologia Aloysio de Castro, em Botafogo, na zona sul do Rio.
Segundo o relato, um médico da unidade disse que iria drenar o braço, mas o procedimento não deu resultado e, no dia 10 de fevereiro, o hospital informou aos parentes de Alessandra que a necrose poderia se alastrar. A família, então, autorizou a amputação do braço da passista. Naquele momento, ela também apresentou complicações no rim e no fígado, além do risco de uma infecção generalizada.
Alessandra saiu do coma em 12 de fevereiro e teve alta três dias depois, mas os problemas não acabaram. Ela voltou ao hospital no dia 28 do mesmo mês para ver os pontos da amputação. O médico estranhou a condição e a encaminhou de volta para o Heloneida Studart.
Na sequência, Alessandra foi recusada em vários hospitais até que conseguiu ser internada no Hospital Maternidade Fernando Magalhães, mas acabou sendo transferida para o Hospital Municipal Souza Aguiar. Ela ficou internada entre 4 de março e 4 de abril.
À Folha Alessandra contou que os pontos na barriga ainda não cicatrizaram, razão pela qual tem dificuldades de andar. Disse ainda que não sabe quais foram as complicações que levaram à amputação do braço e à remoção do útero.
A passista está sobrevivendo graças à ajuda dos amigos que, segundo ela, foram ‘incansáveis’ e ainda prestam apoio no pagamento de medicamentos e nas sessões de fisioterapia domiciliar que custam R$ 120 por mês.
“Estou contando com a ajuda do auxílio da minha mãe e a aposentadoria do meu pai, além, da ajuda dos meus amigos que criaram uma vaquinha pra mim. O objetivo é comprar uma prótese, mas também ajudar com os meus custos dos remédios e da fisioterapia que eu estou tendo que fazer em casa já que não posso ir ao hospital por risco de ter infecção generalizada”, disse Alessandra.
Agora, ela busca por Justiça: “Eu quero que os responsáveis paguem, que o hospital e a equipe médica se responsabilizem e, principalmente, me expliquem o que aconteceu para causar todo esse sofrimento na minha vida. Eu exijo uma resposta, tenho esse direito, pelo menos isso não não me tirar igual tiraram o meu braço”, afirmou.
Moradora de Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, Alessandra desfila desde os 19 na Acadêmicos do Grande Rio. O último Carnaval que Alessandra desfilou pela escola foi o que tornou a agremiação campeã pela primeira vez, em 2022. Nas redes sociais, a Grande Rio disse que está acompanhando o caso da passista.
Alessandra trabalhava como trancista e implantista de cabelo há mais de 20 anos. Agora, disse que não sabe o que fazer daqui para frente. “Eu não tenho outro meio de renda, não sei o que será da minha vida. Estou muito triste por tantos sonhos interrompidos”, disse a passista que está noiva há 11 anos e planejava engravidar.
ALÉXIA SOUSA / Folhapress