SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O presidente da Colômbia, Gustavo Petro, suspendeu nesta segunda-feira (22) a trégua com o Estado-Maior Central –principal e mais poderoso grupo de dissidentes da guerrilha das Farc. A medida valerá pelas próximas 72 horas e foi motivada pelo assassinato de quatro menores de idade indígenas em algumas das regiões mais conturbadas do país.
“A trégua bilateral que vigorava atualmente com esse grupo armado nos departamentos de Meta, Caquetá, Guaviare e Putumayo está suspensa, e todas as operações ofensivas foram reativadas”, informou o governo em um comunicado divulgado nas redes sociais do presidente. O cessar-fogo permanece em outros territórios, mas essas quatro regiões do sul do país são um bastião dos guerrilheiros.
O anúncio ameaça a estratégia chamada de “paz total” por Petro –ele mesmo um ex-guerrilheiro. O plano de acabar com o conflito armado por meio da negociação dos grupos com o primeiro presidente de esquerda da Colômbia já enfrentava desafios nas últimas semanas.
No último dia 15, por exemplo, o ELN (Exército de Libertação Nacional) pausou as conversas do acordo de paz em Havana, capital de Cuba, após Petro dizer que o grupo existia por causa da economia ilegal, ou seja, o narcotráfico. Tal afirmação ofendeu os guerrilheiros, que reivindicam sua motivação política.
Em 31 de dezembro, Petro declarou um cessar-fogo bilateral com esse grupo armado e outros quatro. Agora, tréguas de três deles já caíram, contando com a do Estado-Maior Central –as outras duas são a do ELN, que se recusou a acabar com as hostilidades apesar das negociações de paz com o governo desde novembro, e a do cartel do Clã do Golfo, que atacou a força de segurança pública e a população civil.
Sem o cessar-fogo com esses três grupos, restam apenas as tréguas com a Segunda Marquetalia, outra facção de dissidentes liderada pelo ex-número dois das Farc, Iván Márquez, e as Autodefesas Conquistadoras da Serra Nevada, um grupo paramilitar de Santa Marta, no norte do país. “Se o cessar-fogo não for eficaz em determinados territórios para proteger a vida e a integridade da população, não tem sentido persistir”, afirmou o presidente.
Qualquer crise no processo vira munição na arma de opositores, e desta vez não foi diferente. “O primeiro responsável pela escalada da violência é Petro, que sob o engano da paz total, deixou a Colômbia nas mãos dos terroristas”, opinou a senadora de direita María Fernanda Cabal.
O governador do departamento de Meta, Juan Guillermo Zuluaga, celebrou a decisão. “A paciência ia acabar. A suspensão do cessar-fogo com os dissidentes não é só pelo vil assassinato de quatro crianças, mas também pelos sequestros, extorsões e outras ações criminosas que nunca cessaram”, afirmou.
Petro afirmou que não há justificativa para esse tipo de crime. “Foi um fato atroz que questiona a vontade de construir um país em paz”, disse. Os menores de idade da comunidade murui haviam sido recrutados à força pelos rebeldes, que se distanciaram do acordo de paz que desarmou as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) em 2016.
Os jovens foram assassinados na fronteira entre os departamentos de Caquetá e Amazonas por membros da frente Carolina Ramírez do grupo guerrilheiro, liderado por Iván Mordisco. Em 2021, o centro de estudos independente Indepaz calculou que o Estado-Maior Central tinha cerca de 1.700 combatentes.
Em abril, a facção dissidente afirmou que estava pronta para iniciar as negociações em maio, algo que nunca se concretizou. Segundo Petro, a intenção de diálogo se mantém, e os guerrilheiros oficializarão em breve os nomes de seus negociadores.
Em nota enviada à imprensa, o Estado Maior Central criticou duramente o governo e não mencionou o assassinato dos indígenas. “O rompimento unilateral desencadeará a guerra e multiplicará os mortos, feridos e prisioneiros”, diz o texto.
“Da nossa perspectiva, este foi o governo menos sério para estabelecer negociações, a ponto de nem ter instalado os mecanismos de verificação da trégua”, acrescentaram os rebeldes. O grupo pediu ao presidente para traçar uma política de paz “sem improvisos, sem pressões e sem violações”.
Também nesta segunda, a Presidência informou que está usando imagens de satélite, folhetos lançados de helicópteros e rezas indígenas para encontrar as quatro crianças desaparecidas há 22 dias na Amazônia colombiana. Os irmãos da etnia huitoto de 13, 9 e 4 anos, além do bebê de 11 meses, não foram mais vistos após um acidente de avião em 1º de maio que matou sua mãe, o piloto e um líder indígena.
Mais de 160 militares buscam as crianças por terra e ar, e um grupo de indígenas de sete povos nativos de todo o país, acostumados a circular pela floresta, se uniu às buscas no fim de semana. De acordo com a Presidência, as comunidades originárias fazem processos espirituais, que consistem em falar com a floresta e pedir ajuda para localizar os menores.
As forças militares suspeitam que as crianças estejam vagando por um território de cerca de 323 quilômetros quadrados. No fim de semana, 100 kits de sobrevivência com comida e água foram lançados na região.
Redação / Folhapress