Queixas por demora de ônibus disparam na cidade de São Paulo

SÃO PAULO, SP (UOL/FOLHAPRESS) – As queixas de usuários de ônibus urbanos na cidade de São Paulo dispararam no primeiro trimestre deste ano. O número é 42% superior ao do mesmo período de 2022. Também é maior na comparação com os três primeiros meses de anos anteriores à pandemia de Covid.

Segundo a SPTrans, responsável pelo sistema de ônibus municipais, usuários fizeram 17.928 queixas entre janeiro e março. No primeiro trimestre de 2021 ocorreram 12.594.

Uma a cada três reclamações registradas neste ano foram de intervalo excessivo entre uma condução e outra —6.025 reclamações (34% do total). Esse número é 64% maior do que o do primeiro trimestre do ano passado, quando passageiros fizeram 3.676 comunicações sobre o problema.

Segundo especialistas, o tempo maior de espera pode ser reflexo da redução da frota.

E, mesmo que também haja queda na quantidade de usuários, o que vem ocorrendo nos últimos anos, o intervalo prolongado no ponto atinge em cheio quem tem o ônibus como única alternativa de transporte e precisa embarcar de qualquer jeito.

“Essa população do ônibus não escapa do problema”, afirma o engenheiro Sergio Ejzenberg, mestre em transportes pela Escola Politécnica da USP, que cita a redução da frota como forma de diminuir o custo do sistema.

Há 1.635 ônibus a menos nas ruas, na comparação com março de 2019, ou seja, antes da pandemia, que impactou diretamente o transporte público.

Segundo a SPTrans, em março de 2019 a cidade contatava com 13.560 coletivos contra 11.925 no mês passado —12% a menos.

A redução no número de embarques, também na comparação entre os meses de março de 2019 e de 2023, foi um pouco maior, de 13,5%, caindo de 219,2 milhões para 189,4 milhões.

A SPTrans afirma que a frota sempre foi mantida acima da demanda de passageiros transportados, mesmo no auge da pandemia (2020 e 2021), quando as pessoas circularam menos.

A empresa explica ainda que os ônibus estão sendo substituídos por outros com mais capacidade de passageiros —em média, passou de 81 em março de 2019 para atuais 84.

Rafael Calabria, coordenador de mobilidade urbana do Idec (Instituto de Defesa do Consumidor), diz acreditar que esse tipo de reclamação é reflexo de concessões mal reguladas de transporte público. “O que mais a população percebe é o atraso, que atrapalha a seu horário, e menos a lotação, pois nesse caso ela acaba conseguindo embarcar.”

A SPUrbanuss, o sindicato patronal das empresas de ônibus na capital, diz que ainda não teve acesso aos dados do mês de março, mas que notou aumento nas reclamações em janeiro e fevereiro. Porém considera razoável a média de 1 queixa a cada 120 mil passageiros transportados.

Para Calabria, a má qualidade e o preço da tarifa têm desestimulado o uso do desse transporte público ao longo dos últimos anos. Isso, diz ele, proporcionou a crise do atual modelo que, no caso de São Paulo, vem contando com sucessivos reajustes no subsídio pago pela prefeitura às empresas de ônibus para não aumentar a tarifa ao passageiro, congelada em R$ 4,40 desde 2020.

De acordo com a gestão Ricardo Nunes (MDB), o valor pago em compensações tarifárias em 2022 foi de R$ 4,89 bilhões contra R$ 3,3 bilhões no ano anterior.

“O subsídio é necessário para manter a tarifa em valor que tenha o menor impacto possível para a população e para bancar as gratuidades do sistema”, afirma a prefeitura, em nota.

NA DIREÇÃO

Reclamações contra motoristas estão entre 3 das 5 principais queixas registradas no primeiro trimestre. A faxineira Débora Baptista Silva, 52, esbravejou com o condutor de um ônibus da linha 6824 – Terminal Capelinha-Parque Fernanda, quando tropeçou ao chegar à porta traseira do coletivo para descer.

A linha foi a campeã de reclamações no primeiro trimestre na capital, com 109 queixas, sendo 83 por atitudes inadequadas de motoristas, cobradores ou fiscais.

“Precisa tomar cuidado para ficar em pé quando o ônibus passa por aqui”, afirmou a passageira, sobre ladeiras e descidas íngremes nas estreitas e esburacadas ruas do Parque Fernanda, na zona sul de São Paulo, que jogam as pessoas em pé no corredor de um lado para o outro.

No fim da manhã da última quarta (12), o porteiro Oscar Saraiva, 56, esperava a mulher passar por atendimento na UBS (Unidade Básica de Saúde) Parque Fernanda. Em frente ao posto médico há um ponto da linha 6824 e eles iriam voltar para casa com o coletivo. “O problema maior é de manhã cedo, quando fica lotado e um passageiro espreme o outro nas curvas.”

Na quarta, a reportagem viajou na linha, do terminal Capelinha até o ponto em frente à UBS. O trajeto, de 30 minutos, foi quase todo com os assentos praticamente cheios.

Na unidade de saúde, Vanessa Aparecida, 40, esperava a entrega de remédios com o filho de três anos no colo. Moradora no bairro, ela iria pegar o ônibus na sequência e estranhou o fato de a linha ser a campeã de queixas. “São sempre muito atenciosos comigo e com meu filho, que é especial.”

Por telefone, a Viação Campo Belo, responsável pela linha, pediu que a reportagem procurasse a SPUrbanuss para falar das reclamações.

Em nota, o sindicato diz que as empresas dão treinamento periódico e, quando há ocorrências relacionadas a funcionários, são feitos procedimento de reciclagem profissional.

A SPTrans afirma que no início deste mês determinou regras para as concessionárias realizarem a reciclagem de cerca de 30 mil motoristas, voltada à direção segura e prevenção. A medida foi tomada após acidentes neste ano.

A empresa diz fazer fiscalizações e, quando é verificada alguma irregularidade em partidas, intervalo excessivo ou comportamentos de motoristas, aplica autuações.

Sobre intervalo entre os ônibus, a SPUrbanuss afirma que a operação de transporte “é seriamente afetada por externalidades”, como trânsito, acidentes e intervenções no viário, entre outros.

A SPTrans diz incentivar passageiros a registrarem reclamações, sugestões e críticas, pois as mensagens auxiliam no direcionamento das ações de fiscalização.

Para o engenheiro Sergio Ejzenberg, entretanto, o município deveria investir mais em pesquisas de opinião. “As pessoas que mais sofrem no transporte coletivo são as que menos têm condições ou tempo para reclamar.”

FÁBIO PESCARINI / Folhapress

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