Roubos aumentam no Pelourinho, e poder público renova promessas

SALVADOR, BA (FOLHAPRESS) – As imagens de um turista romeno com o rosto empapado de sangue em uma ladeira do Pelourinho em 22 de abril ganharam as redes sociais, despertaram críticas e geraram mobilização. Mas os alertas já vinham sendo dados havia meses por aqueles que vivem e trabalham na região.

Considerado Patrimônio da Humanidade pela Unesco, órgão ligado às Nações Unidas, o centro histórico de Salvador viu o número de crimes violentos disparar entre janeiro e abril de 2023.

Em apenas quatro meses, a quantidade de ocorrências supera todo o ano de 2022, apontam dados da Polícia Civil da Bahia solicitados pela Folha de S.Paulo. Ao todo, houve o registro de 181 roubos no centro histórico entre janeiro e abril. No ano passado inteiro, foram 160.

Casal esperando um Uber no Largo do Pelourinho, um dos principais e mais antigos pontos turísticos de Salvador, ao lado de uma base da Entre os furtos, crimes cometidos sem violência, o patamar foi similar ao de anos anteriores. Foram 187 registradas ocorrências entre janeiro e abril deste ano. Em todo o ano passado, houve 548. O pico de ocorrências se deu em fevereiro, mês marcado pelo retorno das festas populares, incluindo o Carnaval.

A Polícia Civil não forneceu os dados referentes só aos casos de janeiro a abril do ano passado.

Os governos federal, estadual e municipal, que têm responsabilidades difusas sobre o sítio histórico, renovaram promessas de mais segurança, projetos culturais e revitalização.

Além dos assaltos a turistas nas ruas, ganharam repercussão casos de arrombamentos e roubos a estabelecimentos de região. No início de maio, dois homens invadiram e tentaram roubar a sede do Balé Folclórico da Bahia, mas acabaram fugindo após o disparo do alarme.

Menos de duas semanas depois, a Igreja de Nossa Senhora da Ajuda, também no centro histórico, foi arrombada e furtada por ladrões, que levaram castiçais de prata e até mesmo uma âmbula, espécie de cálice onde são guardadas hóstias consagradas pelo bispo.

Na última quinta-feira (18), o templo foi novamente arrombado. Bandidos levaram uma televisão e o dinheiro depositado em uma urna pelos fiéis.

Diante do aumento das ocorrências, bares e restaurantes passaram a fechar as portas mais cedo com receio de assaltos, sobretudo nos dias úteis. Com menos movimento, as ruas se tornaram ainda mais propícias a assaltos.

Na última semana de abril, comerciantes, trabalhadores e artistas se uniram em um protesto pelas ruas do Pelourinho para mobilizar as autoridades.

Proprietário do restaurante Ó Paí ó no Terreiro de Jesus, o ator Érico Brás desabafou nas redes sociais há duas semanas. Contou que teve que demitir funcionários de seu empreendimento e cobrou ações do prefeito de Salvador, Bruno Reis (União Brasil), e do governador Jerônimo Rodrigues (PT).

Uma programação cultural permanente, que vá além da alta estação, é uma das principais cobranças dos comerciantes, que também pedem mais segurança e ordenamento.

O enfrentamento à violência na região é visto como uma questão complexa, que, além da segurança pública, envolve gargalos no ordenamento, proteção social, moradia, emprego e a própria proteção ao patrimônio histórico.

“O Pelourinho é um grande coração do Brasil. E nenhum coração funciona bem se as suas artérias não estiverem bem cuidadas”, afirma Clarindo Silva, dono da Cantina da Lua, restaurante que funciona há mais de 50 anos no Terreiro de Jesus e é um dos símbolos do Pelourinho.

Ele cobra trabalho integrado que envolva as diferentes esferas do Poder Executivo, Justiça, Ministério Público e órgãos como o Conselho Tutelar: “Tudo que acontece cai no colo da polícia. O problema do centro histórico não é só de polícia, é institucional.”

O centro histórico abriga um batalhão da Polícia Militar, uma delegacia de proteção ao turista, centenas de câmeras de videomonitoramento e sistema de reconhecimento facial. “Este é um dos lugares mais bem policiados do Brasil”, afirma o coronel Agnaldo Ceita, comandante do 18º Batalhão da PM.

Ele afirma que a maior parte dos furtos e roubos na região são cometidos por adolescentes, que são identificados e apreendidos pela polícia: “Pelo fato de serem menores, o natural é que eles não respondam por esses atos. Então, geralmente eles retornam à região do Pelourinho”.

Com a alta nos casos de roubos, o governo do estado anunciou a contratação de 30 novos policiais para atuar na região. A prefeitura prometeu cem novos guardas, nova base da Guarda Municipal, 200 câmeras de vigilância e nomeou um coronel reformado como subprefeito do centro histórico.

Com o reforço no policiamento, governo e prefeitura afirmam que houve uma redução nas ocorrências nas últimas semanas. Mas empresários e moradores seguem cobrando ações permanentes.

A Prefeitura de Salvador anunciou a criação de um distrito cultural do centro histórico e prometeu atuar em três frentes: reforço na zeladoria, calendário de eventos permanente e fomento à habitação na região.

Uma das primeiras ações efetivas foi um convênio com o Balé Folclórico da Bahia, entidade que atua de forma ininterrupta no Pelourinho há 28 anos.

“O centro histórico não é um parque, não é um shopping. É um lugar onde moram pessoas. Nossa ideia é fazer uma região de excelência em serviços públicos que seja o motor do desenvolvimento de uma cidade histórica como Salvador”, afirma Pedro Tourinho, secretário municipal de Cultura e Turismo.

O incentivo à habitação será um dos principais pilares centrais da proposta e prevê uma parceria com o governo federal, que deve lançar no segundo semestre um plano de revitalização dos centros históricos com incentivo à ocupação residencial e projetos de habitação popular.

O presidente do Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional), Leandro Grass, esteve em Salvador recentemente com a ministra Margareth Menezes (Cultura) e defendeu maior integração com as comunidades locais, evitando um processo de gentrificação.

“É justamente com a presença das pessoas que já são da comunidade, que têm relação com o território, que a gente vai conseguir trazer vida para esses espaços”, afirmou Grass.

A proposta de incentivar moradias no centro histórico é discutida há pelo menos 20 anos e está prevista na sétima etapa do projeto de requalificação dos casarões. Mas pouco avançou nos últimos anos e não ganhou uma escala relevante.

Entre os gestores públicos, há um consenso sobre a necessidade de uma ação coordenada entre diferentes esferas do poder no centro histórico, com diálogo e soluções compartilhadas.

“É um problema social complexo que precisa ser enfrentado com a união de todos os agentes que possuem uma ação no centro histórico. Queremos um processo de requalificação que seja concreto e estrutural”, diz Bruno Monteiro, secretário estadual de Cultura da Bahia.

JOÃO PEDRO PITOMBO / Folhapress

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